Nota:
O texto completo abaixo está na
íntegra do livro publicado pela Editora Vozes e vendida nas livrarias católicas,
MAS o APÊNDICE no fim do livro, onde está escrito PREPARAÇÃO
PARA A CONSAGRAÇÃO DE SI MESMO COMO ESCRAVO (A) DE JESUS E MARIA: 33 DIAS DE PREPARAÇÃO EM HONRA DOS 33 ANOS
DE JESUS NA TERRA, não contém no livro original, o dito APÊNDICE é modificado e
trata-se de maneira detalhada das orações para melhor preparação dos fiéis
para a consagração. O livro original com Apêndice original, sem mudança,
conforme vende a Editora Vozes está contido neste mesmo blog no link:
TRATADO DA VERDADEIRA DEVOÇÃO À SANTÍSSIMA VIRGEM
por
São Luís Maria Grignion de Montfort. 19ª edição – Editora Vozes – Petrópolis,
1992.
1. Foi pela Santíssima Virgem Maria
que Jesus Cristo veio ao mundo, e é também por ela que deve reinar no mundo.
2. Toda a sua vida Maria permaneceu
oculta; por isso o Espírito Santo e a Igreja a chamam Alma Mater – Mãe
escondida e secreta.1 Tão profunda era a sua humildade, que, para
ela, o atrativo mais poderoso, mais constante era esconder-se de si mesma e de
toda criatura, para ser conhecida somente de Deus.
1)Antífona à
Santíssima Virgem para o tempo de Natal; hino “Ave Maris Stella”.
3. Para atender aos pedidos que ela
lhe fez de escondê-la, empobrecê-la e humilhá-la, Deus providenciou para que
oculta ela permanecesse em seu nascimento, em sua vida, em seus mistérios, em
sua ressurreição e assunção, passando despercebida aos olhos de quase toda
criatura humana. Seus próprios parentes não a conheciam; e os anjos perguntavam
muitas vezes uns aos outros: Quae est ista?... – Quem é esta? (Ct 3, 6;
8, 5) pois que o Altíssimo lha escondia; ou, se algo lhes desvendava a
respeito, muito mais, infinitamente, lhes ocultava.
4. Deus Pai consentiu que jamais em
sua vida ela fizesse algum milagre, pelo menos um milagre visível e retumbante,
conquanto lhe tivesse outorgado o poder de fazê-los. Deus Filho consentiu que
ela não falasse, se bem lhe houvesse comunicado a sabedoria divina. Deus
Espírito Santo consentiu que os apóstolos e evangelistas a ela mal se
referissem, e apenas no que fosse necessário para manifestar Jesus Cristo. E,
no entanto, ela era a Esposa do Espírito Santo.
5. Maria é a obra-prima por excelência
do Altíssimo, cujo conhecimento2 e domínio ele reservou para si. Maria
é a Mãe admirável do Filho, a quem aprouve humilhá-la e ocultá-la durante a
vida para lhe favorecer a humildade, tratando-a de mulher – mulier (Jo
2, 4; 19, 26), como a uma estrangeira, conquanto em seu Coração a
estimasse e amasse mais que todos os anjos e homens. Maria é a fonte selada (Ct
4, 12) e a esposa fiel do Espírito Santo, onde só ele pode penetrar. Maria é o
santuário, o repouso da Santíssima Trindade, em que Deus está mais
magnífica e divinamente que em qualquer outro lugar do universo, sem excetuar
seu trono sobre os querubins e serafins; e criatura algumas, pura que seja,
pode aí penetrar sem um grande privilégio.
3)...ut soli
Deo cognoscenda reservatur (São Bernardino de Sena, Sermão 51, art. 1, cap. 1).
6. Digo com os santos: Maria
Santíssima é o paraíso terrestre3 do novo Adão, no qual este se
encarnou por obra do Espírito Santo, para aí operar maravilhas
incompreensíveis. É o grande, o divino
mundo de Deus4, onde há belezas e tesouros inefáveis. É a
magnificência de Deus5, em que ele escondeu, como em seu seio, seu
Filho único, e nele tudo que há de mais excelente e mais precioso. Oh! que
grandes coisas e escondidas Deus todo-poderoso realizou nesta criatura
admirável, di-lo ela mesma, como obrigada, apesar de sua humildade profunda: Fecit
mihi magna qui potens est (Lc 1, 49). O mundo desconhece essas coisas
porque é inapto e indigno.
3) Racionalis
secundi Adam paradisus. São Leão Grande (Sermo de Annunctiatione).
4) Mundus
specialissimus altissimi Dei. (São Bernardo).
5)
Magnificentia Dei. Ricardo de São Lourenço (De laud. Virg., lib. IV).
7.
Os santos disseram
coisas admiráveis desta cidade santa de Deus; e nunca foram tão eloqüentes nem
mais felizes, – eles o confessam – que ao tomá-la como tema de suas palavras e
de seus escritos. E, depois, proclamam que é impossível perceber a altura dos
seus méritos, que ela elevou até ao trono da Divindade; que a largura de sua
caridade, mais extensa que a terra, não se pode medir; que está além de toda
compreensão a grandeza do poder que ela exerce sobre o próprio Deus; e, enfim,
que a profundeza de sua humildade e de todas as suas virtudes e graças são um
abismo impossível de sondar. Ó altura incompreensível! Ó largura inefável! Ó
grandeza incomensurável! Ó insondável!
8. Todos os dias, dum extremo da terra
ao outro, no mais alto dos céus, no mais profundo dos abismos, tudo prega, tudo
exalta a incomparável Maria. Os nove coros de anjos, os homens de todas as
idades, condições e religiões, os bons e os maus. Os próprios demônios são
obrigados, de bom ou mau grado, pela força da verdade, a proclamá-la
bem-aventurada. Vibra nos céus, como diz São Boaventura, o clamor incessante
dos anjos: Sancta, sancta, sancta Maria, Dei Genitrix et Virgo; e
milhões e milhões de vezes, todos os dias, eles lhe dirigem a saudação
angélica: Ave, Maria..., prosternado-se diante dela e pedindo-lhe a
graça de honrá-la com suas ordens. E a todos se avantaja o príncipe da corte
celeste, São Miguel, que é o mais zeloso em render-lhe e procurar toda a sorte
de homenagens, sempre atento, para ter a honra de, à sua palavra, prestar um
serviço a algum dos seus servidores.
9. Toda a terra está cheia de sua
glória, particularmente entre os cristãos, que a tomam como padroeira e
protetora em muitos países, províncias, dioceses e cidades. Inúmeras catedrais
são consagradas sob a invocação do seu nome. Igreja alguma se encontra sem um
altar em sua honra; não há região ou país que não possua alguma de suas imagens
milagrosas, junto das quais todos os males são curados e se obtêm todos os
bens. Quantas confrarias e congregações erigidas em sua honra! quantos
institutos e ordens religiosas abrigados sob seu nome e proteção! quantos
irmãos e irmãs de todas as confrarias, e quantos religiosos e religiosas a
entoar os seus louvores, a anunciar as suas maravilhas! Não há criancinha que,
balbuciando a Ave-Maria, não a louve; mesmo os pecadores, os mais empedernidos,
conservam sempre uma centelha de confiança em Maria. Dos próprios
demônios no inferno, não há um que não a respeite, embora temendo.
10. Depois disto é preciso dizer, em
verdade, com os santos:
De Maria nunquam satis... Ainda não se louvou, exaltou,
amou e serviu suficientemente a Maria, pois muito mais louvor, respeito, amor e
serviço ela merece.
11. É preciso dizer, ainda, com o
Espírito Santo: Omnis gloria eius filiae Regis ab intus – Toda a glória da
Filha do Rei está no interior (Sl 44, 14), como se toda a glória exterior, que
lhe dão, a porfia, o céu e a terra, nada fosse em comparação daquela que ela
recebe no interior, da parte do Criador, e que desconhecem as fracas criaturas,
incapazes de penetrar o segredo dos segredos do Rei.
12. Devemos, portanto, exclamar com o
apóstolo: Nec oculus vidit, nec auris audivit, nec in cor hominis ascendit
(1Cor 2, 9) – os olhos não viram, o ouvido não ouviu, nem o coração do homem compreendeu as belezas, as
grandezas e excelências de Maria, o milagre dos milagres da graça6,
da natureza e da glória. Se quiserdes
compreender a Mãe – diz um santo – compreendei o Filho. Ela é uma digna Mãe de
Deus: Hic taceat omnis lingua – Toda língua aqui emudeça.
6) Miraculum
miraculorum (São João Damasceno, Oratio I de Nativitate B.V.).
13. Meu coração ditou tudo o que acabo
de escrever com especial alegria, para demonstrar que Maria Santíssima tem
sido, até aqui, desconhecida7, e que é esta uma das razões por que
Jesus Cristo não é conhecido como deve ser. Quando, portanto, e é certo, o
conhecimento e o reino de Jesus Cristo tomarem o mundo, será uma conseqüência
necessária do conhecimento e do reino da Santíssima Virgem Maria. Ela o deu ao
mundo a primeira vez, e também, da segunda, o fará resplandecer.
7) No sentido
de: conhecida insuficientemente, como se depreende de todo este
parágrafo e
da expressão: “Jesus Cristo não é conhecido como deve ser”.
Capítulo
I
Necessidade
da devoção à Santíssima Virgem
14. Confesso com toda a Igreja que
Maria é uma pura criatura saída das mãos do Altíssimo. Comparada, portanto, à
Majestade infinita ela é menos que um átomo, é, antes, um nada, pois que só ele
é “Aquele que é” (Ex 3, 14) e, por conseguinte, este grande Senhor, sempre
independente e bastando-se a si mesmo, não tem nem teve jamais necessidade da
Santíssima Virgem para a realização de suas vontades e a manifestação de sua
glória. Basta-lhe querer para tudo fazer.
15. Digo, entretanto, que, supostas as
coisas como são, já que Deus quis começar e acabar suas maiores obras por meio
da Santíssima Virgem, depois que a formou, é de crer que não mudará de conduta
nos séculos dos séculos, pois é Deus, imutável em sua conduta e em seus
sentimentos.
Artigo
I
Princípios
Primeiro
Princípio – Deus quis servir-se de Maria na Encarnação.
16. Deus Pai só deu ao mundo seu
Unigênito por Maria. Suspiraram os patriarcas, e pedidos insistentes fizeram os
profetas e os santos da lei antiga, durante quatro milênios, mas só Maria o
mereceu, e alcançou graça diante de Deus8, pela força de suas
orações e pela sublimidade de suas virtudes. Porque o mundo era indigno, diz
Santo Agostinho, de receber o Filho de Deus diretamente das mãos do Pai, ele o
deu a Maria a fim de que o mundo o recebesse por meio dela.
8) Cf. Lc 1,
30; Invenisti enim gratiam apud Deum.
Em Maria e por Maria é que o Filho
de Deus se fez homem para nossa salvação.
Deus Espírito Santo formou Jesus
Cristo em Maria, mas só depois de lhe ter pedido consentimento por intermédio
de um dos primeiros ministros da corte celestial.
17.
Deus Pai transmitiu
a Maria sua fecundidade, na medida em que a podia receber uma simples criatura,
para que ela pudesse produzir o seu Filho e todos os membros de seu Corpo
Místico.
18. Deus Filho desceu ao seu seio
virginal, qual novo Adão no paraíso terrestre, para aí ter suas complacências e
operar em segredo maravilhas de graça. Deus, feito homem, encontrou sua
liberdade em se ver aprisionado no seio da Virgem Mãe; patenteou a sua força em
se deixar levar por esta Virgem santa; achou sua glória e a de seu Pai,
escondendo seus esplendores a todas as criaturas deste mundo, para revelá-las
somente a Maria; glorificou sua independência e majestade, dependendo desta
Virgem amável, em sua conceição, em seu nascimento, em sua apresentação no
templo, em seus trinta anos de vida oculta, até à morte, a que ela devia
assistir, para fazerem ambos um mesmo sacrifício e para que ele fosse imolado
ao Pai eterno com o consentimento de sua Mãe, como outrora Isaac, como o
consentimento de Abraão à vontade de Deus. Foi ela quem o amamentou, nutriu,
sustentou, criou e sacrificou por nós.
Ó admirável e incompreensível
dependência de um Deus, de que nos foi dado conhecer o preço e a glória
infinita, pois o Espírito Santo não a pôde passar em silêncio no Evangelho,
como incógnitas nos ficaram quase todas as coisas maravilhosas que fez a
Sabedoria encarnada durante sua vida oculta. Jesus Cristo deu mais glória a
Deus, submetendo-se a Maria durante trinta anos, do que se tivesse convertido
toda a terra pela realização dos mais estupendos milagres. Oh! quão altamente
glorificamos a Deus, quando, para lhe agradar, nos submetemos a Maria, a
exemplo de Jesus Cristo, nosso único modelo.
19. Se examinarmos atentamente o resto
da vida de Jesus, veremos que foi por Maria que ele quis começar seus milagres.
Pela palavra de Maria ele santificou São João no seio de Santa Isabel; assim
que as palavras brotaram dos lábios de Maria, João ficou santificado, e foi
este seu primeiro e maior milagre de graça. Foi ao humilde pedido de Maria, que
ele, nas núpcias de Caná, mudou água em vinho, sendo este seu primeiro milagre
sobre a natureza. Ele começou e continuou seus milagres por Maria, e por Maria
os continuará até ao fim dos séculos.
20. O Espírito Santo, que era estéril
em Deus, isto é, não produzia outra pessoa divina, tornou-se fecundo em Maria.
É com ela, nela e dela que ele produziu sua obra-prima, de um Deus feito homem,
e que produz todos os dias, até ao fim do mundo, os predestinados e os membros
do corpo deste Chefe adorável. Eis por que, quanto mais, em uma alma, ele
encontra Maria, sua querida e inseparável esposa9, mais operante e
poderoso se torna para produzir Jesus Cristo n essa alma, e essa alma em Jesus Cristo.
9) Sponsa
Spiritus Sancti (Santo Idefonso, Líber de Corona Virginis, cap. III. – Sponsus
eius Spiritus veritatis (Belarmino, Concio 2 super “Missus est”).
21. Não se quer dizer com isto que a
Santíssima Virgem dê a fecundidade ao Espírito Santo, como se ele não a
tivesse. Sendo Deus, ele possui a fecundidade ou a capacidade de produzir, como
o Pai e o Filho. Não a reduz, porém, a ação, e não gera outra pessoa divina. O
que se quer dizer é que o Espírito Santo, por intermédio da Virgem, da qual se
quis servir, se bem que não lhe fosse absolutamente necessário, reduziu ao ato
a sua fecundidade, produzindo, nela e por ela, Jesus Cristo e seus membros. É
um mistério da graça inacessível até aos mais sábios e espirituais dentre os
cristãos.
Segundo
Princípio. – Deus quer servir-se de Maria na santificação das almas
22. A conduta das três pessoas da
Santíssima Trindade, na encarnação e primeira vinda de Jesus Cristo, é a mesma
de todos os dias, de um modo visível, na Igreja, e esse procedimento há de
perdurar até à consumação dos séculos, na última vinda de Cristo.
23. Deus Pai ajuntou todas as águas e
denominou-as mar; reuniu todas as graças e chamou-as Maria10. Este
grande Deus tem um tesouro, um depósito riquíssimo, onde encerrou tudo que há
de belo, brilhante, raro e precioso, até seu próprio Filho; e este tesouro
imenso é Maria, que os anjos chamam o tesouro do Senhor11, e de cuja
plenitude os homens se enriquecem.
10) Appellvit eam
Mariam, quasi mare gratiarum (S. Antonino, Summa, p. IV, tit. 15, cap. 4, § 2).
11) Ipsa est thesaurus Domini (Idiota, In contemplatione
B.M.V.).
24. Deus Filho comunicou a sua Mãe tudo
que adquiriu por sua vida e morte: seus méritos infinitos e suas virtudes
admiráveis. Fê-la tesoureira de tudo que seu Pai lhe deu em herança; é por ela
que ele aplica seus méritos aos membros do corpo místico, que comunica suas
virtudes, e distribui suas graças; é ela o canal misterioso, o aqueduto, pelo
qual passam abundante e docemente suas misericórdias.
25. Deus Espírito Santo comunicou a
Maria, sua fiel esposa, seus dons inefáveis, escolhendo-a para dispensadora de
tudo que ele possui. Deste modo ela distribui seus dons e suas graças a quem
quer, quanto quer, como quer e quando quer, e dom nenhum é concedido aos
homens, que não passe por suas mãos virginais. Tal é a vontade de Deus, que
tudo tenhamos por Maria e assim será enriquecida, elevada e honrada pelo
Altíssimo, aquela que, em toda a vida, quis ser pobre, humilde e escondida até
ao nada. Eis a opinião da Igreja e dos Santos Padres.12
12) Ver,
entre outros, São Bernardo e São Bernardino de Sena, que S. Luís Maria cita
mais adiante (141-142).
26. Se eu me dirigisse aos espíritos
fortes desta época, tudo isso, que digo simplesmente, poderia prová-lo pela
Sagrada Escritura, pelos Santos Padres, citando longas passagens em latim e
aduzindo os mais fortes argumentos, que o Padre Poiré deduz e desenvolve em sua Tríplice
coroa da Santíssima Virgem. Falo, porém, aos pobres e aos simples que, por
serem de boa vontade e terem mais fé que a maior parte dos sábios, crêem com
mais simplicidade e mérito, e, portanto, contento-me de lhes simplesmente a
verdade, sem me preocupar em citar todos os textos latinos, embora mencione
alguns, mas sem os rebuscar muito. Continuemos.
* * *
27. Pois que a graça aperfeiçoa a
natureza e a glória aperfeiçoa a graça, é certo que Nosso Senhor continua a
ser, no céu, tão Filho de Maria, como o foi na terra. Por conseguinte, ele
conserva a submissão e obediência do mais perfeito dos filhos para com a melhor
das mães. Cuidemos, porém, de não atribuir a essa dependência o menor
abaixamento ou imperfeição em Jesus Cristo. Maria está infinitamente abaixo de
seu Filho, que é Deus, e, portanto, não lhe dá ordens, como uma mãe terrestre
as dá a seu filho. Maria, porque está toda transformada em Deus pela graça e
pela glória que, em Deus, transforma todos os santos, não pede, não quer, não
faz a menor coisa contrário à eterna e imutável vontade de Deus. Quando se lê,
portanto, nos escritos de São Bernardo, São Bernardino, São Boaventura, etc.,
que no céu e na terra tudo, o próprio Deus, está submisso à Santíssima Virgem13,
devemos entender que a autoridade, que Deus espontaneamente lhe conferiu, é tão
grande que ela parece ter o mesmo poder que Deus, e que suas preces e rogos são
tão eficazes que se podem tomar como ordens junto de sua Majestade, e ele não
resiste nunca às súplicas de sua Mãe, porque ela é sempre humilde e conformada
à vontade divina.
13) Ver
adiante a citação (nº 76).
Se Moisés, pela força de sua oração,
conseguiu sustar a cólera de Deus contra os israelitas, e de tal modo que o
altíssimo e infinitamente misericordioso Senhor lhe disse que o deixasse
encolerizar-se e punir aquele povo rebelde, que devemos pensar, com muito mais
razão, da prece da humilde Maria, a digna Mãe de Deus, que tem mais poder junto
da Majestade divina, que as preces e intercessões de todos os anjos e santos do
céu e da terra?14
14) S.
Agostinho, Sermo 208 in
Assumpt., nº 12.
28. No céu, Maria dá ordens aos anjos e
aos bem-aventurados. Para recompensar sua profunda humildade, Deus lhe deu o
poder e a missão de povoar de santos os tronos vazios, que os anjos apóstatas
abandonaram e perderam por orgulho.15 E a vontade do Altíssimo, que
exalta os humildes (Lc 1, 52), é que o céu, a terra e o inferno se curvem, de
bom ou mau grado, às ordens da humilde Maria16, pois ele a fez
soberana do céu e da terra, general de seus exércitos, tesoureira de suas
riquezas, dispensadora de sua graças, artífice de suas grandes maravilhas,
reparadora do gênero humano, medidora para os homens, exterminadora dos
inimigos de Deus e a fiel companheira de sua grandezas e de seus triunfos.
15) Per
Mariam ab hominibus Angelorum chori reintegrantur (São Boaventura - Speculum
B.V., lect. XI, §6).
16) In nomine
tuo omne genu flectatur caelestium, terrestrium et infernorum (São Boaventura –
Psalter. maius B.V., Cantic. Instar “Cantici trium puerorum”).
* * *
29. Por meio de Maria, Deus Pai quer
que aumente sempre o número de seus filhos, até a consumação dos séculos, e
diz-lhes estas palavras: In Iacob inhabita – Habita em Jacob (Ecli 24,
13), isto é, faze tua morada e residência em meus filhos e predestinados,
figurados por Jacob e não nos filhos do demônio e nos réprobos, que Esaú
figura.
30. Assim como na geração natural e
corporal há um pai e uma mãe, há, na geração sobrenatural, um pai que é Deus e
uma mãe, Maria Santíssima. Todos os verdadeiros filhos de Deus e os
predestinados têm Deus por pai, e Maria por mãe; e quem não tem Maria por mãe,
não tem Deus por pai. Por isso, os réprobos, os hereges, os cismáticos, etc.,
que odeiam ou olham com desprezo ou indiferença a Santíssima Virgem, não têm
Deus por pai, ainda que disto se gloriem, pois não têm Maria por mãe. Se eles a
tivessem por Mãe, haviam de amá-la e honrá-la, como um bom e verdadeiro filho
ama e honra naturalmente sua mãe que lhe deu a vida.
O sinal mais infalível e indubitável
para distinguir um herege, um cismático, um réprobo, de um predestinado, é que
o herege e o réprobo ostentam desprezo e indiferença pela Santíssima Virgem17
e buscam por suas palavras e exemplos, abertamente e às escondidas, às vezes
sob belos pretextos, diminuir e amesquinhar o culto e o amor a Maria. Ah! Não
foi nestes que Deus Pai disse a Maria que fizesse sua morada, pois são filhos
de Esaú.
17) Quicumque
vult salvus esse, ante omnia opus est ut teneat de Maria firmam fidem (São
Boaventura, Psalter. maius B.V., Symbol. Instar Symboli Athanasii).
* * *
31. O desejo de Deus Filho é formar-se
e, por assim dizer, encarnar-se todos os dias, por meio de sua Mãe, em seus
membros. Ele lhe diz: “In Israel hereditare – Possui tua herança em
Israel” (Ecli 24, 13), como se dissesse: Deus, meu Pai, deu-me por herança
todas as nações da terra, todos os homens bons e maus, predestinados e
réprobos. Eu os conduzirei, uns com a vara de ouro, outros com a vara de ferro;
serei o pai e advogado de uns, o justo vingador para outros, o juiz de todos;
mas vós, minha querida Mãe, só tereis por herança e possessão os predestinados,
figurados por Israel. Como sua boa mãe vós lhes dareis a vida, os nutrireis,
educareis; e, como sua soberana, os conduzireis, governareis e defendereis.
32. “Um grande número de homens nasceu
nela”, diz o Espírito Santo: Homo et homo natus est in ea. Conforme a
explicação de alguns Santos Padres o primeiro homem nascido em Maria é o
homem-Deus, Jesus Cristo; o segundo é um homem puro, filho de Deus e de Maria
por adoção. Se Jesus Cristo, o chefe dos homens, nasceu nela, os predestinados,
que são os membros deste chefe, devem também nascer nela, por uma conseqüência
necessária. Não há mãe que dê à luz a cabeça sem os membros ou os membros sem a
cabeça: seria uma monstruosidade da natureza. Do mesmo modo, na ordem da graça,
a cabeça e os membros nascem da mesma mãe, e, se um membro do Corpo Místico de
Jesus Cristo, isto é, um predestinado, nascesse de outra mãe que Maria, que
produziu a cabeça, não seria um predestinado, nem membro de Jesus Cristo, e sim
um monstro na ordem da graça.
33. Além disso, pois que Jesus é agora,
mais do que nunca, o fruto de Maria, como lhe repetem mil e mil vezes
diariamente o céu e a terra: “...e bendito é o fruto do vosso ventre”, é certo
que Jesus Cristo, para cada homem em particular, que o possui, é tão
verdadeiramente o fruto e obra de Maria como pra todo o mundo em geral. Deste modo, se
qualquer fiel tem Jesus Cristo formado em seu coração, pode atrever-se a dizer:
“Mil graças a Maria! este Jesus que eu possuo é, com efeito, seu fruto, e sem
ela eu jamais o teria”. Pode-se aind aplicar-lhes, com mais propriedade que São
Paulo aplica a si próprio, as palavras: “Quos iterum parturio, donec formetur
Christus in vobis” (Gal 4, 19): Dou à luz todos os dias os filhos de Deus, até
que Jesus Cristo seja nele formado em toda a plenitude de sua idade. Santo
Agostinho, sobrepujando a si mesmo, e tudo o que acabo de dizer, confirma que
todos os predestinados, para serem conformes à imagem do Filho de Deus, são,
neste mundo ocultos no seio da Santíssima Virgem, e aí guardados, alimentados,
mantidos e engrandecidos por esta boa Mãe, até que ela os dê à glória, depois
da morte, que é propriamente o dia de seu nascimento, como qualifica a Igreja a
morte dos justos. Ó mistério de graça, que os réprobos desconhecem e os
predestinados conhecem muito pouco.
* * *
34. É vontade de Deus Espírito Santo
que nela e por ela se formem eleitos. “In electis meis mitte radices” (Ecli 24,
12), lhe diz ele: Minha bem-amada e minha esposa, lança em meus eleitos as
raízes de todas as virtudes, a fim de que eles cresçam de virtude em virtude e
de graça em graça. Tive
tanta complacência em ti, quando vivias na terra, praticando as mais sublimes
virtudes, que desejo ainda encontrar-te sobre a terra sem que deixes de estar
no céu. Reproduze-te, portanto, em meus eleitos. Que eu veja neles com
complacência as raízes de tua fé invencível, de tua humildade profunda, de tua
mortificação universal, de tua oração sublime, de tua caridade ardente, de tua
firmíssima esperança e de todas as tuas virtudes. É sempre a minha esposa tão
fiel, tão pura e tão fecunda como nunca: que tua fé me dê fiéis, que tua pureza
me dê virgens, que tua fecundidade me dê eleitos e templos.
35. Quando Maria lança suas raízes em
uma alma, maravilhas de graça se produzem, que só ela pode produzir, pois é a
única Virgem fecunda que não teve jamais, nem terá semelhante em pureza e
fecundidade.
Maria produziu, com o Espírito
Santo, a maior maravilha que existiu e existirá – um Deus-homem; e ela
produzirá, por conseguinte, as coisas mais admiráveis que hão de existir nos
últimos tempos. A formação e educação dos grandes santos, que aparecerão no fim
do mundo, lhe está reservada, pois só esta Virgem singular e milagrosa pode
produzir, em união com o Espírito santo, as obras singulares e extraordinárias.
36. Quando o Espírito Santo, seu
esposo, a encontra numa alma, ele se apodera dessa alma, penetra-a com toda a
plenitude, comunicando-se-lhe abundantemente e na medida que lhe concede sua
esposa; e uma das razões por que, hoje em dia, o Espírito Santo não opera, nas
almas, maravilhas retumbantes, é não encontrar ele uma união bastante forte
entre as almas e sua esposa fiel e inseparável. Digo esposa inseparável porque,
depois que este Amor substancial do Pai e do Filho desposou Maria para produzir
Jesus Cristo, o chefe dos eleitos, e Jesus Cristo nos eleitos, nunca a repudiou,
pois ela tem sido sempre fiel e fecunda.
Artigo
II
Conseqüências
Primeira
conseqüência. – Maria é a Rainha dos corações
37. Do que ficou dito, deve-se concluir
evidentemente que:
Primeiro, Maria recebeu de Deus um
grande domínio sobre as almas dos eleitos; pois ela não pode estabelecer neles
sua residência, como Deus Pai lhe ordenou; não pode formá-los, nutri-los,
fazê-los nascer para a vida eterna, como sua mãe, possuí-los como sua herança e
partilha, formá-los em
Jesus Cristo e Jesus Cristo neles; não pode implantar em seus
corações as raízes de suas virtudes, a ser a companheira inseparável do
Espírito Santo em todo os seus trabalhos de graça; não pode, repito, fazer
todas estas coisas, se não tiver direito e domínio sobre suas almas, por uma
graça singular do Altíssimo. E esta graça, que lhe deu autoridade sobre o Filho
único e natural de Deus, lhe foi concedida também sobre seus filhos adotivos,
não só quanto ao corpo, o que seria pouco, mas também quanto à alma.
38. Maria é a Rainha do céu e da terra,
pela graça, como Jesus é o rei por natureza e conquista. Ora, como o reino de
Jesus Cristo compreende principalmente o coração ou o interior do homem,
conforme a palavra: “O reino de Deus está no meio de vós” (Lc 17, 21), o reino
da Santíssima Virgem está principalmente no interior do homem, isto é, em sua
alma, e é principalmente nas almas que ela é mais glorificada com seu Filho, do
que em todas as criaturas visíveis, e podemos chamá-la com os santos a Rainha
dos corações.
Segunda
conseqüência. – Maria é necessária aos homens para chegarem ao seu último fim
39. Em segundo lugar, é preciso
concluir que a Santíssima Virgem, sendo necessária a Deus, de uma necessidade
chamada hipotética, devido à sua vontade, é muito mais necessária aos homens
para chegarem a seu último fim. Não se confunda, portanto, a devoção à
Santíssima Virgem com a devoção aos outros santos, como se não fosse mais
necessária que a destes, e apenas de superrogação.
§
1. A
devoção à santa Virgem é necessária a todos os homens para conseguirem a
salvação.
40. O douto e piedoso Suárez, da
Companhia de Jesus, o sábio e devoto Justo Lípsio, doutor da universidade de
Lovaina, e muitos outros, provaram incontestavelmente, apoiados na opinião dos
Santos Padres, entre outros, Santo Agostinho, Santo Efrém, diácono de Edessa,
São Cirilo de Jerusalém, São Germano de Constantinopla, São João de Damasco,
Santo Anselmo, São Bernardo, São Bernardino, Santo Tomás e São Boaventura, que
a devoção à Santíssima Virgem é necessária à salvação, e que é um sinal
infalível de condenação – opinião do próprio Ecolampádio e vários outros
hereges, – não ter estima e amor à Santíssima Virgem. Ao contrário, é indício
certo de predestinação, ser-lhe inteira e verdadeiramente devotado.17
17) A
verdadeira devoção à Santíssima Virgem consiste em se lhe devotar e entregar. O
culto de dulia é a dependência, a servidão (S. Th. – Sum. Theol. 2-2, q.
103, a.
3, in
fine corp.); o culto de hiperdulia consite numa dependência mais
perfeita à Santíssima Virgem, ou, em outras palavras na escravidão preconizada
por São Luís Maria de Montfort.
41. As figuras e palavras do Antigo e
do Novo Testamento o provam; a opinião e os exemplos dos santos o confirmam; a
razão e a experiência o ensinam e demonstram; o próprio demônio e seus
asseclas, premidos pela força da verdade, riram-se muitas vezes constrangidos a
confessá-lo a seu pesar. De todas as passagens dos Santos Padres e doutores que
compilei para provar esta verdade, cito apenas uma para não me alongar: “Tibi
devotum esse, est arma quaedam salutis quae Deus his dat quos vult salvos
fieri...” S. João Damasc.) – Ser vosso devoto, ó Virgem Santíssima, é uma alrma
de salvação que Deus dá, àqueles que quer salvar.
42. Eu poderia repetir aqui várias
histórias que provam o que afirmo. Entre outras, primeiro aquela que vem
narrada nas crônicas de São Francisco, em que se conta que o santo viu, em
êxtase, uma escada enorme, em cujo topo, apoiado no céu, avultava a Santíssima
Virgem. E o santo compreendeu que aquela escada ele devia subir para chegar ao
céu; segundo a outra, narrada nas crônicas de São Domingos: Quando o santo
pregava o rosário nas proximidades de Carcassona, quinze mil demônios, que
possuíam a alma de um infeliz herege, foram obrigados, por ordem da Santíssima
Virgem, a confessar muitas verdades grandes e consoladoras, referentes à
devoção a Maria. E eles, para própria confusão, o fizeram com tanto ardor e
clareza que não se pode ler essa autêntica narração e o panegírico, que o
demônio, embora a contragosto, fez da devoção mariana, sem derramar lágrimas de
alegria, ainda que pouco devoto se seja da Santíssima Virgem.
§
2. A
devoção à Santíssima Virgem é mais necessária ainda àqueles chamados a uma
perfeição particular.
43. Se a devoção à Virgem Santíssima é
necessária a todos os homens para conseguirem simplesmente a salvação, é ainda
mais para aqueles que são chamados a uma perfeição particular; nem creio que
uma pessoa possa adquirir uma união íntima com Nosso Senhor e uma perfeita
fidelidade ao Espírito Santo, sem uma grande união com a Santíssima Virgem e
uma grande dependência de seu socorro.
44. Só Maria achou graça diante de Deus
(Lc 1, 30) sem auxílio de qualquer outra criatura. E todos, depois dela, que
acharam graça diante de Deus, acharam-na por intermédio dela e é só por ela que
acharão graça os que ainda virão.18 Maria era cheia de graça quando
o arcanjo Gabriel a saudou (Lc 1, 28) e a graça superabundou quando o Espírito
Santo a cobriu com sua sombra inefável (Lc 1, 35). E de tal modo ela aumentou
essa dupla plenitude, de dia a dia, de momento a momento, que chegou a um ponto
imenso e inconcebível de graça, de sorte que o Altíssimo a fez tesoureira de
todos os seus bens, dispensadora de suas graças, para enobrecer, elevar e
enriquecer a quem ela quiser, para fazer entrar quem ela quiser no caminho
estreito do céu, para deixar passar, apesar de tudo, quem ela quiser pela porta
estreita da vida eterna. E para dar o trono, o cetro, e a coroa de rei a quem
ela quiser. Jesus é em toda parte e sempre o fruto e o Filho de Maria; e Maria
é em toda parte a verdadeira árvore que dá o fruto da vida, e a verdadeira mãe
que o produz.19
19) Cf.
acima, nº 33.
45. A Maria somente Deus confiou as
chaves dos celeiros do divino amor, e o poder de entrar nas vias mais sublimes e
mais secretas da perfeição, e de nesses caminhos fazer entrar os outros. Só
Maria dá aos miseráveis filhos de Eva infiel a entrada no paraíso terrestre,
para aí espairecerem agradavelmente com Deus, para aí, com segurança, se
ocultarem de seus inimigos, para aí, sem mais receio da morte, se alimentarem
deliciosamente do fruto das árvores da vida e da ciência do bem e do mal, e
para sorverem longamente as águas celeste desta bela fonte que jorra com tanta
abundância; ou melhor, como ela mesma é esse paraíso terrestre ou essa terra
virgem e abençoada, da qual Adão e Eva, pecadores, foram expulsos, ela só dá
entrada àqueles, que lhe apraz deixar entrar e para torná-los santos.
46. Todos os ricos do povo, para me
servir da expressão do Espírito Santo (Sl 44, 13), suplicarão, conforme a
explicação de São Bernardo, vossa face em todos os séculos, e particularmente
no fim do mundo; isto é, os mais santos, as almas mais ricas em graça e em
virtudes serão as mais assíduas em rogar à Santíssima Virgem que lhes esteja
sempre presente, como seu perfeito modelo a imitar, e que as socorra com seu
auxílio.
47. Disse que isto aconteceria
particularmente no fim do mundo e em breve, porque o Altíssimo e sua santa Mãe
devem suscitar grandes santos, de uma santidade tal que sobrepujarão a maior
parte dos santos, como os cedros do Líbano se avantajam às pequenas árvores em
redor, segundo revelação feita a uma santa alma.
48. Estas grandes almas, cheias de
graça e de zelo, serão escolhidas em contraposição aos inimigos de Deus a borbulhar
em todos os cantos, e elas serão especialmente devotas da Santíssima Virgem,
esclarecidas por sua luz, alimentadas de seu leite, conduzidas por seu
espírito, sustentadas por seu braço e guardadas sob sua proteção, de tal modo
que combaterão com uma das mãos e edificarão com a outra (cf. Ne 4, 17). Com a
direita combaterão, derrubarão, esmagarão os hereges com suas heresias, os
cismáticos com seus cismas, os idólatras com suas idolatrias, e os ímpios com
suas impiedades; e com a esquerda edificarão o templo do verdadeiro Salomão e a
cidade mística de Deus, isto é, a Santíssima Virgem que os Santos Padres chamam
“o templo de Salomão”20 e “a
cidade de Deus”.21 Por suas palavras e por seu exemplo, arrastarão
todo o mundo à verdadeira devoção e isto
lhes há de atrair inimigos sem conta, mas também vitórias inumeráveis e glória
para o único Deus. É o que Deus revelou a São Vicente Ferrer, grande apóstolo
de seu século, e que se encontra assinalado em uma de suas obras.
20) “Templum
Salomonis”. Idiota, De B.V. p. XVI, contemplação 7.
21) “Civitas
Dei”. S. Agostinho, Enarrat in Os. 142, n. 3.
O mesmo parece ter predito o salmo
58 (14, 15), em que se lê: “Et scient quia Deus dominabitur Jacob et finium
terrae; convertentur ad vesperam, et famem patientur ut canes, et circuibunt
civitatem – E saberão que Deus reinará sobre Jacob, e até os confins da terra;
voltarão à tarde, e padecerão fome como cães, e rodearão a cidade, em busca do
que comer”. Esta cidade que os homens encontrarão no fim do mundo para se converterem
e saciarem a sua fome de justiça, é a Santíssima Virgem, que o Espírito Santo
denomina “cidade de Deus” (Sl 86, 3).
§
3. A
devoção à Santíssima Virgem será especialmente necessária nesses últimos
tempos.
1.
Papel especial de Maria nos últimos tempos
49. Por meio de Maria começou a
salvação do mundo e é por Maria que deve ser consumada. Na primeira vinda de
Jesus Cristo, Maria quase não apareceu, para que os homens, ainda
insuficientemente instruídos e esclarecidos sobre a pessoa de seu Filho, não se
lhe apegassem demais e grosseiramente, afastando-se, assim, da verdade. E isto
teria aparentemente acontecido devido aos encantos admiráveis com que o próprio
Deus lhe havia ornado a aparência exterior. São Dionísio, o Areopagita, o
confirma numa página que nos deixou22 e em que diz que, quando a
viu, tê-la-ia tomado por uma divindade, tal o encanto que emanava de sua pessoa
de beleza incomparável, se a fé, em que estava bem confirmado, não lhe
ensinasse o contrário. Mas, na segunda vinda de Jesus Cristo, Maria deverá ser
conhecida e revelada pelo Espírito Santo, a fim de que por ela seja Jesus
Cristo conhecido, amado e servido, pois já não subsistem as razões que levaram
o Espírito Santo a ocultar sua esposa durante a vida e a revelá-la só pouco
depois da pregação do Evangelho.
* * *
50. Deus quer, portanto, nesses últimos
tempos, revelar-nos e manifestar Maria, a obra-prima de suas mãos:
1º Porque ela se ocultou neste
mundo, e, por sua humildade profunda, se colocou abaixo do pó, obtendo de Deus,
dos apóstolos e evangelistas, não ser quase mencionada.
2º Porque, sendo a obra-prima das
mãos de Deus, tanto aqui em baixo, pela graça, como no céu, pela glória, ele
quer que, por ela, os viventes o louvem e glorifique sobre a terra.
3º Visto ser ela a aurora que
precede e anuncia o Sol da justiça, Jesus Cristo, deve ser conhecida e notada
para que Jesus Cristo o seja.
4º Pois que é a via pela qual Jesus
Cristo nos veio a primeira vez, ela o será ainda na segunda vinda, embora de
modo diferente.
5º Pois que é o meio seguro e o
caminho reto e imaculado para se ir a Jesus Cristo e encontrá-lo plenamente, é
por ela que as almas, chamadas a brilhar em santidade, devem encontrá-lo. Quem
encontrar Maria encontrará a vida (cf. Prov 8, 35), isto é, Jesus Cristo, que é
o caminho, a verdade e a vida (Jo 14, 6). Mas não pode encontrar Maria quem não
a procura; quem não a conhece, e ninguém procura nem deseja o que não conhece.
É preciso, portanto, que Maria seja, mais do que nunca, conhecida, para maior
conhecimento e maior glória da Santíssima trindade.
6º Nesses últimos tempos, Maria deve
brilhar, como jamais brilhou, em misericórdia, em força e graça. Em
misericórdia para reconduzir e receber amorosamente os pobres pecadores e
desviados que se converterão e voltarão ao seio da Igreja católica; em força
contra os inimigos de Deus, os idólatras, cismáticos, maometanos, judeus e
ímpios empedernidos, que se revoltarão terrivelmente para seduzir e fazer cair,
com promessas e ameaças, todos os que lhes forem contrários. Deve, enfim,
resplandecer em graça, para animar e sustentar os valentes soldados e fiéis de
Jesus Cristo que pugnarão por seus interesses.
7º Maria deve ser, enfim, terrível
para o demônio e seus sequazes como um exército em linha de batalha,
principalmente n esses últimos tempos, pois o demônio, sabendo bem que pouco
tempo lhe resta para perder as almas, redobra cada dia seus esforços e ataques.
Suscitará, em breve, perseguições cruéis e terríveis emboscadas aos servidores
fiéis e aos verdadeiros filhos de Maria, que mais trabalho lhe dão para vencer.
* * *
51. É principalmente a estas últimas e
cruéis perseguições do demônio, que se multiplicarão todos os dias até ao reino
do Anticristo, que se refere aquela primeira e célebre predição e maldição que
Deus lançou contra a serpente no paraíso terrestre. Vem a propósito explicá-la
aqui, para glória da Santíssima Virgem, salvação de seus filhos e confusão do
demônio.
“Inimicitias ponan inter te et
mulierem, et semen tuum et semen illius; ipsa conteret caput tuum, et tu
insidiaberis calcaneo eius” (Gn 3, 15): Porei inimizades entre ti e a mulher, e
entre a tua posteridade e a posteridade dela. Ela te pisará a cabeça, e tu
armarás traições ao seu calcanhar.
52. Uma única inimizade Deus promoveu e
estabeleceu, inimizade irreconciliável, que não só há de durar, mas aumentar
até ao fim: a inimizade entre Maria, sua digna Mãe, e o demônio; entre os
filhos e servos da Santíssima Virgem e os filhos e sequazes de Lúcifer; de modo
que Maria é a mais terrível inimiga que Deus armou contra o demônio. Ele lhe
deu até, desde o paraíso, tanto ódio a esse amaldiçoado inimigo de Deus, tanta
clarividência para descobrira malícia desta velha serpente, tanta força para
vencer, esmagar e aniquilar esse ímpio orgulhoso, que o temor que Maria inspira
ao demônio é maior que o que lhe inspiram todos os anjos e homens e, em certo
sentido, o próprio Deus. Não que a ira, o ódio, o poder de Deus não sejam
infinitamente maiores que os da Santíssima Virgem, pois as perfeições de Maria
são limitadas, mas, em primeiro lugar, Satanás, porque é orgulhoso, sofre
incomparavelmente mais, por ser vencido e punido pela pequena e humilde escrava
de Deus, cuja humildade o humilha mais que o poder divino; segundo, porque Deus
concedeu a Maria tão grande poder sobre os demônios, que, como muitas vezes se
viram obrigados a confessar, pela boca dos possessos, infunde-lhes mais temor
um só de seus suspiros por uma alma, que as orações de todos os santos; e uma
só de suas ameaças que todos os outros tormentos.
53. O que Lúcifer perdeu por orgulho,
Maria ganhou por humildade. O que Eva condenou e perdeu pela desobediência,
salvou-o Maria pela obediência. Eva, obedecendo à serpente, perdeu consigo
todos os seus filhos e os entregou ao poder infernal; Maria, por sua perfeita
fidelidade a Deus, salvou consigo todos os seus filhos e servos e os consagrou
a Deus.
54. Deus não pôs somente inimizade,
mas inimizades, e não somente entre Maria e o demônio, mas também entre
a posteridade da Santíssima Virgem e a posteridade do demônio. Quer dizer, Deus
estabeleceu inimizades, antipatias e ódios secretos entre os verdadeiros filhos
e servos da Santíssima Virgem e os filhos e escravos do demônio. Não há entre
eles a menor sombra de amor, nem correspondência íntima existe entre uns e outros.
Os filhos de Belial, os escravos de Satã, os amigos do mundo (pois é a mesma
coisa) sempre perseguiram até hoje e perseguirão no futuro aqueles que
pertencem à Santíssima Virgem, como outrora Caim perseguiu seu irmão Abel, e
Esaú, seu irmão Jacob, figurando os réprobos e os predestinados. Mas a humilde
Maria será sempre vitoriosa na luta contra esse orgulhoso, e tão grande será a
vitória final que ela chegará ao pontro de esmagar-lhe a cabeça, sede de todo o
orgulho. Ela descobrirá sempre sua malícia de serpente, desvendará suas tramas
infernais, desfará seus conselhos diabólicos, e até ao fim dos tempos garantirá
seus fiéis servidores contra as garras de tão cruel inimigo.
Mas o poder de Maria sobre todos os
demônios há de patentear-se com mais intensidade, nos últimos tempos, quando
Satanás começar a armar insídias ao seu calcanhar, isto é, aos seus humildes
servos, aos seus pobres filhos, os quais ela suscitará para combater o príncipe
das trevas. Eles serão pequenos e pobres aos olhos do mundo, e rebaixados
diante de todos como o calcanhar em comparação com os outros membros do corpo.
Mas, em troca, eles serão ricos em graças de Deus, graças que Maria lhes
distribuirá abundantemente. Serão grandes e notáveis em santidade diante de
Deus, superiores a toda criatura, por seu zelo ativo, e tão fortemente
amparados pelo poder divino, que, com a humildade de seu calcanhar e em união
com Maria, esmagarão a cabeça do demônio e promoverão o triunfo de Jesus
Cristo.
2.
Os apóstolos dos últimos tempos
55. Deus quer, finalmente, que sua Mãe
Santíssima seja agora mais conhecida, mais amada, mais honrada, como jamais o
foi. E isto acontecerá, sem dúvida, se os predestinados puserem em uso, com o
auxílio do Espírito Santo, a prática interior e perfeita que lhes indico a
seguir. E, se a observarem com fidelidade, verão, então, claramente, quanto lho
permite a fé, esta bela estrela do mar, e chegarão a bom porto, tendo vencido
as tempestades e os piratas. Conhecerão as grandezas desta soberana e se
consagrarão inteiramente a seu serviço, como súditos e escravos de amor.
Experimentarão suas doçuras e bondades maternais a amá-la-ão ternamente como
seus filhos estremecidos. Conhecerão as misericórdias de que ela é cheia e a
necessidade que têm de seu auxílio, e há de recorrer a ela em todas as
circunstâncias como à sua querida advogada e medianeira junto de Jesus Cristo.
Reconhecerão que ela é o meio mais seguro, fácil, mais rápido e mais perfeito
de chegar a Jesus Cristo, e se lhe entregarão de corpo e alma, sem restrições,
para assim também pertencerem a Jesus Cristo.
56. Mas quem serão esses servidores,
esses escravos e filhos de Maria?
Serão ministros do Senhor ardendo em
chamas abrasadoras, que lançarão por toda a parte o fogo do divino amor.
Serão “sicut sagittae in manu
potentis” (Sl 126, 4) – flechas agudas nas mãos de Maria toda-poderosa, pronta
a traspassar seus inimigos.
Serão filhos de Levi, bem
purificados no fogo das grandes tribulações, e bem colados a Deus22,
que levarão o ouro do amor no coração, o incenso da oração no espírito, e a
mirra da mortificação no corpo e que serão em toda parte para os pobres e os
pequenos o bom odor de Jesus Cristo, e para os grandes, os ricos e os
orgulhosos do mundo, um odor repugnante de morte.
22) Tradução
enérgica da palavra de São Paulo (1Cor 6, 17): “Qui adhaeret Domino”.
57. Serão nuvens trovejantes esvoaçando
pelo ar ao menor sopro do Espírito Santo, que, sem apegar-se a coisa alguma nem
admirar-se de nada, nem preocupar-se, derramarão a chuva da palavra de Deus e
da vida eterna. Trovejarão contra o pecado, e lançarão brados contra o mundo,
fustigarão o demônio e seus asseclas, e, para a vida ou para a morte,
traspassarão lado a lado, com a espada de dois gumes da palavra de Deus (Cf. Ef
6, 17), todos aqueles a quem forem enviados da parte do Altíssimo.
58. Serão verdadeiros apóstolos dos
últimos tempos, e o Senhor das virtudes lhes dará a palavra e a força para
fazer maravilhas e alcançar vitórias gloriosas sobre seus inimigos; dormirão
sem ouro nem prata, e, o que é melhor, sem preocupações no meio dos outros
padres, eclesiásticos e clérigos, “inter medios cleros” (Sl 67, 14) e, no
entanto, possuirão as asas prateadas da pomba, para voar, com a pura intenção
da glória de Deus e da salvação das almas, aonde os chamar o Espírito Santo,
deixando após si, nos lugares em que pregarem, o ouro da caridade que é o
cumprimento da lei (Rom 13, 10).
59. Sabemos, enfim, que serão
verdadeiros discípulos de Jesus Cristo, andando nas pegadas da pobreza e
humildade, do desprezo do mundo e caridade, ensinado o caminho estreito de Deus
na pura verdade, conforme o santo Evangelho, e não pelas máximas do mundo, sem
se preocupar nem fazer acepção de pessoa alguma, sem poupar, escutar ou temer
nenhum mortal, por poderoso que seja. Terão na boca a espada de dois gumes da
palavra de Deus; em seu ombros ostentarão o estandarte ensangüentado da cruz,
na direita, o crucifixo, na esquerda o rosário, no coração os nomes sagrados de
Jesus e de Maria, e, em toda a sua conduta, a modéstia e a mortificação de
Jesus Cristo.
Eis os grandes homens que hão de
vir, suscitados por Maria, em obediência às ordens do Altíssimo, para que o seu
império se estenda sobre o império dos ímpios, dos idólatras e dos maometanos.
Quando e como acontecerá?... Só Deus o sabe!... Quanto a nós, cumpre calar-nos,
orar, suspirar e esperar: Exspectans exspectavi (Sl 39, 2).
Capítulo
II
Verdades
fundamentais da devoção à Santíssima Virgem
60. Até aqui dissemos alguma coisa
sobre a necessidade que temos da devoção à Santíssima Virgem. Com o auxílio de
Deus direi agora em que consiste esta devoção, expondo, porém, antes, algumas
verdades fundamentais, que esclarecerão esta grande e sólida devoção que quero
manifestar.
Artigo
I
Jesus
Cristo é o fim último da devoção à Santíssima Virgem
61. Primeira verdade. – Jesus
Cristo, nosso salvador, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, deve ser o fim
último de todas as nossas devoções; de outro modo, elas serão falsas e
enganosas. Jesus Cristo é o alfa e omega23, o princípio e o fim de
todas as coisas. Nós só trabalhamos, como diz o apóstolo, para tornar todo
homem perfeito em Jesus
Cristo, pois é em Jesus Cristo que habita toda a plenitude da
Divindade e todas as outras plenitudes de graças, de virtudes, de perfeições;
porque nele somente fomos abençoados de toda a bênção espiritual; porque é
nosso único mestre que deve ensinar-nos, nosso único Senhor de quem devemos
depender, nosso único chefe ao qual devemos estar unidos, nosso único modelo,
com o qual devemos conformar-nos, nosso único médico que nos há de curar, nosso
único pastor que nos há de alimentar, nosso único caminho que devemos trilhar,
nossa única verdade que devemos crer, nossa única vida que nos há de vivificar,
e nosso tudo em todas as coisas, que deve bastar-nos. Abaixo do céu nenhum
outro nome foi dado aos homens, pelo qual devamos ser salvos. Deus não nos deu
outro fundamento para nossa salvação, nossa perfeição e nossa glória, senão
Jesus Cristo. Todo edifício cuja base não assentar sobre esta pedra firme,
estará construído sobre areia movediça, e ruirá fatalmente, mais cedo ou mais
tarde. Todo fiel que não está unido a ele, como um galho ao tronco da videira,
cairá e secará, e será por fim atirado ao fogo. Fora dele tudo é ilusão,
mentira, iniquidade, inutilidade, morte e danação. Se estamos, porém, em Jesus Cristo e Jesus
Cristo em nós, não temos danação a temer; nem os anjos do céu, nem os homens da
terra, nem criatura alguma nos pode embaraçar, pois não pode separar-nos da
caridade de Deus que está em Jesus Cristo. Por Jesus Cristo, com Jesus Cristo,
em Jesus Cristo,
podemos tudo: render toda a honra e glória ao Pai, em unidade do Espírito Santo
e tornar-nos perfeitos e ser para nosso próximo um bom odor de vida eterna.
62. Se estabelecermos, portanto, a
sólida devoção à Santíssima Virgem, teremos contribuído para estabelecer com
mais perfeição a devoção a Jesus Cristo, teremos proporcionado um meio fácil e
seguro de achar Jesus Cristo. Se a devoção à Santíssima Virgem nos afastasse de
Jesus Cristo, seria preciso rejeitá-la como uma ilusão do demônio. Mas é tão o
contrário, que, como já fiz ver e farei ver, ainda, nas páginas seguintes, esta
devoção só nos é necessária para encontrar Jesus Cristo, amá-lo ternamente e
fielmente servi-lo.
23) As
páginas eloqüentes que seguem são tiradas quase exclusivamente da Sagrada
Escritura. Cf., p. ex., Ap 1, 8; Cl 2, 8; Mt 23, 10; Jo 13, 13; 1Cor 8, 6; Cl
1, 18; Jo 13, 15; 10, 16; 14, 6; At 9, 12; 1Cor 3, 11; Mt 7, 26-27; Jo 15, 6;
Rm 8, 38-39; etc.
* * *
63. Volto-me, aqui, um momento, pra vós,
ó Jesus, a fim de queixar-me amorosamente à vossa divina majestade, de que a
maior parte dos cristãos, mesmo os mais instruídos desconhecem a ligação
imprescindível que existe entre vós e vossa Mãe Santíssima. Vós, Senhor, estais
sempre com Maria, e Maria sempre convosco, nem pode estar sem vós; doutro modo,
ela deixaria de ser o que é; e de tal maneira está ela transformada em vós pela
graça, que já não vive, já não existe; sois vós, meu Jesus, que viveis e
reinais nela, mais perfeitamente que em todos os anjos e bem-aventurados. Ah!
Se conhecêssemos a glória e o amor que recebeis nesta admirável criatura, bem
diferentes seriam os nossos sentimentos a respeito de vós e dela. Maria está
tão intimamente unida a vós que mais fácil seria separar do sol a luz, e do
fogo o calor; digo mais: com mais facilidade se separariam de vós os anjos e os
santos que a divina Mãe, pois que ela vos ama com amais ardor e vos glorifica
com mais perfeição que todas as vossas outras criatura juntas.
64. Depois disto, meu amável Mestre,
não é triste e lamentável ver a ignorância e as trevas em que jazem todos os
homens na terra, a respeito de vossa Mãe Santíssima? Não falo dos idólatras e
pagãos, que, não vos conhecendo, também não se importam de conhecê-la; nem falo
dos hereges e cismáticos, que não têm a peito ser devotos de vossa Mãe
Santíssima, a não ser de um modo especulativo, seco, estéril e indiferente.
Estes senhores raras vezes falam de Maria e da devoção que se lhe deve ter,
porque, dizem, receiam que se abuse dessa devoção e que se vos ofenda, honrando
excessivamente vossa Mãe Santíssima. Se vêem ou ouvem algum devoto da
Santíssima Virgem falar muitas vezes, de um modo terno, forte e persuasivo, da
devoção a esta boa Mãe, como de um meio seguro e sem ilusão, dum caminho curto
e sem perigo, duma via imaculada e sem imperfeição, e dum segredo maravilhoso
para chegar a vós e vos amar perfeitamente, clamam contra ele, e lhe apresentam
mil razões falsas, para provar-lhes que não é necessário falar tanto a respeito
da Santíssima Virgem, que há muito abuso nessa devoção, que é preciso
empenhar-se em destruir, e aplicar-se em falar sobre vós em vez de favorecer a
devoção à Virgem Maria, a quem o povo já ama suficientemente.
Às vezes metem-se a falar da devoção
à vossa Mãe Santíssima, não, porém, para assentá-la e propagá-la, e sim para
destruir os abusos que dela se fazem. Estes senhores são, no entanto,
desprovidos de piedade, e não têm por vós sincera devoção, pois que não a têm a
Maria. Consideram o rosário, o escapulário, o terço, como devoções de mulheres,
próprias de ignorantes, sem as quais se pode obter muito bem a salvação. E se
lhes cai nas mãos algum devoto da Virgem Santíssima, que recita o seu terço ou
pratica qualquer outra devoção Mariana, mudam-lhe em pouco tempo o espírito e o
coração: em lugar do terço lhe aconselham recitar os sete salmos; em vez da
devoção à Santíssima Virgem aconselham a devoção a Jesus Cristo.
Ó meu amável Jesus, terá essa gente
o vosso espírito? Será possível que vos agradem, agindo desse modo? Poderá
alguém agradar-vos sem fazer todos os esforços para agradar a Maria, por medo
de vos desagradar? A devoção à vossa Mãe impede a vossa? Atribuir-se-á ela as
honras que lhe damos? Formará ela um partido diverso do vosso? É ela, acaso,
uma estrangeira sem a menor ligação convosco? É desagradar-vos querer
agradecer-lhe? Separamo-nos, talvez, ou nos afastamos de vosso amor, se nos
damos a ela e a amamos?
65. Entretanto, meu amável Mestre, a
maior parte dos sábios, em castigo de seu orgulho, não se afastariam mais da
devoção à Santíssima Virgem, nem a olhariam com mais indiferença, se tudo o que
acabo de dizer fosse verdade. Guardai-me, Senhor, guardai-me de seus sentimento
e de suas práticas, e dai-me uma parte dos sentimentos de reconhecimento, de estima,
de respeito e de amor, que tendes para com vossa Mãe Santíssima, a fim de que
eu vos ame e glorifique na medida em que vos imitar e mais de perto vos seguir.
66. Concedei-me a graça de louvar
dignamente vossa Mãe Santíssima, como se nada fosse o que, até aqui, disse em
sua honra. “Fac me digne tuam Matrem collaudare”, a despeito de todos os seus
inimigos, que são os vossos, e que eu lhes repita com os santos: “Nom praesumat
aliquis Deum se habere propitium qui bem edictam Matrem offensam habuerit. – Não
presuma receber a graça de Deus, quem ofende sua Mãe Santíssima”.
67. E, para alcançar de vossa
misericórdia uma verdadeira devoção a vossa Mãe Santíssima, e inspirá-la a toda
a terra, fazei que eu vos ame ardentemente, e recebei para este fim a súplica ardente
que vos dirijo com Santo Agostinho23 e vossos verdadeiros amigos:
23)
Meditationum lib. I, cap. XVIIIm n. 2 (inter opera S. Agostini).
No sentido de satisfazer aos desejos
dos fiéis que não compreendem o latim, damos aqui uma tradução desta oração:
“Vós
sois, ó Jesus, o Cristo, meu Pai santo, meu Deus misericordioso, meu Rei
infinitamente grande; sois meu bom pastor, meu único mestre, meu auxílio cheio
de bondade, meu pão vivo, meu sacerdote eterno, meu guia para a pátria, minha
verdadeira luz, minha santa doçura, meu reto caminho, sapiência minha preclara,
minha pura simplicidade, minha paz e concórdia; sois, enfim, toda a minha
salvaguarda, minha herança preciosa, minha eterna salvação...
Ó Jesus Cristo, amável Senhor, por
que, em toda a minha vida, amei, por que desejei outra coisa senão vós? Onde
estava eu quando não pensava em vós? Ah! que, pelo menos, a partir deste
momento meu coração só deseje a vós e por vós se abrase, Senhor Jesus! Desejos
de minha alma, correi, que já bastante tardastes; apressai-vos para o fim a que
aspirais; procurai em verdade aquele
procurais. Ó Jesus anátema seja quem não vos ama. Aquele que não vos ama seja
repleto de amarguras. Ó doce Jesus, sede o amor, as delícias, a admiração de
todo coração dignamente consagrado à vossa glória. Deus de meu coração e minha
partilha, Jesus Cristo, que em vós meu coração desfaleça, e sede vós mesmo a
minha vida. Acenda-se em minha alma a brasa ardente de vosso amor e se converta
num incêndio todo divino, a arder para sempre no altar de meu coração; que
inflame o âmago de minha alma; para que no dia de minha morte eu apareça diante
de vós inteiramente consumido em vosso amor... Amém”.
Quis transcrever no original esta
oração admirável de Santo Agostinho para que assim a possam recitar as pessoas
que entendem latim. Recitemo-la todos os dias para pedir o amor de Jesus, que
procuramos por intermédio da Santíssima Virgem.
Artigo
II
Pertencemos
a Jesus Cristo e a Maria na qualidade de escravos
68. Segunda verdade. – Do que
Jesus é para nós, concluímos que não nos pertencemos, como diz o apóstolo (1Cor
6, 19), e sim a ele, inteiramente, como
seus membros e seus escravos, comprados que
fomos por um preço infinitamente caro, o preço de seu sangue. Antes do
batismo o demônio nos possuía como escravos, e o batismo nos transformou em
escravos de Jesus Cristo e só devemos viver, trabalhar e morrer para produzir
frutos para o homem-Deus (Rom 7, 4), glorificá-lo em nosso corpo e fazê-lo
reinar em nossa alma, pois somos sua conquista, seu povo adquirido, sua
herança. Pelo mesmo motivo o Espírito Santo nos compara24: 1º a árvores
plantadas ao longo das águas da graça, nos campos da Igreja, árvores que devem
dar seus frutos no tempo adequado; 2º aos galhos de uma videira de que Jesus
Cristo é o tronco, e que devem produzir boas uvas; 3º a um rebanho cujo pastor
é Jesus, e esse rebanho deve multiplicar-se e dar leite; 4º a uma boa terra de
que Deus é o lavrador, e na qual a semente se multiplica, rendendo trinta,
sessenta, cem vezes mais. Jesus amaldiçoou a figueira estéril (Mt 21, 19) e
declarou condenado o servo inútil que n ao fizera valer o seu talento (Mt 25,
24-30). Tudo isso nos prova que Jesus Cristo quer receber alguns frutos de
nossas mesquinhas pessoas: quer receber nossas boas obras, porque as boas obras
lhe pertencem exclusivamente: “Creati in operibus bonis in Christo Iesu –
Criados em Jesus Cristo
para boas ações” (Ef 2, 10). Essas palavras do Espírito Santo mostram que Jesus
Cristo é o único fim de todas as nossas boas obras, e que devemos servi-lo não
somente como servidores assalariados, mas como escravos de amor. Explico-me.
* * *
69. Há duas maneiras, aqui na terra, de
alguém pertencer a outrem e de depender de sua autoridade. São a simples
servidão e a escravidão, donde a diferença que estabelecemos entre servo e
escravo.
Pela servidão, comum entre os
cristãos, um homem se põe a serviço de outro por um certo tempo, recebendo determinada quantia ou
recompensa.
Pela escravidão, um homem depende
inteiramente de outro durante toda a vida, e deve servir a seu senhor, sem
esperar salário nem recompensa alguma, como um dos animais sobre que o dono tem
direito de vida e morte.
70. Há três espécies de escravidão25:
por natureza, por constrangimento e por livre vontade.
Por natureza, todas as criaturas são
escravas de Deus: “Domini est terra et
plenitudo eius” (Sl 23, 1). Os demônios e os réprobos são escravos por
constrangimento; e os justos e os santos o são por livre e espontânea vontade.
A escravidão voluntária é a mais perfeita, a mais gloriosa aos olhos de Deus,
que olha o coração (1Rs 16, 7), que pede o coração (Prov 23, 26) e que é
chamado o Deus do coração (Sl 72, 26) ou da vontade amorosa, porque, por esta
escravidão, escolhe-se, sobre todas as coisas, a Deus e seu serviço, ainda
quando não o obriga a natureza.
25) Cf. S.
Agostinho, “Expositio cantici Magnificat” (circa médium). S. Tomás, Summa
Theol. 3, q. 48, ª 4, corp. et resp. ad 1.
71. A diferença entre um servo e um
escravo é total:
1º Um servo não dá a seu patrão tudo
o que é, tudo o que possui ou pode adquirir por outrem ou por si mesmo; mas um
escravo se dá integralmente a seu senhor, com tudo o que possui ou possa
adquirir, sem nenhuma exceção.
2º O servo exige salário pelos
serviços que presta a seu patrão; o escravo, porém, nada pode exigir, seja qual
for a assiduidade, a habilidade, a força que empregue no trabalho.
3º O servo pode deixar o patrão
quando quiser, ou ao menos quando expirar o tempo de serviço, mas o escravo não
tem esse direito.
4º O patrão não tem sobre o servo
direito algum de vida e de morte, de modo que, se o matasse como mata um se
seus animais de carga, cometeria um homicídio; mas, pelas leis, o senhor tem
sobre o escravo o poder de vida e morte26; de modo que pode vendê-lo
a quem o quiser ou matá-lo, como, sem comparação, o faria a seu cavalo.
26) A lei
natural, a lei mosaica e as leis modernas não reconhecem tal direito, a não ser
por um mandato especial do soberano Senhor da vida e da morte. O bem-aventurado
se coloca aqui simplesmente do ponto de vista do fato, conforme as leis civis
dos países em que vigorava a escravidão (cf. Secret de Marie, p. 34).
Abstraindo da moralidade do ato, seu fito é mostrar, por um exemplo, a total
dependência de que fala.
5º O servo, enfim, só por algum
tempo fica a serviço de um patrão, enquanto o escravo o é para sempre.
* * *
72. Só a escravidão, entre os homens,
põe uma pessoa na posse e dependência completa de outra. Nada há, do mesmo
modo, que mais absolutamente nos faça pertencer a Jesus Cristo e a sua Mãe
Santíssima do que a escravidão voluntária, conforme o exemplo do próprio Jesus
Cristo, que, por nosso amor, tomou a forma de escravo: “Formam servi accipiens”
(Filip 2, 7), e da Santíssima Virgem, que se declarou a escrava do Senhor (Lc
1, 38). O apóstolo honra-se várias vezes em suas epístolas com o título de
“servus Christi”.27
A Sagrada Escritura chama muitas vezes os cristãos de
“servi Christi”, e esta palavras “servus”, conforme a observação acertada de um
grande homem28, significava, outrora, apenas escravo, pois não
existiam servos como os de hoje, e os ricos só eram servidos por escravos ou
libertos. E para que não haja a menor dúvida de que somos escravos de Jesus
Cristo, o Concílio de Trento usa a expressão inequívoca “mancipia Christi” e
no-lo aplica: escravos de Jesus Cristo.29 Isto posto:
27) Cf. Rom 1, 1; Gal 1, 10; Filip 1, 1; Tito 1, 1.
28) Henri-Marie Boudon, arcediago d’Evreux, em seu
livro: “La sainte esclavage de l’admirable Mère de Dieu’, cap. II.
29) Catec. Rom., parte I, cap. 3: De secundo Symboli
articulo (in fine).
73. Digo que devemos pertencer a Jesus
Cristo e servi-lo, não só como servos mercenários, mas como escravos amorosos,
que, por efeito de um grande amor, se dedicam a servi-lo como escravos, pela
honra exclusiva de lhe pertencer. Antes do batismo, éramos escravos do demônio;
o batismo nos fez escravos de Jesus Cristo. Importa, pois, que os cristãos
sejam escravos ou do demônio ou de Jesus Cristo.
74. O que digo absolutamente de Jesus
Cristo, digo-o também da Virgem Maria, pois Jesus Cristo, escolhendo-a para sua
companheira inseparável na vida, na morte, na glória, em seu poder no céu e na
terra, deu-lhe pela graça, relativamente à sua majestade, os mesmos direitos e
privilégios que ele possui por natureza. “Quidquid Deo convenit per naturam,
Mariae convenit per gratiam... – Tudo que convém a Deus pela natureza, convém a
Maria pela graça”, dizem os santos. Assim, conforme este ensinamento, pois que
ambos têm a mesma vontade e o mesmo poder, têm também os mesmos súditos, servos
e escravos.30
30)
Oportebat... Dei Matrem ea quae Filii essent possidere (São João Damasc., Sermo
2 in
Dormitione B. M.).
75. Podemos, portanto, seguindo a
opinião dos santos e de muitos doutos, dizer-nos e fazer-nos escravos da
Santíssima Virgem, para deste modo nos tornarmos mais perfeitamente escravos de
Jesus Cristo.29 A Santíssima Virgem é o meio de que Nosso Senhor se
serviu para vir até nós; e é o meio de que nos devemos servir para ir a ele.30
Bem diferente é ela das outras criaturas, as quais, se a elas nos apegarmos,
poderão antes afastar-nos que aproximar-nos de Deus. A mais forte inclinação de
Maria é unir-nos a Jesus Cristo, seu divino Filho; e a mais forte inclinação do
Filho é que vamos a ele por meio de sua Mãe Santíssima. E isto é para ele tanta
honra e prazer, como seria para um rei honra e prazer, se alguém, para
tornar-se mais perfeitamente seu escravo, se fizesse escravo da rainha. Eis por
que os Santos Padres, e São Boaventura com eles, dizem que a Santíssima Virgem
é o caminho para chegar a Nosso Senhor: “Via veniendi ad Christum est
appropinquare ad illam”.31
29) Ita
serviam Matri tuae, ut ex hoc ipse me probes servisse tibi (S. Ildefonso: de
virginitate perpetua B. M., cap. XII).
30) Per ipsam
Deus descendit ad terras, ut per ipsam homines ascendere mereantur ad caelos
(S. Agostinho – Sermo 113 in
Nativit. Domini). Ver também S. Boaventura: Expositio in Lc, cap. I, n. 38. Pio
X, Encíclica “Ad diem illum”.
31)
Psalterium maius B. M., Sl 117.
76. Além disso, se a Virgem Santíssima,
como já disse (v. nº 38), é a rainha e soberana do céu e da terra – “Imperio
Dei omnia subiciuntur et Deus”32, dizem Santo Anselmo, São Bernardo,
São Boaventura – não possui ela tantos súditos e escravos quantas criaturas
existem?33 Não é razoável que, entre tantos escravos por
constrangimento, haja alguns por amor, que de boa vontade e na qualidade de
escravos, escolham Maria para sua soberana? Pois então os homens e os demônios
terão seus escravos voluntários e Maria não há de tê-los? Seria desonra para um
rei se a rainha, sua companheira, não possuísse escravos sobre os quais tivesse
direito de vida e morte34, pois a honra e o poder do rei são a honra
e o poder da rainha; e pode-se acreditar que Nosso Senhor, o melhor de todos os
filhos, que deu a sua Mãe Santíssima parte de todo o seu poder, considere um
mal ter ela escravos?35 Terá ele menos respeito e amor a sua Mãe do
que teve Assuero a Éster e Salomão a betsabé? Quem ousaria dizê-lo ou pensá-lo
sequer?
32) “Ao poder
de Deus tudo é submisso, até a Virgem; ao poder da Virgem tudo é submisso, até
Deus”.
33) “Res
quippe omnes conditas Filius Matri mancipavit”. S. João Damasceno. Sermo 2 in Dormitione B. M. – São
Boaventura: Ancilla Dominae Mariae est quaelibet anima Fidelis, imo etiam
Ecclesia universalis (Speculum B. M. M., lect. III § 5).
34) V. nota
ao n. 71.
35)
Christianiorum memento, qui servi tui sunt. São Germano de Constatinopla: Orat.
hist. In Dormitione Deiparae.
77. Mas onde me leva minha pena? Por
que me detenho aqui a provar uma coisa tão evidente? Se alguém recusa
confessar-se escravo de Maria, que importa? Que se faça e diga escravo de Jesus
Cristo. É o mesmo que ser escravo da Santíssima Virgem, pois Jesus é o fruto e
a glória de Maria. e isto se faz perfeitamente pela devoção de que falaremos a
seguir.36
36) Para
explicação da doutrina exposta neste artigo II, ver: A. Lhomeau: “A vida
espiritual do B. L. M. Grignion de Montfort”, 1ª parte, cap. IV.
Artigo
III
Devemos
despojar-nos do que há de mau em nós
78. Terceira verdade. – Nossas
melhores ações são ordinariamente manchadas e corrompidas pelo fundo de maldade
que há em nós. Quando
se despeja água limpa e clara em uma vasilha suja, que cheira mal, ou quando se
põe vinho em uma pipa cujo interior está azedado por outro vinho que aí antes
se depositara, a água límpida e o vinho bom adquirem facilmente o mau cheiro e
o azedume dos recipientes. Do mesmo modo, quando Deus põe no vaso de nossa
alma, corrompido pelo pecado original e pelo pecado atual, suas graças e
orvalhos celestiais ou o vinho delicioso de seu amor, estes dons divinos ficam
ordinariamente estragados ou manchados pelo mau germe e mau fundo que o pecado
deixou em nós; nossas ações, até as mais sublimes virtudes, disto se ressentem.
É, portanto, de grande importância, para adquirir a perfeição, que só se
consegue pela união com Jesus Cristo, despojar-nos de tudo que de mau existe em nós. Do contrário, Nosso
Senhor, que é infinitamente puro e odeia infinitamente a menor mancha na alma,
nos repelirá e de modo algum se unirá a nós.
* * *
79. Para despojar-nos de nós mesmos, é
preciso conhecer primeiramente e bem, pela luz do Espírito Santo, nosso fundo
de maldade, nossa incapacidade para todo bem, nossa fraqueza em todas as
coisas, nossa inconstância em todo tempo, nossa indignidade de toda graça e
nossa iniqüidade em todo lugar. O pecado de nossos primeiros pais nos estragou
completamente, nos azedou, inchou e corrompeu, como o fermento azeda, incha e
corrompe a massa em que é posto. Os pecados atuais que cometemos, sejam mortais
ou veniais, perdoados que estejam, aumentam em nós a concupiscência, a
fraqueza, a inconstância e a corrupção, deixando maus traços em nossa alma.
Nosso corpo é tão corrompido, que o
Espírito Santo (Rom 6, 6; Sl 50, 7) o chama corpo do pecado, concebido no
pecado, nutrido no pecado, e só apto para o pecado, corpo sujeito a mil e mil
males, que se corrompe sempre mais cada dia, e que só engendra a doença, os
vermes, a corrupção.
Nossa alma, unida ao corpo,
tornou-se tão carnal, que é chamada carne: “Toda a carne tinha corrompido o seu
caminho” (Gn 6, 12). Toda a nossa herança é orgulho e cegueira no espírito,
endurecimento no coração, fraqueza e inconstância na alma, concupiscência,
paixões revoltadas e doenças no corpo. Somos, naturalmente, mais orgulhosos que
os pavões, mais apegados à terra que os sapos, mais feios que os bodes, mais
invejosos que as serpentes, mais glutões que os porcos, mais coléricos que os
tigres e mais preguiçosos que as tartarugas; mais fracos que os caniços, e mais
inconstantes do que um catavento. Tudo que temos em nosso íntimo é nada e
pecado, e só merecemos a ira de Deus e o inferno eterno.37
37) S. Luís
Maria fala de nosso nada e de nossa impotência na ordem sobrenatural, sem o
socorro da graça (v. com efeito, mais adiante o n. 83: Nosso íntimo..., tão
corrompido, se nós apoiamos em nossos próprios trabalhos... para chegar a Deus...).
80. Depois disto, por que admirar-se de
ter Nosso Senhor dito que quem quisesse segui-lo devia renunciar a si mesmo e
odiar a própria alma; que aquele que amasse sua alma a perderia e quem a
odiasse se salvaria? (Jo 12, 25). A Sabedoria infinita, que não dá ordens sem
motivo, só ordena que nos odiemos porque somos grandemente dignos de ódio: só
Deus é digno de amor, enquanto nada há mais digno de ódio do que nós.
81. Em segundo lugar, para despojar-nos
de nós mesmos, é preciso que todos os dias morramos para nós, isto é, importa
renunciarmos às operações das faculdades da alma e dos sentidos do corpo,
precisamos ver como se não víssemos, ouvir como se não ouvíssemos, servir-nos
das coisas deste mundo como se não o fizéssemos (cf. 1Cor 7, 29-31), o que São
Paulo chama morrer todos os dias: “Quotidie morior” (1Cor 15, 31). “Se o grão
de trigo, caindo na terra, não morrer, fica só, e não produz fruto apreciável: Nizi
granum frumenti cadens in terram mortuum fuerit, ipsum solum manet” (Jo 12,
24-25). Se não morrermos a nós mesmos, e se as mais santas devoções não nos
levarem a esta morte necessária e fecunda, não produziremos fruto que valha,
nossas devoções serão inúteis, todas as nossas obras de justiça ficarão
manchadas por nosso amor-próprio e nossa própria vontade, e Deus abominará os
maiores sacrifícios e as melhores ações que possamos fazer. Na hora da nossa
morte, teremos as mãos vazias de virtudes e méritos, e não brilhará em nós a
menor centelha do puro amor, que só é comunicado às almas mortas a si mesmas,
almas cuja vida está oculta com Jesus Cristo em Deus (Col 3, 3).
82. Em terceiro lugar, é preciso
escolher entre todas as devoções à Santíssima Virgem, a que nos leva com mais
certeza a este aniquilamento do próprio eu. Esta será a devoção melhor e mais
santificante, pois é mister reconhecer que nem tudo que luz é ouro, nem tudo
que é doce é mel, e nem tudo que é fácil de fazer e praticar é o mais santificante.
Do mesmo modo que a natureza tem segredos para fazer em pouco tempo, sem muitos
gastos e com facilidade, certas operações naturais, há segredos, na ordem da
graça, pelos quais se fazem, em pouco tempo, com doçura e facilidade, operações
sobrenaturais, como despojar-nos de nós mesmos, encher-nos de Deus, e
tornar-nos perfeitos.
A prática que quero revelar é um
desses segredos da graça, desconhecido da maior parte dos cristãos, conhecidos
de poucos devotos, praticado e apreciado por um número bem diminuto. Antes de
abordar esta prática, apresento uma quarta verdade que é conseqüência da
terceira.
Artigo
IV
Temos
necessidade de um medianeiro junto do próprio medianeiro que é Jesus Cristo
83. Quarta verdade. – É muito
mais perfeito, porque é mais humilde, tomar um medianeiro para nos aproximarmos
de Deus. Se nos apoiarmos sobre nossos próprios trabalhos, habilidade e
preparações, para chegar a Deus e agradar-lhe, é certo que todas as nossas
obras de justiça ficarão manchadas e peso insignificante terão junto de Deus,
para movê-lo a unir-se a nós e nos atender, pois, como acabo de demonstrar,
nosso íntimo é extremamente corrupto. E não foi sem razão que ele nos deu
medianeiros junto de sua majestade. Viu nossa iniqüidade e incapacidade,
apiedou-se de nós, e, para dar-nos acesso às suas misericórdias,
proporcionou-nos intercessores poderosos junto de sua grandeza; de sorte que
negligenciar esses medianeiros e aproximar-se diretamente de sua santidade sem
outra recomendação é faltar ao respeito a um Deus tão alto e tão santo; é
menosprezar este Rei dos reis, como não se faria a um rei ou príncipe da terra,
do qual ninguém se aproximaria sem a recomendação de um amigo.
84. Nosso Senhor é nosso advogado e
medianeiro de redenção junto de Deus Pai; é por intermédio dele que devemos
rezar com toda a Igreja triunfante e militante; é por intermédio dele que
obtemos acesso junto de sua majestade, em cuja presença não devemos jamais
aparecer, a não ser amparados e revestidos dos méritos de Jesus Cristo, como
Jacob revestindo-se da pele de cabrito para receber a bênção de seu pai Isaac.
* * *
85. Mas temos necessidade de um
medianeiro junto do próprio medianeiro? Será a nossa pureza suficiente para que
nos permita unir-nos diretamente a ele, e por nós mesmos? Não é ele Deus, em
tudo igual ao Pai, e, por conseguinte, o Santo dos santos, digno de tanto
respeito como seu Pai? Se ele, por sua caridade infinita, se constituiu nosso
penhor e medianeiro junto de Deus seu Pai, para aplacá-lo e pagar-lhe o que lhe
devíamos, quer isto dizer que lhe devemos menos respeito e tomar por sua
majestade e santidade?
Digamos, pois, ousadamente, com São
Bernardo38, que temos necessidade de um medianeiro junto do
Medianeiro por excelência, e que Maria Santíssima é a única capaz de exercer
esta função admirável. Por ela Jesus Cristo veio a nós, e por ela devemos ir a
ele. Se receamos ir diretamente a Jesus Cristo Deus, em vista da sua grandeza
infinita, ou por causa de nossa baixeza, ou, ainda, devido aos nossos pecados,
imploremos afoitamente o auxílio e intercessão de Maria nossa Mãe; ela é boa e
terna; nela não há severidade nem repulsa, tudo nela é sublime e brilhante
contemplando-a, vemos nossa pura natureza. Ela não é o sol, que, pela força de
seus raios, nos poderia deslumbrar em nossa fraqueza, mas é bela e suave como a
lua (Cant 6, 9), que recebe a luz do sol e a tempera para que possamos
suportá-la. É tão caridosa que a ninguém repele, que implore sua intercessão,
ainda que seja um pecador; pois, como dizem os santos, nunca se ouviu dizer,
desde que o mundo é mundo, que alguém que tenha recorrido à Santíssima Virgem,
com confiança e perseverança, tenha sido desamparado ou repelido.39
Ela é tão poderosa que jamais foi desatendida em seus pedidos; basta-lhe
apresentar-se diante de seu Filho para pedir-lhe algo, e ele só ouve o pedido
para logo conceder-lhe o que ela pede; é sempre amorosamente vencido pelo
seios, pelas entranhas e pelas preces de sua querida Mãe.
38) Sermo in Domin. inf. oct. Assumptionis,
n. 2: “Opus est enim mediatore ad Mediatorem istum, nec alter nobis utilior
quam Maria”. Todo este parágrafo é tirado deste sermão de São Bernardo.
39) Termina
aqui a citação de S. Bernardo. A frase seguinte é tirada de S. Boaventura:
Sermo 2 in
B. V. M.
86. Tudo isto é tirado de São Bernardo
e de São Boaventura. De acordo com suas palavras, temos três degraus a subir
para chegar a Deus: o primeiro, mais próximo de nós e mais conforme à nossa
capacidade, é Maria; o segundo é Jesus Cristo; e o terceiro é Deus Pai.40
Para ir a Jesus é preciso ir a Maria, pois ela é a medianeira de intercessão.
Para chegar ao Pai eterno é preciso ir a Jesus, que é nosso medianeiro de
redenção. Ora, pela devoção que preconizo, mais adiante, é esta a ordem
perfeitamente observada.
40) Cf. S.
Boaventura: Per Mariam ad Christum accedimos, et per Christum gratium Spiritus
Sancti invenimus (Speculum B. V., lect. VI, § 2). – V. também Leão XIII,
Encíclica “Octobri mense”, 22-9-1891.
Artigo
V
É
muito difícil para nós conservar as graças e tesouros recebidos de Deus
87. Quinta verdade. – É extremamente
difícil, devido à nossa fraqueza e fragilidade, conservarmos em nós as graças e
os tesouros que recebemos de Deus:
1º Porque este tesouro, mais valioso
que o céu e a terra, nós os guardamos em vasos frágeis: “Habemus thesaurum
istum in vasis fictilibus” (2Cor 4, 7); em um corpo corruptível, em uma alma
fraca e inconstante que um nada perturba e abate.
88. 2º porque os demônios, que são
ladrões finórios, buscam surpreender-nos de improviso para nos roubar e
despojar; espreitam dia e noite o momento favorável a seu desígnio; andam
incessantemente ao redor de nós, prontos a devorar-nos (cf 1Ped 5, 8) e, pelo
pecado, arrebatar-nos, num momento, tudo que em longos anos conseguimos
alcançar de graças e méritos. E tanto mais devemos temer esta desgraça, sabendo
quão incomparável é sua malícia, sua experiência, suas astúcias e seu número.
Pessoas tem havido muito mais cheias de graças do que nós, mais ricas em
virtudes, mais experientes, mais elevadas em santidade, que foram surpreendidas,
roubadas, saqueadas lamentavelmente. Ah! quantos cedros do Líbano, quantas
estrelas do firmamento se têm visto cair miseravelmente, perdendo em pouco
tempo toda a sua altivez e claridade. A que atribuir tão estranha mudança? Não
foi falta de graça, pois a graça não falta a ninguém; foi falta de humildade.
Essas pessoas acreditavam-se mais fortes e suficientes do que o eram na
realidade; julgavam-se capazes de guardar seus tesouros; fiaram-se e
apoiaram-se em si próprias; creram sua casa bastante segura e bem fortes os
seus cofres para guardar o precioso tesouro da graça, e, devido a essa
segurança imperceptível que tinham em si (conquanto lhes parecesse que se
apoiavam na graça de Deus), é que o justíssimo Senhor, abandonando-as às
próprias forças, permitiu que fossem roubadas. Ah! se tivessem conhecido a
devoção admirável que vou expor, em seguida, teriam confiado seu tesouro à
Virgem poderosa e fiel, que o teria guardado como seu próprio bem, fazendo
mesmo, disso, um dever de justiça.
89. 3º É difícil perseverar na justiça,
por causa da corrupção do mundo. O mundo está, atualmente, tão corrompido, que
é quase necessário que os corações religiosos sejam manchados, se não pela
lama, ao menos pela poeira dessa corrupção; de modo que se pode considerar um
milagre o fato de uma pessoa manter-se firme no meio dessa torrente impetuosa
sem que o turbilhão a arraste; no meio desse mar tempestuoso sem que o furor
das ondas a submerja ou a pilhem os piratas e corsários no meio desse ar
empestado sem que os miasmas a contaminem. É a Virgem, a única fiel, na qual a
serpente não teve parte jamais, que faz este milagre em favor daqueles e
daquelas que a servem da mais bela maneira.
Capítulo
III
Escolha
da verdadeira devoção à Santíssima Virgem
90. Conhecidas estas cinco verdades, é
preciso, mais do que nunca, fazer agora uma boa escolha da verdadeira devoção à
Virgem Santíssima, pois, como jamais, pululam falsas devoções a Maria
Santíssima, as quais passam facilmente por devoções verdadeiras. O demônio, como
um moedeiro falso e um enganador fino e experimentado, tem já enganado e
perdido inúmeras almas, inculcando uma falsa devoção à Santíssima Virgem, e
todos os dias vale-se de sua experiência diabólica para lançar outros mais à
eterna condenação, divertindo-as e acalentando-as no pecado, sob o pretexto de
algumas orações mal recitadas e de algumas práticas exteriores que lhes
inspira. Como um moedeiro falso só falsifica ordinariamente moedas de ouro e
prata, raras vezes imitando outros metais, que não compensam o trabalho, do
mesmo modo o espírito maligno não se detém em falsificar outras devoções que
não sejam as de Jesus e de Maria, à santa comunhão, e à Virgem Santíssima,
porque são estas como ouro e a preta entre os metais.
91. É, portanto, de grande importância
conhecer primeiramente as falsas devoções à Santíssima Virgem, para evitá-las,
e a verdadeira, para abraçá-la; segundo, entre tantas práticas diferentes da
verdadeira devoção à Virgem Santíssima, distinguir a mais perfeita, a mais
agradável a Maria Santíssima, a que mais glória dá a Deus, a mais santificante
para nós, para a esta nos apegarmos.
Artigo
I
Os
sinais da falsa e da verdadeira devoção à Santíssima Virgem
§ I. Os falsos devotos e as falsas
devoções à Santíssima Virgem.
92. Conheço sete espécies de falsos
devotos e falsas devoções à Santíssima Virgem: 1º os devotos críticos,
2º os devotos escrupulosos, 3º os devotos exteriores, 4º os
devotos presunçosos, 5º os devotos inconstantes, 6º os devotos hipócritas,
7º os devotos interesseiros.
1º
Os devotos críticos
93. Os devotos críticos são, em geral,
sábios orgulhosos, espíritos fortes e presumidos, que têm no fundo uma certa
devoção à Santíssima Virgem, mas que vivem criticando as práticas de devoção
que a gente simples tributa de boa-fé e santamente a esta boa Mãe, pelo fato de
estas devoções não agradarem à sua culta fantasia. Põem em dúvida todos os
milagres e histórias narrados por autores dignos de fé, ou inseridos em
crônicas de ordens religiosas, atestando as misericórdias e o poder da
Santíssima Virgem. Repugna-lhes ver pessoas simples e humildes ajoelhadas
diante de um altar ou de uma imagem da Virgem, às vezes no recanto de uma rua,
rezando a Deus; chegam a acusá-las de idolatria, como se estivesse adorando a
pedra ou a madeira. Dizem que, de sua parte, não apreciam essas devoções
exteriores e que seu espírito não é tão fraco que vá dar fé a tantos contos e
historietas que se atribuem à Santíssima Virgem. Quando alguém lhes repete os
louvores admiráveis que os Santos Padres dão à Santíssima Virgem, respondem que
são flores de retórica, ou exagero, que aqueles escritores eram oradores; ou
dão, então, uma explicação má daquelas palavras.41
41) Não se
pense que S. Luís Maria exagere neste ponto. A época em que escrevia era a
desses devotos críticos, que procuravam propagar entre os fiéis escritos
venenosos, como o panfleto de Windenfelt, intitulado: “Avisos salutares da B.
V. Maria a seus devotos indiscretos” (V. Lhomeau: “Vida espiritual”).
Esta espécie de falsos devotos e
orgulhosos e mundanos é muito para temer e eles causam um mal infinito à
devoção à Santíssima Virgem, dela afastando eficazmente o povo, sob pretexto de
destruir-lhes os abusos.
2º
Os devotos escrupulosos
94. Os devotos escrupulosos são aqueles
que receiam desonrar o Filho, honrando a Mãe, e rebaixá-lo se a exaltarem
demais. Não podem suportar que se repitam à Santíssima Virgem aqueles louvores
justíssimos que lhe teceram os Santos Padres; não suportam sem desgosto que a
multidão ajoelhada aos pés de Maria seja maior que ante o altar do Santíssimo
Sacramento, como se fossem antagônicos, e como se os que rezam à Santíssima
Virgem não rezassem a Jesus Cristo por meio dela. Não querem que se fale tão
freqüentemente da Santíssima Virgem, nem que se recorra tantas vezes a ela.
Algumas frases eles as repetem a
cada momento: Para que tantos terços, tantas confrarias e devoções exteriores à
Santíssima Virgem? Vai nisso muito de ignorância! É fazer da religião uma
palhaçada. Falai-me, sim, dos que são devotos de Jesus Cristo (e eles o
nomeiam, muitas vezes, sem se descobrir, digo-o sem parêntesis): cumpre
recorrer a Jesus Cristo, pois é ele o nosso único medianeiro; é preciso pregar
Jesus Cristo, isto sim que é sólido!
Em certo sentido é verdade o que
eles dizem. Mas, pela aplicação que lhe dão, é bem perigoso e constitui uma
cilada sutil do maligno, sob o pretexto de um bem muito maior, pois nunca se há
de honrar mais a Jesus Cristo, do que honrando a Santíssima Virgem, desde que a
honra que se presta a Maria não tem outro fim que honrar mais perfeitamente a
Jesus Cristo, e que só se vai a ela como ao caminho para atingir o termo que é
Jesus Cristo.
95. A santa Igreja, como o Espírito
Santo, bendiz primeiro a Santíssima Virgem e depois Jesus Cristo: “benedicta tu
in mulieribus et benedictus fructus ventris tui Iesus”. Não porque a Santíssima
Virgem seja mais ou igual a Jesus Cristo: seria uma heresia intolerável, mas
porque, para mais perfeitamente bendizer Jesus Cristo, cumpre bendizer antes a
Maria. digamos, portanto, com todos os verdadeiros devotos de Maria, contra seus falsos e escrupulosos devotos: Ó
Maria, bendita sois vós entre todas as mulheres e bendito é o fruto do vosso
ventre, Jesus!
3º
Os devotos exteriores
96. Devotos exteriores são as
pessoas que fazem consistir toda a devoção à Santíssima Virgem em práticas
exteriores; que só tomam interesse pela exterioridade da devoção à Santíssima
Virgem, por não terem espírito interior; que recitarão às pressas uma enfiada
de terços, ouvirão, sem atenção, uma infinidade de missas, acompanharão as
procissões sem devoção, farão parte de todas as confrarias sem emendar de vida,
sem violentar suas paixões, sem imitar as virtudes desta Virgem Santíssima.
Amam apenas o que há de sensível na devoção, sem interesse pela parte sólida.
Se suas práticas não lhes afetam a sensibilidade, acham que não há nada mais a
fazer, ficam desorientados, ou fazem tudo desordenadamente. O mundo está cheio
dessa espécie de devotos exteriores e não há gente que mais critique as pessoas
de oração que se dedicam à devoção interior sem desprezar o exterior de
modéstia, que acompanha sempre a verdadeira devoção.
4º
Os devotos presunçosos
97. Os devotos presunçosos são
pecadores abandonados a suas paixões, ou amantes do mundo, que, sob o belo nome
de cristãos e devotos da Santíssima Virgem, escondem ou o orgulho, ou a
avareza, ou a impureza, ou a embriaguez, ou a cólera, ou a blasfêmia, ou a
maledicência, ou a injustiça, etc.; que dormem placidamente em seus maus
hábitos, sem violentar-se muito para se corrigir, alegando que são devotos da
Virgem; que prometem a si mesmos que Deus lhes perdoará, que não hão de morrer
sem confissão, e não serão condenados porque recitam seu terço, jejuam aos
sábados, pertencem à confraria do santo Rosário ou do Escapulário, ou a alguma
congregação; porque trazem consigo o pequeno hábito ou a cadeiazinha da
Santíssima Virgem, etc.
Quando alguém lhes diz que sua
devoção não é mais do que ilusão e uma presunção perniciosa capaz de perdê-los,
recusam-se a crer; dizem que Deus é bom e misericordioso e que não nos criou
para nos condenar; que não há homem que não peque; que eles não hão de morrer
sem confissão; que um bom peccavi à hora da morte basta; de mais a mais
que eles são devotos da Santíssima Virgem, cujo escapulário usam; e em cuja
honra dizem, todos os dias, irrepreensivelmente e sem vaidade (isto é, com
fidelidade e humildade) sete Pai-nossos e sete Ave-Marias; que recitam mesmo,
uma vez ou outra, o terço e o ofício da
Santíssima Virgem; que jejuam, etc. Para confirmar o que dizem e mais aumentar
a própria cegueira, relembram umas histórias que leram ou ouviram, verdadeiras
ou falsas não importa, em que se afirma que pessoas mortas em pecado mortal,
sem confissão, só pelo fato de que em vida tinham feito algumas orações ou
práticas de devoção à Santíssima Virgem ressuscitaram para se confessar, ou sua
alma permaneceu milagrosamente no corpo até se confessarem, ou, ainda, que,
pela misericórdia da Santíssima Virgem, obtiveram de Deus, na hora da morte, a
contrição e o perdão de seus pecados, e se salvaram. Eles esperam, portanto, a
mesma coisa.
98. Não há, no cristianismo, coisa tão
condenável como essa presunção diabólica; pois será possível dizer de verdade
que se ama e honra a Santíssima Virgem, quando, pelos pecados, se fere, se
traspassa, se crucifica e ultraja impiedosamente a Jesus Cristo, seu Filho? Se
Maria considerasse uma lei salvar essa espécie de gente, ela autorizaria um
crime, ajudaria a crucificar e injuriar seu próprio Filho. Que o ousaria
pensar?
99. Digo que abusar assim da devoção à
Santíssima Virgem, a mais santa e mais sólida devoção a Nosso Senhor e ao
Santíssimo Sacramento, é cometer um horrível sacrilégio, o maior e o menos
perdoável, depois do sacrilégio de uma comunhão indigna.
Confesso que, para ser alguém
verdadeiramente devoto da Santíssima Virgem, não é absolutamente necessário ser
santo ao ponto de evitar todo pecado, conquanto seja este o ideal; mas é
preciso ao menos (note-se bem o que vou dizer):
Em primeiro lugar, estar com a
resolução sincera de evitar ao menos todo pecado mortal, que ofende tanto a Mãe
como o Filho.
Segundo, fazer violência a si mesmo
para evitar o pecado.
Terceiro, filiar-se a confrarias,
rezar o terço, o santo rosário ou outras orações, jejuar aos sábados, etc.
100. Isto é maravilhosamente útil à
conversão de um pecador, mesmo empedernido; e se meu leitor estiver nestas
condições, como que tenha já um pé no abismo, eu lho aconselho, contanto,
porém, que só pratique estas boas obras na intenção de, pela intercessão da
Santíssima Virgem, obter de Deus a graça da contrição e do perdão dos pecados,
e de vencer seus maus hábitos, e não para continuar calmamente no estado de
pecado, a despeito dos remorsos de consciência, do exemplo de Jesus Cristo e dos
santos, e das máximas do santo Evangelho.
5º
Os devotos inconstantes
101. Devotos inconstantes são
aqueles que são devotos da Santíssima Virgem periodicamente, por intervalos e
por capricho: hoje são fervorosos, amanhã tíbios; agora mostram-se prontos a
tudo empreender em serviço de Maria e logo após já não parecem os mesmos. Abraçam logo todas as devoções à
Santíssima Virgem, ingressam em todas as suas confrarias, e em pouco tempo já
nem observam as regras com fidelidade; mudam como a lua42, e Maria os
esmaga sob seus pés como faz ao crescente, pois eles são volúveis e indignos de
ser contados entre os servidores deste Virgem fiel, que têm a fidelidade e a
constância por herança. Vale mais não se sobrecarregar de tantas orações e
práticas de devoção, e fazer poucas com amor e fidelidade, a despeito do mundo,
do demônio e da carne.
42) A lua,
por suas variações, é tomada freqüentemente pelos antigos autores místicos como
o símbolo das mudanças da alma inconstante. – Cf. Ecli 27, 27, 12. São
Bernardo: “Sermo super Signum Magnum”, n.3.
6º
Os devotos hipócritas
102. Há também falsos devotos da
Santíssima Virgem, os devotos hipócritas, que cobrem seus pecados e maus
hábitos com o manto desta Virgem fiel, a fim de passarem aos olhos do mundo por
aquilo que não são.
7º
Os devotos interesseiros
103. Há ainda os devotos interesseiros,
que só recorrem à Santíssima Virgem para ganhar algum processo, para evitar
algum perigo, para se curar de alguma doença ou em qualquer necessidade desse
gênero, sem o que a esqueceriam; uns e outros são falsos devotos que não têm
aceitação diante de Deus e de sua Mãe Santíssima.
* * *
104. Cuidemos, portanto, de não
pertencer ao número dos devotos críticos que em coisa alguma crêem e de
tudo criticam; dos devotos escrupulosos que receiam ser demasiadamente
devotos da Santíssima Virgem, por respeito a Jesus Cristo; dos devotos exteriores
que fazem consistir toda a sua devoção em práticas exteriores; dos devotos presunçosos,
que, sob o pretexto de sua falsa devoção continuam marasmados em seus pecados;
dos devotos inconstantes que, por leviandade, variam suas práticas de
devoção, ou as abandonam completamente à menor tentação; dos devotos hipócritas
que se metem em confrarias e ostentam as insígnias da Santíssima Virgem a fim
de passar por bons; e, enfim, dos devotos interesseiros, que só recorrem
à Santíssima Virgem para se livrarem dos males do corpo ou obter bens
temporais.
§
II. A verdadeira devoção à Santíssima Virgem.
105. Depois de descobrir e condenar as
falsas devoções à Santíssima Virgem, cumpre estabelecer em poucas palavras a
devoção verdadeira, que é: 1º interior, 2º terna, 3º santa,
4º constante, 5º desinteressada.
1º
A verdadeira devoção é interior
106. Antes de tudo, a verdadeira devoção
à Santíssima Virgem é interior, isto é, parte do espírito e do coração.
Vem da estima em que se tem a Santíssima Virgem. Da alta idéia que se formou de
suas grandezas, e do amor que se lhe consagra.
2º
A verdadeira devoção é terna
107. Em segundo lugar é terna,
quer dizer cheia de confiança na Santíssima Virgem, da confiança de um filho em
sua mãe. Impele uma alma a recorrer a ela em todas as necessidades do corpo e
do espírito, com extremos de simplicidade, de confiança e de ternura; ela
implora o auxílio de sua boa Mãe em todo o tempo, em todo lugar, em todas as
coisas: em suas dúvidas, para ser esclarecida; em seus erros, para se corrigir;
nas tentações, para ser sustentada; em suas fraquezas, para ser fortificada; em
suas quedas, para ser levantada; em seus abatimentos, para ser encorajada; em
seus escrúpulos, para ficar livre deles; em suas cruzes, trabalhos e reveses da
vida, para ser consolada. Em todos os males do corpo e do espírito, enfim,
Maria é o refúgio, e não há receio de importunar esta boa Mãe e desagradar a
Jesus Cristo.
3º
A verdadeira devoção é santa
108. Terceiro, a verdadeira devoção à
Santíssima Virgem é santa: leva uma alma a evitar o pecado e a imitar as
virtudes da Santíssima Virgem, principalmente sua humildade profunda, sua
contínua oração, sua obediência cega, sua fé viva, sua mortificação universal,
sua pureza divina, sua caridade ardente, sua paciência heróica, sua doçura
Angélica e sua sabedoria divina. Aí estão as dez principais da Santíssima
Virgem.
4º
A verdadeira devoção é constante
109.
Quarto,
verdadeira devoção à Santíssima Virgem é constante, firma uma alma no
bem, e ajuda-a a perseverar em suas práticas de devoção. Torna-a corajosa para
se opor ao mundo em suas modas e máximas, à carne, em seus aborrecimentos e
paixões, e ao demônio, em suas tentações. Assim, uma pessoa verdadeiramente
devota da Santíssima Virgem não é volúvel, nem se deixa dominar pela
melancolia, pelos escrúpulos ou pelos receios. Não quer isto dizer que não caia
ou não mude, às vezes, na sensibilidade de sua devoção; mas, se cai, levanta-se
logo, estende a mão à sua boa Mãe, e, se perde o gosto ou a devoção sensível,
não se aflige irremediavelmente, pois o justo e devoto fiel de Maria vive da fé
de Jesus e de Maria, e não nos sentimentos naturais.
5º
A verdadeira devoção é desinteressada
110.
A
verdadeira devoção à Santíssima Virgem é, finalmente, desinteressada,
leva a alma a buscar não a si mesma, mas somente a Deus em sua Mãe Santíssima.
O verdadeiro devoto de Maria não serve a esta augusta Rainha por espírito de
lucro e de interesse, nem para seu bem temporal ou eterno, corporal ou
espiritual, mas unicamente porque ela merece ser servida, e Deus exclusivamente
nela; o verdadeiro devoto não ama a Maria precisamente porque ela lhe faz ou
ele espera dela algum bem, mas porque ela é amável. Só por isto ele a ama e
serve nos desgostos e na aridez, como nas doçuras e no fervor sensível, sempre
com a mesma fidelidade; ama-a nas amarguras do Calvário como nas alegrias de
Caná. Oh! como é agradável e precioso aos olhos de Deus e de sua Mãe
Santíssima, esse devoto, que em nada se busca nos serviços que presta à sua
Rainha. Mas, também, quão raro é encontrá-lo agora. E é com o fito de que
cresça o número desses fiéis devotos, que empunhei a pena para escrever o que
tenho, com particular fruto, ensinado em público e em particular nas minha
missões, durante anos e anos.
* * *
111. Muitas coisas já disse sobre a
Santíssima Virgem. Mais ainda tenho, entretanto, a dizer, e infinitamente mais
omitirei, seja por ignorância, incapacidade ou falta de tempo, no desígnio que
tenho de formar um verdadeiro devoto de Maria e um verdadeiro discípulo de
Jesus Cristo.
112. Oh! bem empregado seria o meu
esforço, se este escrito, caindo nas mãos duma alma bem nascida, nascida de
Deus e de Maria, e não do sangue, ou da vontade da carne, nem da vontade do
homem (cf. Jo 1, 13), lhe desvendasse e inspirasse, pela graça do Espírito
Santo, a excelência e o prêmio da verdadeira e sólida devoção à Santíssima
Virgem, como vou indicar. Se eu soubesse que meu sangue pecaminoso poderia
servir para fazer entrar no coração as verdades que escrevo em honra de minha
querida Mãe e soberana Senhora, da qual sou o último dos filhos e escravos, em
lugar de tinta eu o usaria para formar esses caracteres, na esperança que me
anima de encontrar boas almas que, por sua fidelidade à prática que ensino,
compensarão minha boa Mãe e Senhora das perdas que lhe têm causado minha
ingratidão e infidelidade.
113. Sinto-me, mais do que nunca,
animado a crer e esperar em tudo que tenho profundamente gravado no coração, e
que há muitos anos peço a Deus: que mais cedo ou mais tarde a Santíssima Virgem
terá mais filhos, servidores e escravos44, como nunca houve, e que,
por este meio, Jesus Cristo, meu amado Mestre, reinará totalmente em todos os
corações.
44) Note-se a
associação destes dois termos: filho e escravo. A mesma aproximação foi
feita pelo Catecismo do Concílio de Trento (p. I, cap. 3, “De secundo symboli
articulo”, in fine).
114. Vejo, no futuro, animais frementes,
que se precipitam furiosos para dilacerar com seus dentes diabólicos este
pequeno manuscrito e aquele de quem o Espírito Santo se serviu para escrevê-lo,
ou ao menos para fazê-lo ficar envolto nas trevas e no silêncio de uma arca, a
fim de que ele não apareça. Atacarão até, e perseguirão aqueles e aquelas que o
lerem e o puserem em
prática.45 Mas não importa! tanto melhor! Esta
visão me encoraja e me dá a esperança de um grande sucesso, isto é, um
esquadrão de bravos e destemidos soldados de Jesus e de Maria, de ambos os
sexos, para combater o mundo, o demônio e a natureza corrompida, nos tempos
perigosos que virão, e como ainda não houve.
“Que legit, intelligat. Qui potest
capere, capiat” (Mt 24, 15; 19, 12).
45) Esta
predição realizou-se ao pé da letra. Em todo o decorrer do século XVIII, os
filhos de Montfort fora o alvo dos ataques dos jansenistas, em vista de seu
zelo por esta devoção. E o precioso manuscrito, escondido durante as
perturbações da Revolução Francesa, só foi encontrado em 1842 por um padre da
Companhia de Maria, em um caixote de livros antigos.
Artigo
II
As
práticas da verdadeira devoção à Santíssima Virgem
§
I. As práticas comuns.
115. Há muitas práticas interiores
da verdadeira devoção à Santíssima Virgem. As principais são, abreviadamente,
as seguintes:
1. Honrá-la, como a digna Mãe de
Deus, com o culto de hiperdulia, isto é, estimá-la e honrá-la sobre todos os
outros santos, como a obra-prima da graça e a primeira depois de Jesus Cristo,
verdadeiro Deus e verdadeiro homem. 2. Meditar suas virtudes, seus privilégios
e seus atos. 3. Contemplar suas grandezas. 4. Fazer-lhe atos de amor, de louvor
e reconhecimento. 5. Invocá-la cordialmente. 6. Oferecer-se e unir-se a ela. 7.
Em todas as ações ter a intenção de agradar-lhe. 8. Começar, continuar, e acabar
todas as ações por ela, nela, com ela e para ela, a fim de fazê-las por Jesus
Cristo, em Jesus Cristo,
com Jesus Cristo e para Jesus Cristo, nosso último fim. Mais adiante
explicaremos esta última prática (Ver cap. VIII, art, II).
* * *
116. A verdadeira devoção à Santíssima
Virgem tem também muitas práticas exteriores, das quais as principais
são:
1º Alistar-se em suas confrarias e
ingressar em suas congregações; 2º ingressar numa das ordens instituídas em sua
honra; 3º publicar seus louvores; 4º dar esmolas, jejuar e mortificar-se o
espírito e o corpo em sua honra; 5º trazer consigo suas insígnias, como o santo
rosário ou o terço, o escapulário ou a cadeiazinha; 6º recitar com devoção,
atenção e modéstia ou o santo rosário, composto de quinze dezenas de Ave-Maria,
em honra dos quinze mistérios principais de Jesus Cristo, ou o terço de cinco
dezenas, contemplando os cinco mistérios gozosos: anunciação, a visitação, a
natividade de Jesus Cristo, a purificação e o encontro de Jesus no templo; os
cinco mistérios dolorosos: a agonia de Jesus no Jardim das Oliveiras, sua
flagelação, a coroação de espinhos, Jesus levando cruz, e a crucificação; os
cinco mistérios gloriosos: a ressurreição de Jesus, sua ascensão, a descida do
Espírito Santo, a assunção da Santíssima Virgem em corpo e alma ao céu, e sua
coroação pelas três pessoas da Santíssima Trindade. Pode-se recitar também uma
coroa de seis ou sete dezenas em honra dos anos que se crê a Santíssima Virgem
ter vivido na terra; ou a coroinha da Santíssima Virgem, composta de três
Pai-nossos e doze Ave-Marias, em honra de sua coroa de doze estrelas ou
privilégios; outrossim o ofício da Santíssima Virgem universalmente conhecido e
recitado pela Igreja; o pequeno saltério da Santíssima Virgem que São
Boaventura compôs em sua honra, tão terno e devoto que não se pode recitá-lo
sem enternecimento; quatorze Pai-nossos e Ave-Marias em honra de suas quatorze
alegrias; quaisquer outras orações, enfim, hinos e cânticos da Igreja, como o
“Salve Rainha”, o “Alma”, o Ave Regina caelorum”, ou o “Regina caeli”, conforme
os diferentes tempos; ou o “Ave, Maris Stella”, “O gloriosa Domina”, etc., ou o
“Magnificat”, e outras orações e hinos de que andam cheios os devocionários; 7º
cantar e fazer cantar em sua honra cânticos espirituais; 8º fazer-lhe um certo
numero de genuflexões ou reverências, dizendo-lhe, p. ex., todas as manhãs,
sessenta ou cem vezes: “Ave, Maria, Virgo Fidelis”, para, por meio dela, obter
de Deus a fidelidade às graças durante o dia; e à noite: “Ave, Maria, Mater
Misericordiae”, para, por intermédio dela, alcançar de Deus o perdão dos
pecados cometidos durante o dia; 9º ter zelo por suas confrarias, ornar seus
altares, coroar e enfeitar suas imagens; 10º carregar nas procissões ou fazer
que se conduza sua imagem nas procissões, e trazê-la consigo como uma arma
eficaz contra o demônio; 11º mandar fazer imagens que a representem, ou seu
nome, e colocá-los nas igrejas, nas casas, nos pórticos ou à entrada das
cidades, igrejas e casas; 12º consagrar-se a ela, de uma maneira especial e
solene.
117. Há uma quantidade de outras
práticas da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, que o Espírito Santo tem
inspirado às almas de escol, e que são muito santificantes. Pode-se
encontrá-las mais extensamente no livro “Paraíso aberto a Filágia”do Padre
Paulo Barry, da Companhia de Jesus. Aí o autor coligiu grande número de
devoções praticadas pelos santos em honra da Santíssima Virgem, devoções
maravilhosamente úteis para santificar as almas, desde que sejam praticadas
como devem, isto é:
1º Com reta e boa intenção de
agradar só a Deus, de unir-se a Jesus Cristo como o nosso fim último, e de
edificar o próximo; 2ª com atenção, sem distrações voluntárias; 3º com devoção,
sem precipitação nem negligência; 4º com modéstia e compostura, em atitude
respeitosa e edificante.
§
II. A prática perfeita.
118. Depois de ler quase todos os livros
que tratam da devoção à Santíssima Virgem e de conversar com as pessoas mais
santas e instruídas destes últimos tempos, declaro firmemente que não encontrei
nem aprendi outra prática de devoção à Santíssima Virgem semelhante a esta que
vou iniciar, que exija de uma alma mais sacrifícios a Deus, que a despoje mais
completamente de seu amor-próprio, que a conserve com mais fidelidade na graça
e a graça nela, que a una com mais perfeição e facilidade a Jesus Cristo, e,
afinal, que seja mais gloriosa para Deus, santificante para a alma e útil ao
próximo.
119. O essencial desta devoção consiste
no interior que ela deve formar, e, por este motivo, não será compreendida
igualmente por todo o mundo. Alguns hão de deter-se no que ela tem de exterior,
e não passarão avante, e estes serão o maior número; outros, em número
reduzido, entrarão em seu interior, mas subirão apenas um degrau. Quem
alcançará o segundo? Quem se elevará ao terceiro? Quem, finalmente, se
identificará nesta devoção? Aquele somente a quem o Espírito de Jesus Cristo
revelar este segredo. Ele mesmo conduzirá a esse estado a alma fiel, fazendo-a
progredir de virtude em virtude, de graça em graça e de luz em luz, para que
ela chegue a transformar-se em
Jesus Cristo, e atinja a plenitude de sua idade sobre a terra
e de sua glória no céu.
Capítulo
IV
Da
perfeita devoção à Santíssima Virgem ou a perfeita consagração a Jesus Cristo
120. A mais perfeita devoção é aquela pela
qual nos conformamos, unimos e consagramos mais perfeitamente a Jesus Cristo,
pois toda a nossa perfeição consiste em sermos conformados, unidos e
consagrados a ele. Ora, pois que Maria é, de todas as criaturas, a mais conforme
a Jesus Cristo, segue daí que, de todas as devoções, a que mais consagra e
conforma uma alma a Nosso Senhor é a devoção à Santíssima Virgem, sua santa
Mãe, e que, quanto mais uma alma se consagrar a Maria, mais consagrada estará a
Jesus Cristo.
Eis por que a perfeita consagração a
Jesus Cristo nada mais é que uma perfeita e inteira consagração à Santíssima
Virgem, e nisto consiste a devoção que eu ensino; ou, por outra, uma perfeita
renovação dos votos e promessas do santo batismo.
Artigo
I
Uma
perfeita e inteira consagração de si mesmo à Santíssima Virgem
121. Esta devoção consiste, portanto, em
entregar-se inteiramente à Santíssima Virgem, a fim de, por ela, pertencer
inteiramente a Jesus Cristo.46 É preciso dar-lhe 1º nosso corpo com
todos os seus membros e sentidos, 2º nossa alma com todas as suas potências, 3º
nossos bens exteriores, que chamamos de fortuna, presentes e futuros, 4º nossos
bens interiores e espirituais, que são nossos méritos, nossas virtudes e nossas
boas obras passadas, presentes e futuras. Numa palavra, tudo que temos na ordem
da natureza e na ordem da graça, e tudo que, no porvir, poderemos ter na ordem
da natureza, da graça e da glória, e isto sem nenhuma reserva, sem a reserva
sequer de um real, de um cabelo, da menor boa ação, para toda a eternidade, sem
pretender e nem esperar a mínima recompensa de sua oferenda e de seu serviço, a
não ser a honra de pertencer a Jesus Cristo por ela e nela, mesmo que esta
amável Senhora não fosse, como é sempre, a mais liberal e reconhecida das criaturas.
46) Cf. S.
João Damasceno: “Mentem, animam, corpus, nos iposque totos consecramus” (Sermo
I in Dormitione B. V.).
122. Importa notar, aqui, duas coisas
que há nas boas obras que fazemos, a saber: a satisfação e o mérito, ou o valor
satisfatório ou impetratório e o valor meritório. O valor satisfatório ou
impetratório duma boa obra é uma boa ação na medida em que satisfaz a pena
devida pelo pecado, ou em que obtêm alguma nova graça; o valor meritório ou o
mérito é uma boa ação, em quanto merece a graça e a glória eterna. Ora, nesta
consagração de nós mesmos à Santíssima Virgem, nós lhe damos todo o valor
satisfatório, impetratório e meritório, ou por outra, as satisfações e os
méritos de todas as nossas boas obras: damos-lhe nossos méritos, nossas graças
e nossas virtudes, não para comunicá-los a outrem (porque nossos méritos,
graças e virtudes, propriamente falando, são incomunicáveis; só Jesus Cristo,
fazendo-se nosso penhor diante do Pai, pôde comunicar-nos seus méritos), mas
para no-los conservar, aumentar e encarecer, como diremos ainda. (V. nn. 146,
ss). Damos-lhe nossas satisfações para que ela as comunique a quem bem lhe
pareça e para maior glória de Deus.
* * *
123. Daí segue 1º que, por esta devoção,
damos a Jesus Cristo, do modo mais perfeito, pois que o fazemos pelas mãos de
Maria, tudo que lhe podemos dar, e muito mais que por outras devoções, pelas
quais lhe damos uma parte de nosso tempo ou de nossas boas obras, ou uma parte
de nossas satisfações e mortificações. Aqui damos e consagramos tudo, até o
direito de dispor dos bens interiores, e as satisfações que ganhamos por nossas
boas obras, dia a dia: e isto não se faz nem mesmo numa ordem religiosa.
Nestas, consagram-se a Deus os bens de fortuna pelo voto de pobreza, os bens do
corpo pelo voto de castidade, a vontade própria pelo voto de obediência, e, às
vezes, a liberdade do corpo pelo voto de clausura. Não se lhe dá, porém, a
liberdade ou o direito que temos de dispor de nossas boas obras, nem se
renuncia tanto como se pode ao que o cristão tem de mais precioso e caro: seus
méritos e satisfações.
124. 2º Uma pessoa, que assim
voluntariamente se consagrou e sacrificou a Jesus Cristo por Maria, já não pode
dispor do valor de nenhuma de suas boas ações. Tudo o que sofre, tudo o que pensa,
diz e faz de bem pertence a Maria, para que ela de tudo disponha conforme a
vontade e para maior glória de seu Filho, sem que, entretanto, esta dependência
prejudique de modo algum as obrigações de estado no qual esteja presentemente,
ou venha a estar no futuro: por exemplo, as obrigações de um sacerdote que, por
dever de ofício ou por outro motivo, deve aplicar o valor satisfatório e
impetratório da santa missa a um particular; pois não se faz esta oferta a não
ser conforme a ordem de Deus e os deveres de estado.
125. 3º A consagração é feita
conjuntamente à Santíssima Virgem e a Jesus Cristo; à Santíssima Virgem como ao
meio perfeito que Jesus Cristo escolheu para se unir a nós e nós a ele; e a
Nosso Senhor como o nosso fim último, ao qual devemos tudo o que somos, como a
nosso Redentor e nosso Deus.
Artigo
II
Uma
perfeita renovação dos votos do batismo
126. Disse acima (V. nº 120) que a esta
devoção podia-se chamar muito bem uma perfeita renovação dos votos ou promessas
do santo batismo.
Todo cristão, antes do batismo, era
escravo do demônio, pois lhe pertencia. Na ocasião do batismo o cristão, por
sua própria boca ou pela de seu padrinho e de sua madrinha, renunciou a
Satanás, a suas pompas e obras, e tomou Jesus Cristo para seu Mestre e soberano
Senhor, passando a depender dele, na qualidade de escravo por amor. É o que se
faz pela presente devoção: renuncia-se (como está indicado na fórmula de
consagração) ao demônio, ao mundo, ao pecado e a si próprio, dando-se
inteiramente a Jesus Cristo pelas mãos de Maria. Faz-se até algo mais, pois se,
no batismo, falamos ordinariamente pela boca de outrem, pela boca do padrinho
ou da madrinha, nesta devoção fazemo-lo nós mesmos, voluntariamente, com
conhecimento de causa.
No batismo não é pelas mãos de Maria
que nos damos a Jesus Cristo, pelo menos duma maneira expressa, nem fazemos
doação a ele do valor de nossas boas ações; depois do batismo, ficamos
inteiramente livres de aplicar esse valor a quem quisermos ou de conservá-lo
para nós. Por essa devoção, damo-nos, porém, a Nosso Senhor pelas mãos de
Maria, e lhe consagramos o valor de todas as nossas ações.
127. No santo batismo, diz Santo Tomás,
os homens fazem o voto de renunciar ao demônio e às suas pompas: “In baptimo
vovent homines abrenuntiare diabolo et pompis eius”.47 E este voto,
afirma Santo Agostinho, é o maior e o mais indispensável. “Votum maximum
nostrum quo vovimus nos Christo esse mansuros”.48 É também o que
dizem os canonistas: “Praecipuum votum est quod in baptismate facimus” – o voto
principal é o que fazemos no batismo. Quem, entretanto, guarda tão grande voto?
Quem é que mantém fielmente as promessas do santo batismo? Não é um fato que
quase todos os cristãos falseiam à fidelidade que no batismo prometeram a Jesus
Cristo? Donde poderá vir esse desregramento universal senão do esquecimento em
que se vive das promessas e compromissos do santo batismo, e por que cada um
não ratifica espontaneamente o contrato de aliança feito com Deus por seu
padrinho e sua madrinha?
47) Summa Theol. 2-2, q. 88, art. 2, arg. 1.
48) Epistola
59 ad Paulin.
128. É tão verdade isto, que o Concílio
de Sens convocado por ordem de Luís o Bonachão para pôr cobro às grandes
desordens dos cristãos, declarou que a causa principal da corrupção reinante
vinha do esquecimento e ignorância em que se vivia dos compromissos tomados no
santo batismo; e não encontrou melhor remédio tão grande mal do que induzir os
cristãos a renovar as promessas do santo batismo.
129. O Catecismo de Concílio de Trento,
fiel intérprete deste santo Concílio, exorta os curas a fazer o mesmo, e a
relembrar aos fiéis que estão ligados e consagrados a Nosso Senhor Jesus
Cristo, como escravos a seu Redentor e Senhor. Eis as palavras textuais:
“Parochus fidelem populum ad eam rationem cohortabitur ut sicat aequissimum
esse... nos ipsos, nom secus ac mancipia Redemptori nostro et Domino in
perpetuum addicere et consecrare”.49
49) Catec. Conc. Trid., p. I, cap. 3, art. 2, § 15,
“De secundo Symboli articulo” in fine.
130. Ora, se os Concílios, os Santos Padres
e a própria experiência nos mostram que o melhor meio de remediar os
desregramentos dos cristãos é fazê-los relembrar as obrigações assumidas no
batismo e renovar os votos que então fizeram, não é natural que se faça isto
presentemente, de um modo perfeito, por esta devoção e consagração a Nosso
Senhor, por intermédio de sua Mãe Santíssima? Digo “de um modo perfeito” porque
nos servimos, nesta consagração a Jesus Cristo, do mais perfeito de todos os
meios, que é a Santíssima Virgem.
Respostas a algumas objeções
131. Não se pode objetar que esta
devoção seja nova ou sem importância. Não é nova porque os concílios, os padres
e muitos autores antigos e modernos falam desta consagração a Nosso Senhor ou
renovação das promessas do batismo, como de uma prática antiga, aconselhando-a
a todos os cristãos. Esta prática também não é sem importância, pois a
principal fonte de todas as desordens e conseqüente condenação dos cristãos
está no esquecimento e indiferença por esta renovação.
132. Alguns podem alegar que esta
devoção, levando-nos a dar a Nosso Senhor, pelas mãos de Maria Santíssima, o
valor de todas as nossas boas obras, orações, mortificações e esmolas, nos
torna impotentes para socorrer as almas de nossos parentes, amigos e
benfeitores.
A esses respondo primeiro que não é
crível que nossos amigos, parentes ou benfeitores sofram prejuízo por nos
termos devotado e consagrado sem reserva ao serviço de Nosso Senhor e de sua
Mãe Santíssima. Seria fazer uma injúria ao poder e bondade de Jesus e Maria, que
saberão muito bem valer os nossos parentes, amigos e benfeitores, aproveitando
o nosso crédito espiritual, ou por outro meio qualquer.
Segundo, esta prática não impede que
rezemos pelos outros, vivos ou mortos, se bem que a aplicação de nossas boas
obras dependa da vontade da Santíssima Virgem; e, bem ao contrário, esta
circunstância nos levará a rezar com muito mais confiança, do mesmo modo que
uma pessoa rica, que tivesse doado a um grande príncipe todos os seus bens,
rogaria com redobrada confiança a esse príncipe que beneficiasse a algum amigo
necessitado. Seria até causar prazer a esse príncipe dar-lhe ocasião de
demonstrar seu reconhecimento a uma pessoa que de tudo se tivesse despojado
para engrandecê-lo, que se tivesse reduzido a completa pobreza para honrá-lo. O
mesmo se deve dizer de Nosso Senhor e da Santíssima Virgem: eles jamais se
deixarão vencer em reconhecimento.
* * *
133. Outros dirão, talvez: Se eu der à
Santíssima Virgem todo o valor de minhas ações para que ela o aplique a quem
quiser, terei de sofrer talvez muito tempo no purgatório.
Esta objeção, produto do
amor-próprio e da ignorância da liberalidade de Deus e de sua Mãe Santíssima,
destrói-se por si mesmo. Uma alma cheia de fervor e generosa, que antepõe os
interesses de Deus aos seus próprios, que tudo que tem dá a Deus inteiramente,
sem reserva, que só aspira à glória e ao reino de Jesus Cristo por intermédio
de sua Mãe Santíssima, e que se sacrifica completamente para obtê-lo, esta alma
generosa, repito, e liberal, será castigada no outro mundo por ter sido mais
liberal e desinteressada que as outras? Muito ao contrário, é a esta alma, como
veremos a seguir, que Nosso Senhor e sua Mãe Santíssima se mostram mais
generosos neste mundo e no outro, na ordem da natureza, da graça e da glória.
* * *
134. Vejamos agora, o mais brevemente
que pudermos, os motivos que nos recomendam esta devoção, os
maravilhosos efeitos que ela produz nas almas fiéis, e as práticas
desta devoção.
Capítulo
V
Motivos
que nos recomendam esta devoção
Artigo
I
Esta
devoção nos põe inteiramente ao serviço de Deus
135. Primeiro motivo, que nos
mostra a excelência desta consagração de nós mesmos a Jesus Cristo pelas mãos
de Maria.
Desde que não se pode conceber sobre
a terra emprego mais relevante que o serviço de Deus; se o menor servidor de
Deus é mais rico, mais poderoso e mais nobre que todos os reis e imperadores da
terra que não sejam também servidores de Deus, quais não serão as riquezas, o
poder e a dignidade do fiel e perfeito servidor que se tiver devotado ao
serviço divino, tão inteiramente e sem reserva quanto for capaz!? Assim será um
fiel e amoroso escravo de Jesus e Maria, que, pelas mãos de Maria Santíssima,
se entregar inteiramente ao serviço deste Rei dos reis, e que não reservar nada
para si: nem todo ouro da terra e as belezas do céu o podem pagar.
136. As outras congregações, associações
e confrarias eretas em honra de Nosso Senhor e de Nossa Senhora, que promovem
grande bem no cristianismo, não mandam que se dê tudo sem reserva; não
prescrevem a seus associados mais que certas práticas e atos para satisfazerem
suas obrigações; deixam-nos livres em todas as outras ações e instantes de sua
vida. Mas nesta devoção, que apresento, damos sem reserva a Jesus e Maria todos
os nossos pensamentos, palavras, ações e sofrimentos, e todos os momentos da
vida: de sorte que, ou despertados ou adormecidos, bebendo ou comendo, nas
ações as mais importantes como nas mais corriqueiras, pode-se sempre dizer em
verdade que o fazemos, embora nem sequer nos ocorra a idéia, pertence a Jesus e
Maria em virtude da nossa oferta, a menos que a retratemos expressamente. Que
consolação!
137. Além disso, como já ficou dito, não
há outra prática como esta, pela qual nos desfazemos facilmente dum certo
espírito de propriedade, que se insinua até nas melhores ações; e nosso bom
Jesus nos dá esta grande graça em recompensa do ato heróico e desinteressado
que fizemos, cedendo-lhe, pelas mãos de sua Mãe Santíssima, todo o valor de
nossas boas obras. Se, mesmo neste mundo, ele dá o cêntuplo àqueles que, por
seu amor, abandonam os bens exteriores, temporais e caducos (cf. Mt 19, 20), em
que proporção dará aos que lhe sacrificarem até seus bens interiores e
espirituais?!
138. Jesus, nosso divino amigo, deu-se a
nós sem reserva, seu corpo e sua alma, suas virtudes, graças e méritos: “Se
toto totum me comparavit” – diz São Bernardo: Ele ganhou-me inteiramente
dando-se inteiramente a mim. A justiça e a gratidão exigem, portanto, que lhe
demos tudo que pudermos. Foi ele o primeiro a ser liberal para conosco; sejamos
também generosos para com sua liberalidade, durante a vida, na hora da morte e
por toda a eternidade. “Cum liberali liberalis erit”.
Artigo
II
Esta
devoção leva a imitar o exemplo dado por Jesus Cristo, e a praticar a humildade
139. Segundo motivo, que nos
mostra que é justo e vantajoso aos cristãos consagrar-se, por esta prática,
inteiramente à Santíssima Virgem, a fim de pertencer mais perfeitamente a Jesus
Cristo.
Este bom Mestre não desdenhou
encerrar-se no seio da Santíssima Virgem, como um cativo, um escravo amoroso, e
submeter-se a ela, obedecendo-lhe durante trinta anos. É aqui, repito, que o
espírito humano se confunde, quando reflete seriamente nesta atitude da divina
Sabedoria encarnada, que não quis, embora podendo, dar-se diretamente aos
homens, preferindo fazê-lo por intermédio da Santíssima Virgem; que não quis
aparecer no mundo em plena idade viril, independentemente de quem quer que
fosse, mas como uma criancinha dependendo dos cuidados de sua Mãe Santíssima, e
mantida por ela. Esta Sabedoria infinita, cheia de um desejo imenso de
glorificar a Deus seu Pai e de salvar os homens, não encontrou meio algum mais
perfeito nem mais simples de fazê-lo, do que submetendo-se em todas as coisas à
Santíssima Virgem, não só durante oito, dez ou quinze anos, mas durante trinta
anos; e ele deu mais glória a Deus seu Pai durante todo esse tempo de submissão
à Santíssima Virgem, como não lhe deu empregando os últimos três anos de sua
vida a fazer prodígios, e pregar por toda parte, a converter os homens. Oh! que
grande glória damos a Deus, submetendo-nos a Maria, a exemplo de Jesus.
Com um exemplo tão visível e
conhecido por todo mundo, seremos insensatos a ponto de pensar que
encontraremos um meio mais perfeito e mais certo submetendo-nos a Maria, a
exemplo de seu Filho?
140. Lembremos aqui, para prova da
dependência que devemos ter para com Maria, o que já ficou dito (nn. 14-39),
citando os exemplos que nos dão o Pai, o Filho e o Espírito Santo nesta dependência.
Deus Pai nos deu e nos dá seu Filho por ela somente, só produz outros filhos
por meio dela, e só por intermédio dela nos comunica suas graças. Deus Filho
foi formado para todo o mundo, por ela, e não é senão por ela que é formado
todos os dias, e gerado por ela em união com o Espírito Santo, é ela a única
via pela qual nos comunica suas virtudes e seus méritos. O Espírito Santo
formou Jesus Cristo por meio dela, e por meio dela forma os membros de seu
corpo místico, e só por ela nos dispensa seus dons e favores. Depois de
exemplos tão claros e instantes, poderemos, sem uma extrema cegueira,
prescindir de Maria, deixar de consagrar-nos a ela e de depender dela para
irmos a Deus e a ele nos sacrificarmos?
141. Eis algumas passagens dos Santos
Padres, que escolhi como prova do que acabo de dizer: “Duo filii Mariae sunt,
homo Deus e homo purus; unius corporaliter, et alterius spiritualiter mater est
Maria” (S. Boav. e Orígenes).50
50) “Maria
tem dois filhos, um, homem-Deus e o outro, puro homem; de um Maria é Mãe
corporal, do outro, mãe espiritual” (Speculum B.M.V., lect. III, § 1, 2º).
“Haec est voluntas Dei, qui totum
nos voluit habere per Mariam; ac proinde, si quid spei, si quid gratiae, si
quid salutis, ab ea noverimus redundare” (S. Bern.).51
51) São Bernardo
(De Aquaeductu, n. 6): “Tal é a vontade de Deus que quis que tenhamos tudo por
Maria. Se, portanto, temos alguma esperança, alguma graça, algum dom salutar,
saibamos que isto nos vem por suas mãos”.
“Omnia dona, virtutes, gratiae
ipsius Spiritus Sancti, quibus vult, et quando vult, quomodo vult, quantum vult
per ipsius manus administrantur” (S. Bernardino).52
52) São
Bernardino de Sena (Sermo in Nativ. B.V. art. un., cap. 8): “Todos os dons,
virtudes e graças do Espírito Santo são distribuídos pelas mãos de Maria, a
quem ela quer, quando quer, com o quer, e quanto quer”.
“Qui indignus eras cui daretur,
datum est Mariae, ut per eam acciperes quidquid haberes” (S. Bernardo).53
53) São
Bernardo (Sermo 3 in
vigilia Nativitatis Domini, n. 10): “Eras indigno de receber as graças divinas:
por isso elas foram dadas a Maria, a fim de que por ela recebesses tudo o que
terias”.
142. Deus, vendo que somos indignos de
receber suas graças diretamente de suas mãos divinas, dá-as a Maria, a fim de
obtermos por ela o que ele nos quer dar; e também redunda em glória para ele,
receber pelas mãos de Maria o reconhecimento, o respeito e o amor que lhe
devemos por seus benefícios. É, pois, muito justo que imitemos o procedimento
de Deus, a fim – diz São Bernardo54 – de que a graça volte a seu
autor pelo mesmo canal por onde veio: “Ut eodem alveo ad largitorem gratia
redeat quo fluxit”.
54) “De Aquaeductu”, n. 18.
É o que fazemos por meio de nossa
devoção: oferecemos e consagramos à Santíssima Virgem tudo o que somos e tudo o
que possuímos, a fim de que Nosso Senhor receba por sua mediação a glória e o
reconhecimento que lhe devemos. Reconhecemo-nos indignos e incapazes de, por
nós mesmos, aproximar-nos de sua majestade infinita; e por isso servimo-nos da
intercessão da Santíssima Virgem.
143. Além disso, é uma prática de grande
humildade, virtude que Deus ama acima de todas as outras. Uma alma que se eleva
a si mesma, rebaixa Deus; Deus resiste aos soberbos e dá sua graça aos humildes
(Tg 4, 6). Se vos rebaixais crendo-vos indignos de aparecer diante dele e de
vos aproximar dele, ele desce, rebaixa-se para vir até vós, para comprazer-se
em vós, e para vos elevar. Quando, porém, tentamos aproximar-nos atrevidamente
de Deus, sem medianeiro, Deus se esquiva e não conseguimos atingi-lo. Oh!
quanto ele ama a humildade de coração. É a esta humildade que convida esta
prática de devoção, pois ensina a não nos aproximarmos diretamente de Nosso
Senhor, por misericordioso e doce que ele seja, mas a nos servirmos sempre da
intercessão da Santíssima Virgem tanto para comparecer diante de Deus, como
para lhe falar, aproximar-nos dele, oferecer-lhe qualquer coisa, para nos
unirmos ou nos consagrarmos a ele.
Artigo
III
Esta
devoção nos proporciona as boas graças da Santíssima Virgem
§ I. Maria se dá a quem é seu
escravo por amor.
144. Terceiro motivo. A
Santíssima Virgem, Mãe de doçura e misericórdia, que jamais se deixa vencer em
amor e liberalidade, vendo que alguém se lhe entrega inteiramente, para
honrá-la e servir-lhe, despojando-se do que tem de mais caro para com isso
adorná-la, entrega-se também inteiramente e dum modo inefável, a quem tudo lhe
dá. Ela o faz imergir no abismo de suas graças, e reveste-o de seus
merecimentos, dá-lhe o apoio de seu poder, ilumina-o com sua luz, abrasa-o de
seu amor, comunica-lhe suas virtudes: sua humildade, sua fé, sua pureza, etc.;
constitui-se seu penhor, seu suplemento, seu tudo para com Jesus. Como, enfim,
essa pessoa consagrada é toda de Maria, Maria também é toda dela; de modo que
se pode dizer desse perfeito servo e filho de Maria o que São João Evangelista
diz de si próprio, que ele a tomou como um bem, para sua casa: “Accepit eam
discipulus in sua” (Jo 19, 27).
145. É isto que produz na alma fiel uma
grande desconfiança, desprezo e ódio de si mesma, ao lado de uma confiança
ilimitada na Santíssima Virgem, sua boa Senhora. Já não procura, como antes, o
seu apoio em suas próprias disposições, intenções, méritos, virtudes e boas
obras, pois, tendo sacrificado tudo a Jesus por esta boa Mãe, só lhe resta um
tesouro que resume todos os seus bens e de que ele não dispõe, e esse tesouro é
Maria.
É o que o faz aproximar-se de Nosso
Senhor, sem receio servil nem escrupuloso, e rezar com extrema confiança; é o
que o faz adquirir os sentimentos do devoto e sábio abade Ruperto, o qual,
aludindo à vitória de Jacob sobre o anjo (cf. Gn 32, 23), dirige à Santíssima
Virgem estas belas palavras: “Ó Maria, minha princesa e Mãe Imaculada de
Deus-homem, Jesus Cristo, é meu desejo lutar com este Homem, isto é, o Verbo
divino, armado não com meus próprios méritos, mas com os vossos: “O Domina, Dei
Genitrix, Maria, et incorrupta Mater Dei e hominis, non meis, sed tuis armatus
meritis, cum isto Viro, scilicet Verbo
Dei, luctare cupio”.55
55) Rup.,
Prolog. in Cant.
Oh! quão poderoso e forte é, para
Jesus Cristo, quem está armado dos méritos e da intercessão da digna Mãe de
Deus, que, como diz Santo Agostinho, venceu amorosamente o Todo-poderoso.
§ II. Maria purifica nossas boas
obras, embeleza-as e as torna aceitáveis a seu Filho.
146. Esta bondosa Senhora purifica,
embeleza e torna aceitáveis a seu Filho todas as nossas boas obras, porque, por
esta devoção, as damos todas a ele pelas mãos de sua Mãe Santíssima.
1º Ela as purifica de toda mancha de
amor-próprio e do apego imperceptível à criatura, apego que se insinua
insensivelmente nas melhores ações. Desde que elas estão em suas mãos
puríssimas e fecundas, estas mesmas mãos, que não foram jamais manchadas nem
ociosas, e que purificam tudo que tocam, tiram do presente que lhe fazemos tudo
que pode deteriorá-lo ou torná-lo imperfeito.
147. 2º Ela embeleza nossas boas ações
ornando-as com seu méritos e virtudes. É como se um campônio, querendo ganhar a
amizade do rei, se dirigisse à rainha, e lhe apresentasse uma maçã, que
representasse todo o seu lucro, e lhe pedisse que a oferecesse ao rei. A
rainha, acolhendo a pobre dádiva do camponês, punha-a no centro de grande e
magnífico prato de ouro, e apresentava-a assim ao rei, da parte do ofertante.
Nestas circunstâncias, a maçã, indigna por si mesma de ser oferecida ao rei,
torna-se um presente digno de sua majestade, devido ao prato de ouro e à
importância da pessoa que a apresenta.
148. 3º Ela apresenta essas boas obras a
Jesus Cristo, pois nada retém para si do que lhe ofertamos. Tudo remete
fielmente a Jesus. Se algo lhe damos a ela, damos necessariamente a Jesus. Se a louvamos e glorificamos, logo
ela louva e glorifica a Jesus. Hoje como outrora, quando Santa Isabel a
exaltou, ela canta, quando a louvamos e bendizemos: “Magnificat anima mea
Dominum...” (Lc 1, 46).
149. 4º Faz Jesus aceitar essas boas
obras, por pequeno e pobre que seja o presente que ofertamos ao Santo dos
Santos e Rei dos reis. Quando apresentamos alguma coisa a Jesus, de nossa
própria iniciativa e apoiados em nossa própria capacidade e disposição, Jesus
examina o presente e muitas vezes o rejeita em vista das manchas que a dádiva
contraiu do nosso amor-próprio, como antigamente rejeitou os sacrifícios dos
judeus por estarem cheios de vontade própria. Quando, porém, lhe apresentamos
algo pelas mãos puras e virginais de sua bem-amada, tomamo-lo pelo seu lado
fraco, se me é permitida a expressão. Ele não considera tanto a oferta que lhe
fazemos como sua boa Mãe que lha apresenta; não olha tanto a procedência como a
portadora. Deste modo, Maria, que nunca foi repelida, e, pelo contrário, foi
sempre bem recebida, faz que seja agradavelmente recebido pela Majestade divina
tudo que lhe apresenta, pequeno ou grande: basta que Maria lho apresente para
que Jesus o receba e acolha. Conselho valioso é o que dava São Bernardo aos que
dirigia no caminho da perfeição: “Quando quiserdes oferecer qualquer coisa a
Deus, tende o cuidado de oferecê-lo pelas mãos agradáveis e digníssimas de
Maria, a menos que queirais ser rejeitados” – Modicum quid offerre desideras,
manibus Mariae offerendum tradere cura, si non vis sustinere repulsam.56
56) São
Bernardo: “De Aquaeductu”.
150. E, como vimos (n. 146), a própria
natureza não inspira aos pequenos como agir em relação aos grandes? Por que não
há de levar-nos a graça a fazer o mesmo em relação a Deus, que está
infinitamente acima de nós, e diante do qual somos menos que átomos? tendo além
disso uma advogada tão poderosa, que não foi jamais repelida; tão habilidosa
que conhece os segredos para ganhar o Coração de Deus; tão boa e caridosa que
não se esquiva a ninguém, por pequeno e mau que seja.
Referirei mais adiante a verdadeira
figura das verdades que afirmo, na história de Jacob e Rebeca (v. cap. VI).
Artigo
IV
Esta
devoção é um meio excelente de promover a maior glória de Deus
151. Quarto motivo. Esta devoção fielmente praticada é
um excelente meio para fazer com que o valor de todas as nossas boas obras
contribua para a maior glória de Deus. Quase ninguém age com este nobre intuito,
apesar de a isto estarmos obrigados, ou porque não conhece em que consiste a
maior glória de Deus, ou porque não a quer. Mas a Santíssima Virgem, a quem
conferimos o valor de nossas boas obras, sabe perfeitamente em que consiste a
maior glória de Deus, e nada faz que não contribua para este fim. Daí, um
perfeito servo dessa amável Soberana, que a ela se consagrou inteiramente, como
dissemos, pode dizer ousadamente que o valor de todas as suas ações,
pensamentos e palavras, é aproveitado para a maior glória de Deus, a não ser
que revogue expressamente a intenção de sua oferta. Pode-se encontrar algo de
mais consolador para uma alma que ama a Deus com um amor puro e desinteressado,
e que preza mais a glória e os interesses de Deus, que os seus próprios
interesses?
Artigo
V
Esta
devoção conduz à união com Nosso Senhor
152. Quinto motivo. Esta devoção
é um caminho fácil, curto, perfeito e seguro para
chegar à união com Nosso Senhor, e nisto consiste a perfeição do cristão.
§
I. Esta devoção é um caminho fácil.
É um caminho fácil; é um caminho que
Jesus Cristo abriu quando veio a nós, e no qual não há obstáculo que nos impeça
de chegar a ele. Pode-se, é verdade, chegar a ele por outros caminhos; mas
encontram-se muito mais cruzes e mortes estranhas, e muito mais empecilhos, que
dificilmente se vencem. Será preciso passar por noites obscuras, por combates e
agonias terríveis, escalar montanhas escarpadas, pisando espinhos agudos,
atravessar desertos horríveis. Enquanto que pelo caminho de Maria passa-se com
muito mais doçura e tranqüilidade.
Aí se encontram, sem dúvida, rudes
combates a travar, e dificuldades enormes para vencer. Mas esta boa Mãe e
Senhora está sempre tão próxima e presente a seus fiéis servos, para alumiá-los
em suas trevas, esclarecê-los em suas dúvidas, encorajá-los em seus receios,
sustê-los em seus combates e dificuldades, que, em verdade, este caminho
virginal, para chegar a Jesus Cristo é um caminho de rosas e de mel, em vista
de outros caminhos. Houve alguns santos, mas em pequeno número, como Santo
Efrém, São João Damasceno, São Bernardo, São Bernardino, São Boaventura, São
Francisco de Sales, etc., que trilharam este caminho ameno para ir a Jesus
Cristo, porque o Espírito Santo, esposo fiel de Maria, o indicou a eles por uma
graça especial; os outros santos, porém, que são em muito maior número, embora
tenham tido devoção à Santíssima Virgem, não entraram, ou entraram muito pouco,
nesta via. E por isso tiveram de arrostar provas bem mais rudes e mais
perigosas.
* * *
153. A que atribuir, então, – dirá algum
fiel servidor desta boa Mãe, – que seus servos tenham de enfrentar tantas
ocasiões de sofrer, e mais que os outros que não lhe são devotos?
Contradizem-nos, perseguem-nos, caluniam-nos, não os suportam57; ou,
então, andam em trevas interiores, e em aridez de deserto onde não pinga nem
uma gota de orvalho celeste. Se esta devoção torna mais fácil o caminho que
conduz a Jesus Cristo, donde vem que eles são tão desprezados?
57) Cf. S.
Boaventura: “Servientes tibi plus aliis invadunt dracones inferni” (Psalter.
maius B. V., Sl 118).
154. Respondo-lhes que é bem verdade que
os mais fiéis servos da Santíssima Virgem, porque são os seus grandes
favoritos, recebem dela as maiores graças e favores do céu, isto é, as cruzes;
mas sustento que são também os servidores de Maria que levam estas cruzes com
mais facilidades, mérito e glória; e mais que, onde outro qualquer pararia mil
vezes e até cairia, eles não se detêm e, ao contrário, avançam sempre, porque
esta boa Mãe, cheia de graça e unção do Espírito Santo, adoça todas as cruzes
que para eles talha, no mel de sua doçura maternal e na unção do puro amor;
deste modo, eles as suportam alegremente, como nozes confeitadas, que, de
natureza, são amargas. E creio que uma pessoa que quer ser devota e viver
piedosamente em Jesus
Cristo, e, por conseguinte, sofrer perseguições e carregar
todos os dias sua cruz, não carregará nunca grandes cruzes, ou não as carregará
alegremente até ao fim, sem uma terna devoção à Santíssima Virgem, que torna
doces as cruzes; do mesmo modo que uma pessoa não poderia, sem uma grande
violência, impossível de manter indefinidamente, comer nozes verdes que não
fossem saturadas de açúcar.
§
II. Esta devoção é um caminho curto.
155. Esta devoção à Santíssima Virgem é
um caminho curto58, para encontrar Jesus Cristo, seja porque
dele não nos extraviamos, seja porque, como acabo de dizer, nele marchamos com
mais alegria e facilidade, e, conseqüentemente, com mais prontidão. Avançamos
mais, em pouco tempo de submissão e dependência a Maria, do que em anos
inteiros de vontade própria e contando apenas com o próprio esforço; pois o
homem obediente e submisso a Maria Santíssima cantará vitórias
(Prov. 21, 28) assinaladas sobre seus inimigos. Estes hão de querer impedi-lo
de avançar, ou obrigá-lo a recuar, ou derrubá-lo; mas, apoiado, auxiliado e
guiado por Maria, ele, sem cair, sem recuar, sem mesmo atrasar-se, avançará a
passos de gigante em direção a Jesus Cristo, pelo mesmo caminho, que, como está
escrito (Sl 18, 6), Jesus trilhou para vir a nós em largos passos e em pouco
tempo.
58) Cf. S.
Bernardo : “Tu es via compendiosa in caelo” (Laudes glor. Virginis). – Cf.
Bento XV: “Recta et tanquam compendiaria via ad Iesum per Mariam itur” (Epist.
ad R. P. D. Schoepfer. – AAS 1914, p. 515).
156. Por que viveu Jesus Cristo tão
pouco sobre a terra, e por que esses poucos anos que aqui viveu passou-os quase
todos em submissão e obediência a sua Mãe? Ah! é que, tendo vivido pouco,
encheu a carreira de uma longa vida (Sb 4, 13); viveu longamente e mais do que
Adão, do qual veio reparar as perdas, embora este tenha vivido mais de
novecentos anos; e Jesus Cristo viveu longamente, porque viveu bem submisso e
bem unido a sua Mãe Santíssima, para obedecer a Deus seu Pai; pois: 1º aquele
que honra sua mãe assemelha-se a um homem que entesoura, diz o Espírito Santo,
isto é, aquele que honra a Maria, sua Mãe, ao ponto de submeter-se a ela e
obedecer-lhe em tudo, em breve se tornará rico, pois acumula tesouros todos os
dias, pelo segredo desta pedra filosofal: “Qui honorat matrem, quasi qui
thesaurizat” (Ecli 3, 5); 2º porque, conforme uma interpretação espiritual da
palavra do Espírito Santo: “Senectus mea in misericordia uberi, - Minha velhice
se encontra na misericórdia do seio” (Sl 91, 11), é no seio de Maria, que
“envolveu e gerou um homem perfeito” (cf. Jer 31, 22), e que “teve a capacidade
de conter aquele que o universo todo não compreende nem contém”59, é
no seio de Maria que os jovens envelhecem em luz, em santidade, em experiência
e em sabedoria, e onde, em poucos anos, se atinge a plenitude da idade de Jesus
Cristo.
59) Cf.
Gradual da Missa da Santíssima Virgem (de Pentecostes ao Advento); 1º Responso
do Ofício da Santíssima Virgem.
§
III. Esta devoção é um caminho perfeito.
157. Esta prática de devoção à
Santíssima Virgem é um caminho perfeito para ir e unir-se a Jesus
Cristo, pois Maria é a mais perfeita e a mais santa das criaturas, e Jesus
Cristo, que veio perfeitamente a nós, não tomou outro caminho em sua grande e
admirável viagem. O Altíssimo, o Incompreensível, o Inacessível, aquele que é,
quis vir a nós, pequenos vermes da terra, que nada somos. Como se fez isto? O
Altíssimo desceu perfeita e divinamente até nós por meio da humilde Maria, sem
nada perder de sua divindade e santidade; e é por Maria que os pequeninos devem
subir perfeita e divinamente ao Altíssimo sem recear coisa alguma. O
Incompreensível deixou-se compreender e conter perfeitamente por Maria, sem
nada perder de sua imensidade; é também pela pequena Maria que devemos deixar-nos
conduzir e conter perfeitamente sem a menor reserva. O Inacessível
aproximou-se, uniu-se estreitamente, perfeitamente e até pessoalmente à nossa
humanidade por meio de Maria, sem perder uma parcela de sua majestade; é também
por Maria que devemos aproximar-nos de Deus e unir-nos a sua majestade,
perfeita e estreitamente, sem temor de repulsa. Aquele que é quis, enfim, vir
ao que não é, e fazer que aquele que não é se torne Deus ou aquele que é. E ele
o fez perfeitamente, dando-se e submetendo-se inteiramente à Virgem Maria sem
deixar de ser no tempo aquele que é na eternidade; outrossim, é por Maria que,
se bem que sejamos nada, podemos tornar-nos semelhantes a Deus, pela graça e
pela glória, dando-nos a ela tão perfeita e inteiramente, que nada sejamos em
nós mesmos e tudo nela, sem receio de enganar-nos.
158. Ainda que me apresentem um caminho
novo para ir a Jesus Cristo, e que esse caminho seja pavimentado com todos os
merecimentos dos bem-aventurados, ornados de todas as suas virtudes heróicas, iluminado
e decorado de todas as luzes e belezas dos anjos, e que todos os anjos e santos
lá estejam para conduzir, defender e amparar aqueles e aquelas que o quiserem
palmilhar; em verdade, em verdade, digo ousadamente, e digo a verdade, eu havia
de preferir a este, tão perfeito, o caminho imaculado de Maria: “Posui
immaculatam viam meam” (Sl 18, 33), via ou caminho sem a menor nódoa ou mancha,
sem pecado original ou atual, sem sombras nem trevas; e quando meu amável Jesus
vier, em sua glória, uma segunda vez à terra (como é certo) para aqui reinar, o
caminho que escolherá será Maria Santíssima, o mesmo pelo qual ele veio com
segurança e perfeitamente a primeira vez. A diferença entre a primeira e a
última vinda é que a primeira foi secreta e oculta, e a segunda será gloriosa e
retumbante; ambas, porém, são perfeitas, porque, como a primeira, também a
segunda será por Maria. Eis um mistério que não podemos compreender: “Hic
taceat omnis lingua”.
§
IV. Esta devoção é um caminho seguro.
159. Esta devoção à Santíssima Virgem é
um caminho seguro para irmos a Jesus Cristo e adquirirmos a perfeição,
unindo-nos a ele:
1º Porque esta prática, preconizada
por mim, não é nova; é tão antiga, que não se pode, como diz Boudon60,
em um livro que escreveu sobre esta devoção, determinar-lhe com toda a precisão
os começos. Em todo caso é certo que há mais de 700 anos encontram-se vestígios
dela na Igreja.61
60)
Henri-Marie Boudon, doutor em teologia, falecido em odor de santidade, em 1702,
como arcediago de Evreux. Autor do livro intitulado “A santa escravidão da
admirável Mãe de Deus”, e de outras obras, todas impregnadas de uma ardente
devoção à Santíssima Virgem.
61) O santo
rei Dagoberto II (século VII) consagrou-se assim à Santíssima Virgem, na
qualidade de escravo (cit. por Kronenburg in “Maria’s Heerlikheid”, 1, 98). O
mesmo fez o Papa João VII (701-707).
Santo Odilon, abade de Cluni, que
viveu cerca do ano 1040 foi um dos primeiros que a praticaram na França,
conforme está anotado em sua vida.
O cardeal Pedro Damião62 refere
que em 1016 o bem-aventurado Marinho, seu irmão, se fez escravo da Santíssima
Virgem, em presença de seu diretor e de um modo bem edificante: pôs a corda ao
pescoço, tomou a disciplina, e depositou sobre o altar uma quantia de dinheiro
como sinal do seu devotamento e consagração à Santíssima Virgem; e assim
continuou tão fielmente, que, na hora da morte, mereceu ser visitado e
consolado por sua boa Soberana, de cujos lábios recebeu as promessas do paraíso
em recompensa de seus serviços.
62) Declarado
“doutor da Igreja” por Leão XIII.
Cesário Bollando menciona um ilustre
cavaleiro, Vautier de Birbak, parente chegado dos duques de Lovaina, que, aí
pelo ano 1300 fez esta consagração à Santíssima Virgem.
160. O padre Simão de Roias da Ordem da
Trindade, também chamada da redenção dos cativos, pregador do rei Filipe III,
pôs em voga esta devoção em toda a Espanha (em 1611) e na Alemanha63;
a instâncias de Filipe III, obteve de Gregório XV grandes indulgências para
aqueles que a praticassem.
63) O próprio
imperador Fernando II fez esta consagração com toda a sua corte, em 1640.
O padre de Los Rios, da Ordem de S.
Agostinho, aplicou-se com seu íntimo amigo, o padre de Roias, a espalhar esta
devoção por toda a Espanha e Alemanha, o que fez por seus escritos e pregações.
Compôs um grosso volume intitulado “Hierarquia Mariana”64, no qual
trata com piedade e erudição, da antiguidade, da excelência e da solidez desta
devoção.
64) Editado
em Antuérpia em 1641.
161. Os reverendos padres teatinos
estabeleceram esta devoção na Itália, na Sicília e na Sabóia, no século 17.
O rev. Padre Estanislau Falácio, da
Companhia de Jesus, incrementou maravilhosamente esta devoção na Polônia.65
65) O rei da
Polônia Wladislaf encarregou os jesuítas de pregá-la em seu reino.
O rev. Padre Cornélio a Lápide,
recomendável tanto por sua piedade como por seu profundo saber, tendo recebido
de vários bispos e teólogos a incumbência de dar seu parecer sobre esta
devoção, examinou-a acuradamente e teceu-lhe louvores dignos de sua piedade, e
seu exemplo foi seguido por muitas outras pessoas importantes.
Os reverendos padres Jesuítas,
sempre zelosos do serviço da Santíssima Virgem, apresentaram ao duque Fernando
da Baviera, em nome dos congreganistas de Colônia, um pequeno tratado desta
devoção.66 O duque, que era, então arcebispo de Colônia, deu-lhe sua
aprovação e a permissão de imprimi-lo, exortando todos os curas e religiosos de
sua diocese de propagar, quanto pudessem, esta sólida devoção.
66)
Intitulado “Mancipium Virginis” – A escravidão da Virgem. Colônia, 1634.
162. O cardeal de Bérulle, cuja memória
é abençoada por toda a França, foi um dos mais zelosos em espalhar esta
devoção, apesar de todas as calúnias e perseguições que lhe levantaram e
moveram os críticos e os libertinos. Acusaram-nos de inventar novidade e
superstição; escreveram e publicaram contra ele um panfleto difamatório, e
serviram-se, ou antes o demônio, por seu ministério, de mil estratagemas para
impedi-lo de divulgar na França esta devoção. Mas o grande e santo homem só opôs
a suas calúnias uma inalterável paciência, e às suas objeções, contidas no tal
libelo, um pequeno escrito em que as refuta energicamente, demonstrando que
esta devoção é fundada no exemplo de Jesus Cristo, nas obrigações que lhe
devemos, e nos votos que fizemos no santo batismo, e é especialmente com esta
última razão que ele fecha a boca a seus adversários, fazendo ver que esta
consagração à Santíssima Virgem e a Jesus Cristo por suas mãos, nada mais é que
uma perfeita renovação das promessas do batismo. Diz, enfim, muitas coisas
belas que se podem ler nas suas obras.
163. No livro de Boudon, já citado (n.
159), encontra-se os nomes dos Papas que aprovaram esta devoção, dos teólogos
que a examinaram, pode-se ler das perseguições que lhe suscitaram e que venceu,
e dos milhares de pessoas que a abraçaram, sem que jamais Papa algum a tenha
condenado; nem seria possível fazê-lo sem derrubar os fundamentos do
cristianismo.
Fica, portanto, de pé que esta
devoção não é nova, e que não é comum, por ser preciosa demais para ser
apreciada e praticada por todo mundo.
* * *
164. 2º Esta devoção é um meio seguro
para ir a Jesus Cristo, porque pertence à Santíssima Virgem e lhe é próprio
conduzir-nos a Jesus Cristo, como compete a Jesus Cristo conduzir-nos ao Pai
celestial. E não creiam erroneamente as pessoas espirituais que Maria seja um
empecilho no caminho que conduz à união divina. Pois seria possível que aquela
que achou graça diante de Deus para o mundo todo em geral, e para cada uma em
particular, fosse um empecilho a uma alma que busca a grande graça da união com
ele? Seria possível que aquela que tem sido cheia e superabundante de graças, e
tão unida e transformada em Deus, a ponto de ele encarnar-se nela, impedisse
uma alma de ficar perfeitamente unida a Deus?
É verdade que a vista de outras
criaturas, ainda que santas, poderia, talvez, em certos tempos, retardar a
união divina; mas não Maria, como já disse e direi sempre sem me cansar. Uma
das razões por que tão poucas almas atingem a plenitude da idade de Jesus
Cristo, é que Maria, a Mãe do Filho e a Esposa do Espírito Santo, não está
suficientemente formada nos corações. Quem quiser o fruto bem maduro e formado
deve ter a árvore que a produz; quem quer possuir o fruto de vida, Jesus
Cristo, deve ter a árvore da vida, que é Maria. Quem quiser ter em si a
operação do Espírito Santo, deve ter sua Esposa fiel e inseparável, Maria
Santíssima, que o torna fértil e fecundo, como já dissemos alhures (nn. 20-21).
165. Persuadi-vos, portanto, de que
quanto mais contemplardes Maria em vossas orações, meditações, ações e
sofrimentos, se não de um modo distinto e perceptível, ao menos geral e
imperceptível, tanto mais perfeitamente encontrareis Jesus Cristo, que, com
Maria, é sempre grande, poderoso, ativo e incompreensível, e muito mais que no
céu e em qualquer criatura do universo. Assim, Maria Santíssima, toda abismada
em Deus, esta longe de tornar-se um obstáculo aos perfeitos no seu caminho para
chegar à união com Deus, e, bem ao contrário, não houve até hoje, nem haverá
nunca criatura que nos auxilie mais eficazmente do que ela nesta grande obra,
seja pelas graças que para este efeito vos comunicará, pois ninguém fica cheio
do pensamento de Deus se não for por ela, diz um santo67: “Nemo
cogitatione Dei repletur nisi per te”;
seja pelas ilusões e trapaças do espírito maligno contra o qual ela vos
garantirá.
67) São
Germano de Constantinopla (Sermo 2
in Dormit.).
166. Onde está Maria, não entra o
espírito maligno; e um dos sinais mais infalíveis de que se está sendo conduzido
pelo bom espírito, é a circunstância de ser muito devoto de Maria, de pensar
nela muitas vezes, e de falar-lhe freqüentemente. É esta a opinião de um santo68
que acrescenta que, como a respiração é sinal inconfundível de que o corpo não
está morto, o pensamento assíduo e a invocação amorosa de Maria é um sinal
certo de que a alma não está morta pelo pecado.
68) Idem:
Orat. in Encaenia veneranda aedis B. V.
167. Maria sozinha esmagou e exterminou
as heresias, diz a Igreja com o Espírito Santo que a conduz: “Sola cunctas
haereses interemisti in universo mundo”69; e embora os críticos
resmunguem contra esta afirmação, jamais um fiel devoto de Maria cairá na
heresia ou na ilusão, pelo menos formal; poderá errar materialmente, tomar a
mentira por verdade, e o espírito maligno pelo bom, e isto mesmo não tão
facilmente como outro qualquer. Mais cedo ou mais tarde, porém, reconhecerá sua
falta e seu erro material, e, quando o reconhecer, não teimará de modo algum em
crer e sustentar o que tomara por verdade.
69) Ofício da
Santíssima Virgem, 1ª antífona do 3º noturno.
* * *
168. Qualquer pessoa, portanto, sem
receio de ilusão comum às pessoas de oração, que quiser avançar no caminho da
perfeição e achar segura e perfeitamente Jesus Cristo, abrace de todo o coração,
“corde magno et animo volenti” (2Mac 1, 3), esta devoção à Santíssima Virgem,
que talvez ainda desconheça. Entre neste caminho excelente que não conhecia e
que eu lhe mostro (1Cor 12,31). É um caminho trilhado por Jesus Cristo, a
Sabedoria encarnada, nosso único chefe. Os fiéis que o trilharem não podem
estar enganados.
É um caminho fácil devido à
plenitude da graça e da unção do Espírito Santo, de que está cheio: ninguém,
que marche neste caminho, se cansa, nem recua. É um caminho curto que em
pouco tempo nos leva a Jesus Cristo. É um caminho perfeito, onde não há
lama, nem poeira, nem a menor sujeira do pecado. É, enfim, um caminho seguro
que, de um modo reto e garantido, sem voltas para a direita ou para a esquerda,
nos conduz a Jesus Cristo e à vida eterna. Entremos, portanto, neste caminho, e
marchemos dia e noite, até a plenitude da idade de Jesus Cristo (cf. Ef. 4,
13).
Artigo
VI
Esta
devoção dá uma grande liberdade interior
169. Sexto motivo. Esta prática
de devoção dá, às pessoas que a praticam fielmente, uma grande liberdade
interior, que é a liberdade dos filhos de Deus (cf. Rm 8,21). Visto que, por
esta devoção, nos tornamos escravos de Jesus Cristo, consagrando-nos todo a ele
nesta condição, este bom Mestre, em recompensa do cativeiro por amor a que nos
submetemos, tira, primeiro, à alma todo escrúpulo e temor servil, que a
constrangem, escravizam e perturbam; segundo, alarga o coração por uma santa
confiança em Deus, fazendo-o considerá-lo como Pai; terceiro, inspira-lhe um
amor terno e filial.
170. Sem me deter em amontoar razões
para provar esta verdade, contento-me de citar uma passagem histórica que li na
vida da Madre Inês de Jesus, religiosa jacobina70 do convento de
Langeac em Auvergne, a qual morreu em odor de santidade nesse mesmo lugar, em
1634. Não tinha ela ainda sete anos, quando, uma ocasião, sofrendo tormentos de
espírito, ouviu uma voz que lhe disse que, se ela quisesse livrar-se de todos
os seus sofrimentos e ser protegida contra todos os seus inimigos, se fizesse
quanto antes escrava de Jesus e de sua Mãe Santíssima. Mal chegou em casa,
entregou-se inteiramente a Jesus e Maria, como lhe aconselhara a voz, embora
não soubesse antes em que consistia esta devoção; e, tendo encontrado uma
corrente de ferro, cingiu-se com ela os rins e a usou até à morte. Depois desse
ato todas as suas penas e escrúpulos cessaram, e ela se achou numa grande paz e
bem-estar de coração, e isto a levou a ensinar esta devoção a muitas outras
pessoas, que fizeram grandes progressos, entre outros, a M. Olier, que
instituiu o seminário de São Sulpício, e a muitos outros padres e eclesiásticos
do mesmo seminário... Um dia a Santíssima Virgem lhe apareceu e lhe pôs ao
pescoço uma cadeia de ouro para lhe testemunhar a alegria de tê-la como escrava
de seu Filho e sua; e Santa Cecília, que acompanhava a Santíssima Virgem, lhe
disse: Felizes os fiéis escravos da Rainha do céu, pois gozarão da verdadeira
liberdade: “Tibi servire libertas”.
70) Até a
Revolução Francesa os religiosos da Ordem de São Domingos eram chamados
jacobinos, do nome da igreja de
Saint-Jacques (São Tiago) em Paris, perto da qual a Ordem se
estabeleceu.
Artigo
VII
Nosso
próximo aufere grandes bens desta devoção
171. Sétimo motivo. O que pode
ainda levar-nos a abraçar esta devoção são os grandes bens que por ela receberá
nosso próximo. Pois, praticando-a, exercemos para com ela a caridade de uma
maneira eminente, já que lhe damos pelas mãos de Maria o que temos de mais
caro, isto é, o valor satisfatório e impetratório de todas as nossas boas obras,
sem excetuar o menor dos bons pensamentos e o mais leve sofrimento; consentimos
em que tudo que adquirimos, e que havemos de adquirir de satisfações, seja, até
à hora da morte, empregado conforme à vontade da Santíssima Virgem, à conversão
dos pecadores ou à libertação das almas do purgatório.
Não é isto amar perfeitamente o
próximo? Não é este o verdadeiro discípulo de Jesus Cristo, que se reconhece
pela caridade? (Jo 13, 35). Não é este o meio de converter os pecadores, sem
temer a vaidade, e de livrar as almas do purgatório, sem fazer quase nada mais
do que aquilo a que cada um está obrigado em seu estado?
172. Para conhecer a excelência deste
motivo, seria preciso conhecer o bem que é converter um pecador ou livrar uma
alma do purgatório: bem infinito, maior que criar o céu e a terra71,
pois que é dar a uma alma a posse de Deus. Mesmo que, por esta prática, não se
livrasse mais que uma alma do purgatório, ou se convertesse apenas um pecador,
não seria isto bastante para induzir todo homem verdadeiramente caridoso a
abraçá-la?
71) S. Agost., Tract. 72 in Ioann., a medio.
É preciso notar ainda que nossas
boas obras, passando pelas mãos de Maria, recebem um aumento de pureza, e, por
conseguinte, de mérito e de valor satisfatório e impetratório; por isso elas se
tornam muito mais capazes de aliviar os pecadores do purgatório e de converter
os pecadores do que se não passassem pelas mãos virginais e liberais de Maria.
O pouco que damos pela Santíssima Virgem, sem vontade própria, e por uma
desinteressada caridade, tornar-se, em verdade, bem mais potente para abrandar
a cólera de Deus e atrair sua misericórdia; e há de verificar-se à hora da
morte que uma pessoa fiel a esta prática terá, por este meio, libertado
inúmeras almas do purgatório, e convertido muitos pecadores, conquanto só tenha
feito as ações comuns e ordinárias do seu estado. Que alegria haverá em seu
julgamento! Que glória na eternidade!
Artigo
VIII
Esta
devoção é um meio admirável de perseverança
173. Oitavo motivo. Finalmente, o
motivo mais poderoso, que, de certo modo, nos induz a esta devoção à Santíssima
Virgem, é constituir um meio admirável para perseverar na virtude e ser fiel.
Como se explica que a maior parte das conversões dos pecadores não seja
durável? Donde vem a facilidade de recair no pecado? Por que a maior parte dos
justos, ao invés de avançar de virtude em virtude e adquirir novas graças,
perdem muitas vezes o pouco de virtudes e graças que tinham? Esta infelicidade
provém, como já o demonstrei (v. nn. 87-89), de que o homem, sendo tão
corrompido, tão fraco e tão inconstante, fia-se em si próprio, e crê-se capaz
de guardar o tesouro de suas graças, virtudes e méritos.
Por esta devoção confiamos à
Santíssima Virgem, fiel por excelência, tudo o que possuímos; tomamo-la por depositária
universal de todos os bens da natureza e da graça. É em sua fidelidade que
confiamos, no seu poder que nos apoiamos, em sua misericórdia e caridade que
nos baseamos para que ela conserve e aumente nossas virtudes e méritos, a
despeito do demônio, do mundo e da carne, que envidam todos os esforços para
no-los arrebatar. Dizemos-lhe como um bom filho a sua mãe: “Depositum custodi”
(1Tm 6, 20), isto é, minha boa Mãe e Soberana, reconheço que até ao presente
muito mais graças tenho de Deus recebido por vossa intercessão, do que mereço,
e minha funesta experiência me ensina que bem frágil é o vaso em que guardo
esse tesouro, e que por demais fraco e miserável eu sou, para conservá-lo em
mim: “adolescentulus sum ergo et contemptus”
(Sl 118, 141); recebei em depósito tudo o que possuo, e conservai-mo por
vossa fidelidade e vosso poder. Se me guardardes, nada perderei; se me
sustentardes, não cairei; se me protegerdes, estarei a salvo de meus inimigos.
174. É o que diz S. Bernardo para
inspirar-nos esta prática: “Enquanto Maria vos sustenta, não caís; enquanto vos
protege, não temeis; enquanto vos conduz, não vos fatigais; e, sendo-vos
propícia, chegareis ao porto da salvação: Ipsa tenente, non corruis; ipsa
protegente, nom metuis; ipsa duce, nom fatigareis; ipsa propitia, pervenis”72
O mesmo parece dizer São Boaventura em termos ainda mais claros: A Santíssima
Virgem, diz ele, está não só detida na plenitude dos santos, mas também guarda
e detém os santos na plenitude para que esta plenitude não diminua; impede que
suas virtudes se dissipem, que seus méritos pereçam, que se percam sua graças,
que os prejudiquem os demônios; impede, por fim, que Nosso Senhor castigue os
pecadores: “Virgo nom solum in plenitudine sanctorum detinetur, sed etiam in
plenitudine sanctos detinet, ne plenitudo minuatur; detinet virtutes ne
fugiant; detinet merita ne pereant; detinet gratias ne effluant; detinet
daemones ne noceant; detinet Filium ne peccatores percutiat”.73
72) Homilia 2
super “Missus est” n. 17.
73) “Speculum B. V.”, lect. VII, § 6.
175. A Santíssima Virgem é a Virgem fiel
que, por sua fidelidade a Deus, repara as perdas que Eva infiel causou por sua
infidelidade, e que obtém de Deus a fidelidade e a perseverança para aqueles
que a ela se apegam. Por isso um santo a compara à âncora firme, porque os
retém e impede de soçobrar no m ar agitado deste mundo, onde tantas pessoas
naufragam por não se firmarem nesta âncora inabalável. “Prendemos, diz ele, as
almas à vossa esperança, como a uma âncora firme: Animas ad spem tuam sicut ad
firmam anchoram alligamus”.74 Foi a ela que os santos mais se
agarraram, e prenderam os outros, com o fito de perseverar na virtude. Felizes,
mil vezes felizes os cristãos que agora se apegam fiel e inteiramente a ela,
como a uma âncora firme. Os arrancos da tempestade deste mundo não os farão
submergir, nem perder os tesouros celestes. Bem-aventurados os que nela buscam
abrigo como na arca de Noé. As águas do dilúvio de pecados, que afogam tanta
gente, não lhes farão mal, pois: “Qui operantur in me non peccabunt” – os que
se guiam por mim não pecarão (Ecli 24, 30), diz ela com a Sabedoria.
Bem-aventurados os filhos infiéis da desgraçada Eva que se apegam à Mãe e
Virgem fiel, que permanecem sempre fiéis e que não faltam jamais à sua palavra:
“Fidelis permanet, se ipsam negare non potest”75, e que ama aqueles
que a amam: “Ego diligentes me diligo” (Prov 8, 17), não só um amor afetivo,
mas um amor efetivo e eficaz, impedindo-os, por uma grande abundância de
graças, de recuar na virtude, ou de cair no caminho, perdendo a graça de seu
Filho.
74) S. João
Damasceno, “Sermo 1 in
Dormitione B. M. V.”.
75) Aplicação
à Santíssima Virgem das palavras de São Paulo: 2Tm 2, 13.
176. Esta boa Mãe recebe sempre, por
pura caridade, tudo que lhe entregamos em depósito; e, desde que ela o recebeu
como depositária, é obrigada por justiça, em virtude do contrato de depósito, a
guardá-lo para nós; do mesmo modo que uma pessoa, a quem eu confiasse mil
escudos, seria obrigada a guardá-los para mim, de tal modo que se, por sua
negligência, meus mil escudos se perdessem seria ela, com justiça, a
responsável. Mas isto não acontece, pois Maria, a virgem fiel, jamais deixaria
perder-se, por sua negligência, o que lhe tivéssemos confiado. Antes passarão o
céu e a terra do que ela ser negligente e infiel para com aqueles que dela se
fiam.
* * *
177. Pobres filhos de Maria! extrema é
vossa fraqueza, grande, vossa inconstância, viciado, o vosso íntimo! Sois, eu o
confesso, da mesma massa corrompida que os filhos de Adão e Eva; mas não
percais por isso a coragem; consolai-vos, regozijai-vos: eis o segredo que vos
ensino, segredo desconhecido de quase todos os cristãos, até dos mais devotos.
Não deixeis vosso ouro e vossa prata
nos cofres, já forçados pelo espírito maligno que vos roubou, cofres por demais
exíguos e fracos e velhos para conter um tesouro tão grande e tão precioso. Não
depositeis a água pura e cristalina da fonte em vossos vasos machados e
infeccionados pelo pecado. Pode ser que o pecado aí já não esteja, mas o odor
permanece ainda e a água ficará contaminada. Não despejeis vosso vinho fino em
velhos tonéis que já contiveram vinho ordinário: ficará estragado e o
perdereis.
178. Embora me entendais, almas
predestinadas, falo mais abertamente. Não confieis o ouro de vossa caridade, a
prata de vossa pureza, as águas das graças celestes, nem os vinhos de vossos
méritos e virtudes a um saco roto, a um cofre velho e quebrado, a um vaso conta
minado e corrompido, como vós sois; porque sereis pilhados pelos ladrões, isto
é, os demônios, que buscam e espreitam, noite e dia, o momento próprio para o
ataque; estragareis, com o mau odor do amor-próprio, da confiança própria e da
vontade própria, tudo o que Deus vos dá de mais puro.
Depositai, derramai no seio e no
coração de Maria todos os vossos tesouros, todas as vossas graças e virtudes.
Maria é um vaso espiritual, um vaso honorífico, um vaso insigne de devoção:
“vas spirituale, vas honorabile, vas insigne devotionis”. Depois que aí se
encerrou o próprio Deus em pessoa, com todas as suas perfeições, este vaso
tornou-se todo espiritual, e a morada espiritual das almas mais espirituais.
Tornou-se honorável, e o trono de honra dos maiores príncipes da eternidade.
Tornou-se insigne na devoção e a morada dos mais ilustres em doçura, em graças
e virtudes. Tornou-se, enfim, rico como uma casa de ouro, forte como a torre de
Davi, puro como uma torre de marfim.
179. Oh! quão feliz é o homem que tudo
deu a Maria e que nela confia em tudo e por tudo. Ele é todo de Maria e Maria é
toda dele. Pode dizer afoitamente com David: “Haec facta est mihi: Maria foi
feita para mim” (Sl 118, 56); ou com o discípulo amado: “Accepi eam in mea” (Jo
19, 27) – Eu a tomei como toda a minha riqueza; ou com o próprio Jesus Cristo:
“Omnia mea tua sunt, et omnia tua mea sunt: Todas as minhas coisas são tuas, e
as tuas são minhas” (Jo 17, 10).
* * *
180. Se algum crítico, ao ler isto,
achar que falo exageradamente e por excesso de devoção, infeliz dele, pois não
me compreende, ou por ser um homem carnal que não aprecia as coisas do
espírito, ou por ser do mundo que não pode receber o Espírito Santo, ou por ser
orgulhoso e crítico, que condena e despreza o que não entende. As almas, porém,
que não nasceram do sangue nem da vontade da carne (Jo 1, 13) mas de Deus e de Maria,
me compreendem e apreciam; e é para elas, afinal, que eu escrevo.
181. Digo, entretanto, para uns e
outros, voltando ao assunto interrompido, que Maria Santíssima, porque é a mais
honesta e mais generosa de todas as puras criaturas, não se deixa vencer jamais
em amor e liberalidade. E por um ovo, diz um santo homem ela dá um boi, isto é,
por pouco que lhe demos ela dá mais do que recebeu de Deus; e, por conseguinte,
se uma alma se lhe entrega sem reserva, se nela depositamos toda a nossa
confiança, trabalhando de nosso lado em adquirir as virtudes e domar as
paixões.
182. Que os fiéis servidores de Maria
digam, pois, ousadamente com São João Damasceno: “Tendo confiança em vós, ó Mãe
de Deus, serei salvo; tendo vossa proteção, não temerei; com vosso auxílio,
combaterei os meus inimigos e os porei em fuga; pois vossa devoção é uma arma
de salvação que Deus dá a quem quer salvar: Spem tuam habens, o Deipara,
sevabor; defensionem tuam possidens, non timebo; persequar inimicos meos et in
fugam vertam, habens protectionem tuam et auxilium tuum; nam tibi devotum esse
est arma quaedam salutis quae Deus his dat quos vult salvos fieri” (Sermo de
Annunc.).
Capítulo
VI
Figura
bíblica desta perfeita devoção: Rebeca e Jacó
183. De todas as verdades que acabo de
descrever em relação à Santíssima Virgem, o Espírito Santo nos apresenta, na
Sagrada Escritura (Gn 27), uma figura admirável na história de Jacó, o qual
recebeu a bênção de Isaac, graças à solicitude e engenho de sua mãe Rebeca.
Ei-la
tal como conta o Espírito Santo. Em seguida ajuntarei a explicação.
Artigo
I
Rebeca
e Jacó
§
I. História de Jacó.
184. Esaú vendera a Jacó, seu direito de
primogenitura. Anos depois, Rebeca, mãe dos dois irmãos, assegurou a Jacó, –
que ela amava ternamente, – as vantagens daquele privilégio, empregando, para
isto, uma astúcia santa e cheia de mistério. Pois Isaac, sentindo-se
extremamente velho, quis, antes de morrer, abençoar seus filhos, e, chamando
Esaú, o preferido, ordenou-lhe que fosse caçar algo para ele comer. Depois o
abençoaria. Rebeca, prontamente, pôs Jacó ao corrente do que se passava, e
disse-lhe que fosse buscar dois cabritos no rebanho. Assim que ele lhos trouxe,
ela os preparou do modo que Isaac mais gostava. Em seguida, com as vestes de
Esaú, que ela guardava, vestiu Jacó e com as peles dos cabritos envolveu-lhe o
pescoço e as mãos, a fim de que Isaac, que não podia ver, acreditasse,
tateando-lhe as mãos, que fosse Esaú, embora ouvindo a voz de Jacó. Isaac, com
efeito, ficou surpreso ao ouvir a voz que ele reconhecia como de Jacó, mas,
fazendo-o aproximar-se e tateando-lhe os pelos que cobriam as mãos do filho,
murmurou: Em verdade a voz é de Jacó, mas as mãos são de Esaú. E, convencido,
comeu. Em seguida, ao beijar Jacó sentiu a fragrância das roupas de Esaú, o que
acabou por dissipar-lhe as dúvidas. Abençoou-o, então, e desejou-lhe o orvalho
do céu e a fecundidade da terra; estabeleceu-o senhor de todos os seus irmãos,
e terminou a bênção com estas palavras: “Aquele que te amaldiçoar seja
amaldiçoado, e aquele que te abençoar seja cumulado de bênçãos”.
Apenas Isaac acabara de falar,
entrou Esaú trazendo um guisado da caça que abatera, e o apresentou ao pai,
pedindo-lhe que comesse e em seguida o abençoasse. O santo patriarca ficou
extremamente surpreendido, ao ficar ciente do engano, mas, longe de retratar o
que fizera, confirmou-o, pois reconhecia no fato, evidentemente, o dedo de
Deus. Então Esaú, como observa a Sagrada Escritura, gritou com grande clamor, e
acusando em altas vozes o embuste do seu irmão, perguntou ao pai se ele não
tinha outra bênção. Neste ponto, notam os Santos Padres, ele era a imagem dos
que facilmente conciliam Deus com o mundo, querendo gozar ao mesmo tempo as
consolações do céu e as da terra. Isaac, comovido pelos gritos de Esaú, abençoou-o,
enfim, mas a bênção que lhe deu foi uma bênção terrena, sujeitando-o ao irmão.
Por isso Esaú concebeu um ódio tão profundo contra Jacó que, para matá-lo, só
esperava a morte do pai. E Jacó não teria podido evitar a morte, se sua
extremosa mãe Rebeca não o protegesse com sua habilidade e os bons conselhos
que lhe deu e que ele seguiu.
§ II. Interpretação da história de
Jacó.
185. Antes de explicar esta história tão
bela, é preciso notar que, conforme todos os Santos Padres e intérpretes da
Sagrada Escritura, Jacó é figura de Jesus Cristo e dos predestinados, enquanto
Esaú é figura dos réprobos; basta, apenas, examinar a atitude de um e de outro
para verificá-lo.
1º Esaú, figura dos réprobos
1º Esaú, o mais velho, era forte e
robusto de corpo, destro e habilidoso no manejo do arco e na arte da caça.
2º Quase não parava em casa, e,
confiante em sua força e destreza, só trabalhava fora, ao ar livre.
3º Pouco se incomodava de agradar a
sua mãe Rebeca, e nada fazia por ela.
4º Era guloso e gostava tanto de satisfazer
o paladar, que chegou a vender seu direito de progenitura por um prato de
lentilhas.
5º Estava, como Caim, cheio de
inveja de seu irmão Jacó, e o perseguia sem tréguas.
186. Eis a conduta dos réprobos, todos
os dias:
1º Fiam-se em sua força e indústria
nos negócios temporais; são muito fortes, muito hábeis e esclarecidos para as
coisas da terra, mas extremamente fracos e ignorantes nas coisas do céu: “In
terrenis fortes, in caelestibus debiles”. Por isso:
187. 2º Não se demoram ou se demoram
muito pouco em sua própria casa, quer dizer no seu interior, que é a casa
interior e essencial dada por Deus a cada homem para aí morar, conforme seu
exemplo, pois Deus mora sempre em sua casa. Os réprobos não amam o retiro, nem
a espiritualidade, nem a devoção interior e chamam de espírito acanhados,
carolas e selvagens aqueles que são espirituais e retirados do mundo, e que
trabalham mais no interior do que fora.
188. 3º Os réprobos não se preocupam de
modo algum com a devoção à Santíssima Virgem, a Mãe dos predestinados. É
verdade que não a odeiam formalmente, fazem-lhe às vezes um elogio, dizem que a
amam, praticam até alguma devoção em sua honra, mas, de resto, não suportariam
vê-la amada ternamente, porque não têm para ela as ternuras de Jacó. Acham motivo
de censura nas práticas de devoção, a que se entregam os bons filhos e servos
da Santíssima Virgem para obter sua afeição, na certeza de que esta devoção
lhes é necessária à salvação, e acham mais que, desde que não odeiam
formalmente a Santíssima Virgem, e que não desprezam abertamente sua devoção,
isso é bastante e já ganharam as boas graças da Santíssima Virgem e são seus
servos, ao recitarem ou resmungarem algumas orações em sua honra, sem a menor
ternura por ela nem emenda para eles.
189. 4º Esses réprobos vendem seu
direito de primogenitura, isto é, os gozos do paraíso, por um prato de
lentilhas, os prazeres da terra. Riem, bebem, comem, divertem-se, jogam,
dançam, etc..., sem a mínima preocupação, como Esaú, de se tornarem dignos da
bênção do Pai celeste. Em três palavras, eles só pensam na terra, só amam a
terra, só falam e agem pela terra e pelos prazeres terrenos, vendendo, por um
instante de prazer, por uma vã fumaça de honra, e por um pedaço de matéria
amarela ou branca, a graça batismal, sua veste de inocência, sua celestial
herança.
190. 5º Os réprobos, finalmente, em
segredo ou às claras, odeiam e perseguem diariamente os predestinados.
Prejudicam-nos quanto podem, desprezam-nos, roubam-nos, enganam-nos,
empobrecem-nos, expulsam-nos, reduzem-nos a pó; enquanto eles mesmos fazem
fortuna, gozam seus prazeres, vivem em situação esplêndida, enriquecem, se
engrandecem e levam vida folgada.
2º Jacó, figura dos predestinados
191. 1º Jacó, o caçula, era de
compleição franzina, meigo e sossegado. Permanecia em casa o mais possível,
para ganhar as graças de sua Mãe Rebeca, que o amava ternamente. Se saía de
casa, não o fazia por vontade própria, nem por confiança em sua própria
habilidade, mas para obedecer a sua mãe.
192. 2º Amava e honrava sua mãe: por
isso ficava em casa junto dela. Seu maior contentamento era vê-la; evitava tudo
que pudesse desagradar-lhe e fazia tudo que imaginava agradar-lhe. Tudo isso
concorria para aumentar em Rebeca o amor que dedicava ao filho.
193. 3º Em todas as coisas ele era
submisso a sua mãe, obedecia-lhe inteiramente em tudo, com obediência pronta,
sem tardanças, e amorosa, sem queixas; ao menor sinal da vontade materna, o
pequeno Jacó corria e trabalhava. Acreditava piamente, sem discutir, em tudo
que a mãe lhe dizia: por exemplo, quando Rebeca o mandou buscar os dois
cabritos, e ele os trouxe a fim de ela os preparar para Isaac, Jacó não
replicou nem observou que bastava um para satisfazer o apetite de um só homem,
mas, sem discernir, fez exatamente como ela mandou.
194. 4º Ele depositava uma confiança sem
limites em sua querida mãe; como não contava absolutamente com sua própria
experiência, apoiava-se unicamente na proteção e nos desvelos maternos. Chamava
por ela em todas as suas necessidades e consultava-a em todas as suas dúvidas:
por exemplo, quando lhe perguntou se, em vez da bênção, não receberia a
maldição de seu pai, creu e confiou na resposta que ela lhe deu de que tomaria
sobre si a maldição.
195. 5º Ele imitava, enfim, na medida de
sua capacidade, as virtudes que via em sua mãe; e parece que uma das razões por
que ele permanecia em casa, tão sedentário, é que procurava imitar sua virtuosa
mãe, e afastar-se de más companhias, que corrompem os costumes. Por tal motivo
tornou-se digno de receber a dupla bênção de seu querido pai.
196. Eis também a conduta diária dos
predestinados:
1º Vivem em casa, sedentáriamente,
com sua mãe, quer dizer, amam o recolhimento, são interiores, e se aplicam à
oração, mas conforme o exemplo e a companhia de sua Mãe, a Santíssima Virgem,
cuja glória está toda no interior e que, durante a vida inteira, tanto amou o
retiro e a oração. É verdade que aparecem às vezes fora, no mundo; fazem-no,
porém, em obediência à vontade de Deus e de sua querida Mãe, para cumprir os
deveres de seu estado. Por grandes coisas que façam no exterior e que apareçam,
preferem muito mais as que se fazem no interior, em companhia da Santíssima
Virgem, porque aí executam a grande obra de sua perfeição, ao lado da qual
todas as outras são como brinquedos de criança. Por isso, enquanto que seus
irmãos e irmãs trabalham muitas vezes para o exterior com mais entusiasmo,
habilidade e sucesso, recebendo os louros e aprovações do mundo, eles sabem,
pela luz do Espírito Santo, que há muito mais glória, bem e prazer em permanecer
oculto no reconhecimento com Jesus Cristo, seu modelo, numa submissão inteira e
perfeita a sua Mãe, do que em realizar, por si próprio, maravilhas naturais e
da graça no mundo, como tantos Esaús e réprobos. “Gloria et divitiae in domo
eius” Sl 111, 3) – a glória para Deus e as riquezas para os homens encontram-se
na casa de Maria.
Senhor Jesus, quão amáveis são
vossos tabernáculos! O pardal encontrou uma casa para se alojar, e a rola, um
ninho, onde abrigar seus filhotes. Oh! como é feliz o homem que mora na casa de
Maria, na qual fizestes, primeiro, a vossa morada! É nesta casa de
predestinados que ele de vós somente pede socorro, e em seu coração dispôs
subidas e degraus de todas as virtudes, para elevar-se à perfeição neste vale
de lágrimas. “Quam dilecta tabernacula...” (Sl 83).
197. 2º Eles amam ternamente e honram em
verdade a Santíssima Virgem, como sua boa Mãe e Senhora. Amam-na não só com a
boca, mas verdadeiramente; honram-na não só no exterior, mas no fundo do
coração; evitam, como Jacó, tudo que pode desagradar-lhe, e praticam com fervor
tudo que crêem poder adquirir-lhes sua benevolência. Trazem-lhe e lhe entregam
não só dois cabritos como Jacó a Rebeca, mas seu corpo e sua alma, com tudo que
do corpo e da alma depende, de que são figura os dois cabritos de Jacó, 1º para
que ele os receba como um dom que lhe pertence; 2º para que os sacrifique e
faça morrer ao pecado e a si próprios, escorchado-os e despojando-os da própria
pele de seu amor-próprio, e para agradar, por este meio, a Jesus, seu filho,
que não quer para amigos e discípulos, senão aqueles que estiverem mortos a si
mesmos; 3º para que os prepare ao gosto do Pai celeste, e para servir à sua
maior glória, que ela conhece melhor que nenhuma outra criatura; 4º para que,
por seus cuidados e intercessões, este corpo e esta alma, purificados de toda
mancha, bem mortos, bem despojados e bem preparados, sejam um manjar delicado,
digno do paladar e da bênção do Pai celeste. Não é o que farão as pessoas
predestinadas, que apreciarão e praticarão a consagração perfeita a Jesus
Cristo pelas mãos de Maria, como lhes ensinamos, para testemunhar a Jesus e
Maria um amor efetivo e corajoso?
Os réprobos dizem que amam a Jesus,
que honram Maria, mas não com sua substância76, com os seus haveres,
ao ponto de lhes sacrificar seu corpo com os sentidos, sua alma com todas as
paixões, como fazem os predestinados.
76) Cf. Prov
3, 9: “Honora Dominum de tua substantia” – Honra o Senhor com os teus haveres.
198. 3º Eles são submissos e obedientes
à Santíssima Virgem, como a sua boa Mãe a exemplo de Jesus Cristo, que, dos
trinta e três anos que viveu sobre a terra, dedicou trinta a glorificar a Deus
seu Pai, por uma perfeita e inteira submissão a sua Mãe Santíssima. A ela
obedecem, seguindo com exatidão os seus conselhos, como o pequeno Jacó seguia
os de sua mãe, que lhe diz: “Acquiesce consiliis meis” (Gn 27, 8) – Meu filho,
segue meus conselhos; aos quais a Santíssima Virgem diz: “Quodcumque dixerit
vobis facite” – Fazei tudo o que ele vos disser (Jo 2, 5). Por ter obedecido a
sua mãe, Jacó recebeu a bênção, como por milagre, embora por direito natural
não devesse recebê-la; porque os servos nas bodas de Cana seguiram o conselho
da Santíssima Virgem, foram honrados com o primeiro milagre de Jesus Cristo,
que nessa ocasião, a pedido de sua Mãe, converteu a água em vinho. Assim, todos
aqueles que até ao fim dos séculos receberem a bênção do Pai celeste, e forem
honrados com as maravilhas de Deus, só receberão estas graças em conseqüência
de sua perfeita obediência a Maria; os Esaús, ao contrário, perderão sua
bênção, por falta de submissão à Santíssima Virgem.
199. 4º Os predestinados têm uma grande
confiança na bondade e no poder da Santíssima Virgem; reclamam sem cessar o seu
socorro; olham-na como a estrela polar guiando-os a seguro porto;
comunicam-lhe, com o coração aberto, suas penas e suas necessidades; acolhem-se
à sua misericórdia e doçura para, por sua intercessão, alcançar o perdão de
seus pecados, ou para gozar de seus maternais carinhos em suas aflições e contrariedades.
Atiram-se até, escondem-se e se perdem dum modo admirável em seu regaço amoroso
e virginal, para aí ficarem abrasados de amor, para aí se purificarem das
menores manchas, e para aí encontrarem plenamente a Jesus, que aí reside como
no mais glorioso dos tronos. Oh! que felicidade! “Não creais, diz o abade
Guerrrico, que seja maior felicidade habitar o seio de Abraão que o seio de
Maria, pois neste colocou o Senhor o seu trono: Ne credideris maioris esse
felicitatis habitare in sinu Abrahae quam in sinu Mariae, cum in eo Dominus
possuerit thronum suum”.77
77) Sermo 1 in Assumptione, n. 4.
Os réprobos, ao contrário, põem toda
a confiança em si próprios, só comem, como o filho pródigo, o que comem os
porcos; como vermes, só se alimentam de terra; e porque amam somente as coisas
visíveis e passageiras, como os mundanos, não apareciam as doçuras e suavidades
do seio de Maria. Não sentem aquele apoio e aquela confiança que os
predestinados sentem pela Santíssima Virgem, sua boa Mãe. Amam miseravelmente
sua fome exterior, como diz São Gregório78, porque não querem provar
a suavidade que está preparada no próprio íntimo deles e no íntimo de Jesus e
de Maria.
78) “Amamus
foris miseri famem nostram” (Homil. 36 in Evangel.).
200. 5º Finalmente, os predestinados
mantêm-se nos caminhos da Santíssima Virgem, isto é, imitam-na, e nisto eles
são verdadeiramente felizes e devotos, trazendo assim o sinal infalível de sua
predestinação. Esta boa Mãe lhes diz: “Beati qui custodiunt vias meas” (Prov 8,
32) – Bem-aventurados os que praticam minhas virtudes, e caminham sobre as
pegadas de minha vida, com o socorro da divina graça. Eles são felizes neste
mundo, durante sua vida, devido à abundância de graças e de doçuras que eu lhes
comunico de minha plenitude e com muito mais abundância que aos outros que não
me imitam tão esforçadamente; eles são felizes em sua morte, que é doce e
tranqüila, e na qual eu os assisto, para os conduzir às alegrias da eternidade;
serão finalmente, felizes na eternidade, porque jamais se perdeu algum dos meus
servos, que durante a vida tenha imitado fielmente as minhas virtudes.
Os réprobos, ao contrário, são
infelizes durante a vida, em sua morte e na eternidade, porque não imitam a
Santíssima Virgem em suas virtudes, contentando-se com pertencer a alguma de
suas confrarias, com recitar uma ou outra oração em sua honra ou fazer qualquer
devoção exterior.
Ó Virgem Santíssima, minha boa Mãe,
quão felizes são aqueles – eu o repito com transportes de coração – quão
felizes são aqueles que, sem se deixar seduzir por uma falsa devoção, guardam
fielmente vossos caminhos, vossos conselhos e vossas ordens! Quão infelizes,
porém, e malditos, aqueles que, abusando de vossa devoção, não guardam os
mandamentos de vosso Filho! “Maledicti omnes qui declinant a mandatis tuis” –
Malditos os que se afastam de teus mandamentos (Sl 118, 21).
Artigo
II
A
Santíssima Virgem e os seus escravos por amor
201. Eis, em seguida, os caridosos
deveres que a Santíssima Virgem cumpre como a melhor das mães, para com seus fiéis
servos, que a ela se deram como indiquei, e conforme a figura de Jacó.
§
I. Ela os ama.
“Ego diligentes me diligo” – Eu amo
aqueles que me amam” (Prov 8, 17). Ela os ama 1º porque é sua verdadeira Mãe;
ora, uma mãe ama sempre seu filho, o fruto de suas entranhas; 2º ela os ama por
reconhecimento, pois que eles efetivamente a amam como sua boa Mãe; 3º ela os
ama, porque, sendo predestinados, Deus os ama: “Iacob dilexi, Esau autem odio
habui – Amei Jacó, porém aborreci Esaú” (Rm 9, 13); 4º ela os ama porque eles se lhe consagraram, e porque são
sua partilha e herança: “In Israel hereditare” (Ecli 24, 13).
202. Ela os ama ternamente, e com mais
ternura do que todas as mães juntas. Acumulai, se puderdes, num só coração
materno e por um filho único, todo o amor natural que todas as mães deste mundo
têm por seus filhos: sem dúvida essa mãe amaria muito esse filho. É verdade,
entretanto, que Maria ama ainda mais ternamente seus filhos do que aquela mãe
amaria o seu. Ela não os ama somente com afeição, mas também com eficácia. Seu
amor por eles é ativo e efetivo, como aquele de Rebeca por Jacob, e muito mais.
Eis o que esta boa Mãe, da qual Rebeca era apenas a figura, faz com o fito de
alcançar, para seus filhos, a bênção do Pai celestial.
203. 1º Ela espreita, como Rebeca, as
ocasiões favoráveis de lhes proporcionar algum bem, de os engrandecer, de os
enriquecer. Ela vê claramente em Deus todos os bens e males, as boas e más
fortunas, as bênçãos e as maldições divinas, e por isso, já de longe, dispõe as
coisas para isentar seus servos de todo mal e cumulá-los de todos os bens; de
sorte que, se há um bom proveito para alcançar em Deus, pela fidelidade duma
criatura em algum alto emprego, é certo que Maria o conseguirá para algum de
seus filhos, e lhe dará a graça de chegar ao fim com fidelidade: “Ipsa procurat
negotia nostra”, diz um santo.
204. 2º Ela lhes dá bons conselhos, como
Rebeca a Jacó: “Fili mi, acquiesce consiliis meis” – Meu filho, segue meus
conselhos” (Gn 27, 8). E, entre outros conselhos, ela lhes sugere levar-lhe
dois cabritos, isto é, seu corpo e sua alma, de lhos consagrar para que ela
prepare um manjar agradável a Deus, e de fazer tudo que Jesus Cristo, seu
Filho, nos ensinou pela palavra e pelo exemplo. Se não é diretamente que lhes
dá seus conselhos, fá-lo pelo ministério dos anjos, para os quais constitui o
maior prazer e a maior honra obedecer à menor de suas ordens para descer à
terra e auxiliar seus fiéis servos.
205. 3º Quando lhe levamos e consagramos
nosso corpo e nossa alma com tudo que deles depende, sem nada excetuar, que faz
esta boa Mãe? O mesmo que fez, outrora, Rebeca aos dois cabritos que Jacó lhe
trouxe: 1º mata-os, tirando-lhes a vida do velho Adão; 2º escorcha-os e despoja
da pele natural, das inclinações naturais, do amor próprio, da vontade própria
e de todo apego à criatura; 3º purifica-os de toda mancha, sujeira e pecado; 4º
prepara-os ao gosto de Deus e para sua maior glória. Ninguém como ela conhece
perfeitamente este gosto divino e esta maior glória do Altíssimo, e, portanto,
só ela pode, sem enganar-se aprontar e preparar nosso corpo e nossa alma de
acordo com esse gosto infinitamente elevado e essa glória infinitamente oculta.
206. 4º Esta boa Mãe, depois de receber
a oferenda perfeita que lhe fizemos de nós mesmos e de nossos próprios méritos
e satisfações, pela devoção de que falei, depois de nos ter despojado de nossos
antigos hábitos, limpa-nos e nos torna dignos de aparecer diante de nosso Pai
celeste. 1º Ela nos cobre com as vestes limpas, novas, preciosas e perfumadas
de Esaú, o primogênito, isto é, de Jesus Cristo seu Filho, daquelas vestes que
ela conserva em sua casa, ou, por outra, em seu poder, pois que é a tesoureira,
a dispensadora universal dos méritos e virtudes de seu Filho Jesus Cristo, dons
que ela dispensa e comunica a quem quer, quando quer, como quer, e em quanto
quer, como já vimos acima (cf. nn. 25 e 141). 2º Ela rodeia o pescoço e as mãos
de seus servos com o pelo dos carneiros mortos e escorchados, quer dizer, ela
os reveste dos méritos e do valor de suas próprias ações. Ela mata e mortifica,
em verdade, tudo que eles têm de impuro e imperfeito em suas pessoas; mas não
perde nem dissipa o bem que neles a graça já realizou; pelo contrário, guarda-o
e aumenta-o para lhes ornar e fortalecer o pescoço e as mãos, isto é, para que
eles tenham força para carregar o jugo do Senhor, que se carrega ao pescoço, e
para fazerem grandes coisas que redundem na glória de Deus e na salvação de
seus irmãos. 3º Ela põe um novo perfume e uma nova graça nessas vestes e
ornamentos, pelo contato de suas próprias vestes: seus méritos e suas virtudes,
que ela, ao morrer, lhes legou em testamento, como diz uma santa religiosa do
século 17, morta em odor de santidade, e que o soube por revelação; de modo que
todos os seus servidores, seus fiéis servos e escravos ficam duplamente
vestidos: com as vestes dela e com as de seu Filho: “Omnes domestici eius
vestiti sunt duplicibus” (Prov 31, 21). Por isso eles não têm que recear o frio
de Jesus Cristo, branco como a neve, que os réprobos, completamente nus e
despojados dos méritos de Jesus Cristo e da Santíssima Virgem, não poderão
suportar.
207. 5º Ela consegue-lhes, enfim, a
bênção do Pai celeste, se bem que eles sejam os segundos, os filhos adotivos,
e, portanto, não devessem recebê-la. Com essas roupas novas, preciosas e
odorosas, e com seu corpo e alma bem preparados e dispostos, eles se aproximam
confiantes do leito de repouso do Pai celeste. Este os ouve e os reconhece pela
voz, a voz do pecador; toca-lhes as mãos cobertas de pêlos; aspira o perfume
que de suas vestes se desprende; come alegremente o que Maria lhe preparou; e
neles reconhecendo os méritos e o bom odor de seu Filho e de sua Mãe
Santíssima: 1º dá-lhes sua dupla bênção, bênção do orvalho do céu: “De rore
caeli” (Gn 27, 28), isto é, da graça divina que é a semente da glória:
“Benedixit nos in omni benedictione spirituali in Christo Iesu” (Ef 1, 3: Deus
nos abençoou com toda a bênção espiritual em Cristo Jesus); bênção
da fertilidade da terra: “De pinguetudine terrae” (Gn 27, 28), em outras
palavras, que este bom Pai lhes dá seu pão cotidiano e uma abundância
suficiente de bens deste mundo; 2º fá-los senhores de seus outros irmãos, os
reprovados, embora esta primazia nem sempre transpareça neste mundo que passa
num instante, e no qual dominam muitas vezes os reprovados: “Peccatores
effabuntur et gloriabuntur... (Sl 93, 3, 4), Vidi impium superexaltatum e
elevatum” (Sl 36, 35); essa primazia é, no entanto, verdadeira e será
manifestada por toda a eternidade, no outro mundo, onde os justos, como diz o
Espírito Santo, dominarão e comandarão as nações: “Dominabuntur populis” (Sb 3,
8); 3º sua majestade, não contente de
abençoá-los em suas pessoas e em seus bens, abençoa ainda todos os que eles
abençoarem, e amaldiçoa todos os que os amaldiçoarem e perseguirem.
§
II. Ela os mantém.
208. O segundo dever de caridade que a
Santíssima Virgem exerce para com seus fiéis servos é provê-los de tudo para o
corpo e para a alma. Ela lhes fornece as vestes duplas, como acabamos de ver;
dá-lhes de comer os manjares mais finos da mesa de Deus; dá-lhes o pão da vida
que ela formou: “A generationibus meis implemini” (Ecli 24, 26): “Meus queridos
filhos, lhes diz ela, sob o nome da Sabedoria, enchei-vos de meus frutos, isto
é, de Jesus, o fruto de vida que eu pus no mundo para vós. – “Venite, comedite
panem meum et bibite vinum quod miscui vobis” (Prov 9, 5); “comedite et bibite,
et inebriamini, carissimi” (Cant 5, 1): Vinde, lhes repete, comei do meu
pão, que é Jesus, e bebei do vinho de seu amor, que para vós preparei
com o leite de meus seios. E como é a tesoureira e a dispensadora dos dons e
das graças do Altíssimo, ela toma uma boa porção, a melhor, para alimentar e
sustentar seus filhos e servos. Eles são fortalecidos com o pão vivo, embriagados
com o vinho que gera virgens (cf. Zc 9, 17); são levados ao seio: “ad ubera
portamini” (Is 66, 12); e têm tanta facilidade em carregar o jugo de Jesus
Cristo, que quase não lhe sentem o peso, graças ao óleo da devoção com que ela
o faz apodrecer: “Iugum eorum computrescet a facie olei” (Is 10, 27).
§
III. Ela os conduz.
209. O terceiro bem que a Santíssima
Virgem faz a seus fiéis servos é conduzi-los e dirigi-los conforme a vontade de
seu Filho. Rebeca conduzia o pequeno Jacó e de vez em quando lhe dava bons
conselhos, e deu-lhos tanto para ele atrair a bênção de Isaac, como para
subtrair-se à fúria de Esaú. Maria, a estrela do mar, guia todos os seus fiéis
servos a bom porto; mostra-lhes os caminhos da vida eterna; desvia-os dos
passos perigosos; leva-os pela mão nas sendas da justiça; sustém-nos quando
estão prestes a cair; levanta-os quando caíram; repreende-os, como mãe
caridosa, quando comentem alguma falta; e, até, às vezes, os castiga
amorosamente. Um filho que obedece a Maria, pode acaso errar o caminho que leva
à eternidade? “Ipsam sequens, non devias: Seguindo-a, não vos extraviareis”,
diz São Bernardo. Não temais que um verdadeiro filho de Maria se deixe enganar
pelo demônio e venha a cair em alguma heresia formal. Onde se manifesta a mão
condutora de Maria, aí não se encontram nem o espírito maligno com suas
ilusões, nem os hereges com seus sofismas: “Ipsa tenente, non corruis”.79
79) Palavras
de São Bernardo, citadas e comentadas mais acima, n. 174.
§
IV. Ela os defende e protege.
210. O quarto favor que a Santíssima
Virgem presta a seus filhos e fiéis servos é defendê-los e protegê-los de seus
inimigos. Rebeca, por seus cuidados e por sua habilidade livrou Jacó dos
perigos que o ameaçavam, e particularmente da morte que lhe jurara Esaú, e que,
no auge da raiva e inveja que o dominavam, ele teria levado a termo, como
outrora Caim a seu irmão Abel. Maria, a Mãe misericordiosa dos predestinados,
abriga-os sob as asas de sua proteção, como uma galinha aos pintinhos. Ela lhes
fala, abaixa-se até a eles, é condescendente para com suas fraquezas,
protege-os contra as garras do gavião e do abutre; acompanha-os como um
exército em linha de batalha: “ut castrorum acies ordinata” (Ct 6, 3). Pode um
homem, garantido por um exército de cem mil soldados, ter receio de seus
inimigos? Menos ainda há de recear um servo fiel de Maria, rodeado que está da
proteção e força de sua Mãe Santíssima. Esta Mãe e Princesa poderosa enviaria
antes batalhões de milhares de anjos em socorro de um só de seus servos, para
que se não dissesse que um servo fiel de Maria, que a ela se confiou, sucumbiu
à malícia, ao número e à força do inimigo.
§ V. Ela intercede por eles.
211. O quinto, enfim, e o maior bem, que
a amabilíssima Maria proporciona a seus fiéis devotos, é interceder por eles
junto de seu Filho, apaziguá-lo por suas preces, uni-los a ele por um forte
elo, e para ele os conservar.
Rebeca mandou a Jacó que se
aproximasse do leito de Isaac; e o ancião tateou as mãos e os braços do filho,
abraçou-o e beijou-o com alegria, mostrando-se contente e satisfeito com o
acepipe que Jacó lhe apresentava. E ao aspirar com extrema satisfação o perfume
que se evolava das vestes de Esaú, exclamou: “Ecce odor filii mei sicut odor
agri pleni, cui benedixit Dominus: Eis que o cheiro de meu filho é como o
cheiro de um campo florido que o Senhor abençoou” (Gn 27, 27). Este campo
florido, cujo odor encanta o coração do pai, outro não é que o odor das
virtudes e dos méritos de Maria, que é um campo cheio de graça, no qual Deus
Pai semeou, qual grão de trigo dos eleitos, o seu Filho único.
Oh!
benvindo é, junto de Jesus Cristo, Pai do futuro século, um filho que
rescende o bom odor de Maria. E quão pronta e perfeitamente lhe fica unido, já
o demonstramos longamente.
212. Além disso, depois de cumular de
favores seus filhos e servos fiéis, Maria Santíssima lhes obtém a bênção do Pai
celestial e a união com Jesus Cristo, e, mais, conserva-os em Jesus Cristo e Jesus
Cristo neles. Ela os guarda e por eles vela constantemente, para que não percam
a graça de Deus e não caiam nas armadilhas do inimigo: “In plenitudine sanctos
detinet: Detém os santos em sua plenitude”80, e ajuda-os a
perseverar até ao fim, como já vimos.
80) Palavras
de São Boaventura já citadas e comentadas (n. 174).
Aí está a explicação desta grande e
antiga figura da predestinação e da condenação, figura tão desconhecida e tão
cheia de mistérios.
Capítulo
VII
Efeitos
maravilhosos que esta devoção produz numa alma que lhe é fiel
213. Meu querido irmão, convencei-vos de
que, se vos tornardes fiel às práticas interiores e exteriores desta devoção,
que vos indico em seguida:
Artigo
I
Conhecimento
e desprezo de si mesmo
1º Pela luz que o Espírito Santo vos
dará por intermédio de Maria, sua querida esposa, conhecereis vosso fundo mau,
vossa corrupção e vossa incapacidade para todo bem, e, em conseqüência deste
conhecimento, vos desprezareis, e será com horror que pensareis em vós mesmo.
Considerar-vos-eis como uma lesma asquerosa que tudo estraga com sua baba, como
um sapo repugnante que tudo envenena com sua peçonha, ou como a serpente
traiçoeira que só busca enganar. A humilde Maria vos dará, enfim, parte de sua
profunda humildade, com que vos desprezareis a vós mesmo, sem desprezar pessoa
alguma, e gostareis até de ser desprezado.
Artigo
II
Participação
da fé de Maria
214. 2º A Santíssima Virgem vos dará uma
parte na fé, a maior que já houve na terra, maior que a de todos os patriarcas,
profetas, apóstolos e todos os santos. Agora, reinando nos céus, ela já não tem
esta fé, pois vê claramente todas as coisas em Deus, pela luz da glória. Com
assentimento do Altíssimo, ela, entretanto, não a perdeu ao entrar na glória;
guardou-a para seus fiéis servos e servas na Igreja militante. Quanto mais,
portanto, ganhardes a benevolência desta Princesa e Virgem fiel, tanto mais
profunda fé tereis em toda a vossa conduta: uma fé pura, que vos levará à
despreocupação por tudo que é sensível e extraordinário; uma fé viva e animada
pela caridade que fará com que vossas ações sejam motivadas por puro amor; uma
fé firme e inquebrantável como um rochedo, que vos manterá firme e contente no
meio das tempestades e tormentas; uma fé ativa e penetrante que, semelhante a
uma chave misteriosa, vos dará entrada em todos os mistérios de Jesus Cristo, nos
novíssimos do homem e no coração do próprio Deus; fé corajosa que vos fará
empreender sem hesitações, e realizar grandes coisas para Deus e a salvação das
almas; fé, finalmente, que será vosso fanal luminoso, vossa via divina, vosso
tesouro escondido da divina Sabedoria e vossa arma invencível, da qual vos
servireis para aclarar os que jazem nas trevas e nas sombras da morte, para
abrasar os tíbios e os que necessitam do ouro candente da caridade, para dar
vida aos que estão mortos pelo pecado, para tocar e comover, por vossas
palavras doces e poderosas, os corações de mármore e derrubar os cedros do
Líbano, e para, enfim, resistir ao demônio e a todos os inimigos da salvação.
Artigo
III
Graça
do puro amor
215. 3º Esta Mãe do amor formoso (Ecli
24, 24) aliviará vosso coração de todo escrúpulo e de todo temor servil; ela o
abrirá e alargará para correr pelo caminho dos mandamentos de seu Filho (cf. Sl
118, 32), com a santa liberdade dos filhos de Deus, e para nele introduzir o
puro amor, de que ela possui o tesouro; de tal modo que não mais vos
conduzireis, como o fizestes até aqui, pelo receio ao Deus de caridade, mas
pelo puro amor, unicamente. Passareis a olhá-lo como vosso bondoso Pai,
tratando de agradar-lhe incessantemente; com ele conversareis confidentemente,
à semelhança de um filho com seu pai. Se, por acaso, o ofenderdes,
humilhar-vos-eis em continente diante dele, pedir-lhe-eis perdão humildemente,
lhe estendereis simplesmente a mão, e vos levantareis amorosamente, sem
perturbação nem inquietação, se sem desfalecimentos continuareis a caminhar
para ele.
Artigo
IV
Grande
confiança em Deus e em Maria
216. 4º A Santíssima Virgem vos encherá
de grande confiança em Deus e nela: 1º porque não vos aproximareis mais de
Jesus Cristo por vós mesmo, mas sempre por intermédio desta bondosa Mãe; 2º
porque, tendo lhe dado todos os vossos méritos, graças e satisfações, para que
deles disponha à sua vontade, ela vos comunicará suas virtudes e vos revestirá
de seus méritos, de sorte que podereis dizer confiantemente a Deus: “Eis Maria,
vossa serva: faça-se em mim conforme a vossa palavra: Ecce ancilla Domini; Fiat
mihi secundum verbum tuum” (Lc 1, 38); 3º porque, desde que vos destes a ela
inteiramente, de corpo e alma, ela, que é liberal com os liberais, e mais
liberal que os próprios liberais, dar-se-á a vós em troca, e isto de um modo
maravilhoso, mas verdadeiro; assim podereis dizer-lhe ousadamente: “Tuus sum
ego, salvum me fac! – Eu vos pertenço, Santíssima Virgem, salvai-me!” (Sl 118,
94) ou, como já disse (cf. nº 179), com o discípulo amado: “Accepi te in mea” –
eu vos tomei, Mãe Santíssima, como todo o meu bem. Podereis ainda dizer com São
Boaventura: “Ecce Domina salvatrix mea, fiducialiter agam, et non timebo, quia
fortitudo mea, et laus mea in Domino es tu...”81 e em outro lugar:
“Tuus totus ego sum, et omnia mea tua sunt; o Virgo gloriosa, super omnia
benedicta, ponam te ut signaculum super cor meum, quia fortis est ut mors
dilectio tua82 – Minha querida Senhora e Salvadora, agirei com confiança e não temerei
porque sois minha força e meu louvor no Senhor... Sou todo vosso, e tudo que
tenho vos pertence; ó gloriosa Virgem, bendita sobre todas as coisas criadas,
que eu vos ponha como uma marca sobre meu coração, pois vossa dileção é forte
como a morte!” Podereis dizer a Deus com os sentimentos do profeta: “Domine, non est exaltatum cor meum,
neque elati sunt oculi mei; neque ambulavi in magnis, neque in mirabilibus
super me; si non humiliter sentiebam, sed exaltavi animam meam; sicut
ablactatus est super matre sua, ita retributio in anima mea (Sl 130, 1-2) –
Senhor, nem meu coração nem meus olhos têm
motivo para se elevar e ensoberbecer, nem de buscar coisas grandes e
maravilhosas; e mesmo assim, ainda não sou humilde; mas elevei e encorajei
minha alma pela confiança; sou como uma criança, afastada dos prazeres da terra
e apoiada ao seio de minha mãe; e é neste seio que sou cumulado de bens. 4º O
que aumenta ainda vossa confiança nela é que, tendo lhe dado em depósito tudo o
que tendes de bom para dar ou guardar, confiareis menos em vós e muito mais
nela, que é vosso tesouro. Oh! que confiança e consolação para uma alma poder
chamar também seu o tesouro de Deus, onde Deus depositou o que tem de mais
precioso! “Ipsa est thesaurus Domini – Ela é, diz um santo, o tesouro do
Senhor”.83
81) Psalter. maius B. V., Cant. instar Is 12, 2.
82) Psalter.
Maius B. V., Cant. instar Ex 15.
83) Idiota
(In contemplatione B. M. V.).
Artigo
V
Comunicação
da alma e do espírito de Maria
217. 5º A alma da Santíssima Virgem se
comunicará a vós para glorificar o Senhor; seu espírito tomará o lugar do vosso
para regozijar-se em Deus, contanto que pratiqueis fielmente esta devoção. “Sit
in singulis anima Mariae, ut magnificet
Dominum; sit in singulis spiritus Mariae, ut exultet in Deo84
– Que a alma de Maria esteja em cada um para aí glorificar o Senhor; que o
espírito de Maria esteja em cada um para aí regozijar-se em Deus”. Ah! quando
virá este tempo feliz em que
Maria será estabelecida Senhora e Soberana nos corações, para
submetê-los plenamente ao império de seu grande e único Jesus? Quando chegará o
dia em que as almas respirarão Maria, como o corpo respira o ar? Então, coisas
maravilhosas acontecerão neste mundo, onde o Espírito Santo, encontrando sua
querida Esposa como que reproduzida nas almas, a elas descerá abundantemente,
enchendo-as de seus dons, particularmente do dom da sabedoria, a fim de operar
maravilhas de graça. Meu caro irmão, quando chegará esse tempo feliz, esse
século de Maria, em que inúmeras almas escolhidas, perdendo-se no abismo de seu
interior, se tornarão cópias vivas de Maria, para amar e glorificar Jesus
Cristo? Esse tempo só chegará quando se conhecer e praticar a devoção que
ensino, “Ut adveniat regnum tuum, adveniat regnum Mariae”.
84) S.
Ambrósio (Expositio in Lc 1. III, n. 26).
Artigo
VI
Transformação
das almas em Maria à imagem de Jesus Cristo
218. 6 º Se Maria, que é a árvore da
vida, for bem cultivada em nossa alma pela fidelidade às práticas desta
devoção, ela dará fruto em seu tempo; e seu fruto não é outro senão Jesus
Cristo. Vejo tantos devotos e devotas que buscam Jesus Cristo, estes por uma
via e uma prática, aqueles por outra; e muitas vezes depois de muito labutar
durante a noite, podem dizer: “Per totam noctem laborantes, nihi cepimus –
Trabalhamos a noite inteira, nada apanhamos” (Lc 5, 5). E pode-se
responder-lhes: “Laborastis multum, et intulistis parum – muito trabalhastes e
pouco ganhastes”.85 Jesus Cristo está ainda muito fraco em vós. Mas, pelo caminho
imaculado de Maria e por esta prática divina que ensino, trabalha-se durante o
dia, trabalha-se num lugar santo, trabalha-se pouco. Em Maria não há noite,
pois ela jamais pecou, nem teve sequer a sombra dum pecado. Maria é um lugar
santo, o Santo dos santos, em que se formam e modelam os santos.
85) Ag 1, 6
(O texto exato diz “Seminastis multum...”)
219. Notai, se vos apraz, que eu digo
que os santos são moldados por Maria. Há grande diferença entre executar uma
figura em relevo, a martelo e a cinzel, e executá-la por molde. Os escultores e
estatuários têm de esforçar-se muito para fazer uma figura da primeira maneira,
e gastam muito tempo; mas, da segunda maneira, trabalham pouco e terminam em
pouco tempo. S. Agostinho chama a Santíssima Virgem “forma Dei”, o molde de
Deus. “Si formam Dei te appellem, digna exsistis”85: o molde próprio
para formar e moldar deuses. Aquele que é lançado no molde divino fica em breve
formado e moldado em
Jesus Cristo, e Jesus Cristo nele: com pouca despesa e em
pouco tempo, ele se tornará deus, pois foi lançado no mesmo molde que formou um
Deus.
85) Sermo 208
(inter opera S. Augustini): “Sois digna de ser chamada o molde de Deus”.
220. Parece-me que posso muito bem
comparar esses diretores e pessoas devotas que pretendem formar Jesus Cristo em
si mesmos ou nos outros, por meio de práticas diferentes destas, a escultores
que, depositando toda a confiança na própria perícia, conhecimento e arte, dão
uma infinidade de marteladas e embotam o cinzel numa pedra dura, ou numa
madeira áspera, para fazer a imagem de Jesus Cristo; e às vezes não conseguem
dar expressão natural a Jesus Cristo, ou por falta de conhecimentos ou devido a
algum golpe desastrado que prejudica toda a obra. Aqueles, porém, que abraçam
este segredo da graça que lhes apresento, eu os comparo a fundidores e
moldadores que, tendo encontrado o belo molde de Maria, no qual Jesus Cristo
foi natural e divinamente formado, sem se fiar na própria habilidade, mas
unicamente na eficiência do molde, lançam-se e perdem-se em Maria para se
tornarem o retrato natural de Jesus Cristo.
221. Bela e verdadeira comparação! Quem
a compreenderá, porém? Desejo que sejais vós, querido irmão. Mas lembrai-vos
que só se lança no molde o que está fundido e líquido, isto é, que é mister
destruir e fundir em vós o velho Adão, para que venha a ser o novo em Maria.
Artigo
VII
A
maior glória de Jesus Cristo
222. 7º Por esta prática, fielmente
observada, dareis a Jesus Cristo mais glória em um mês, que por qualquer outra,
embora mais difícil, em muitos anos. – Eis as razões do que afirmo:
1º Porque, fazendo vossas ações pela
Santíssima Virgem, como esta prática ensina, abandonais vossas próprias
intenções e operações, ainda que boas e conhecidas, para vos perder, por assim
dizer, nas da Santíssima Virgem, embora as desconheçais; e por aí entrais a
participar da sublimidade de suas intenções, que foram tão puras, que ela deu
mais glória a Deus, pela menor das suas ações, por exemplo, fiando na sua roca,
dando um ponto de agulha, do que um São Lourenço estendido na grelha, por seu
cruel martírio, e mesmo que todos os santos por suas mais heróicas ações; pelo
que, durante sua vida neste mundo, ela conquistou tal soma inefável de graças e
méritos que se contariam antes as estrelas do firmamento, as gotas d’água do
mar e os grãos de areia das praias; e ela deu mais glória a Deus que todos os
anjos e santos reunidos e como eles jamais deram nem poderão dar. Ó prodígio de
Maria! vós só podeis realizar prodígios de graça nas almas que querem de boa mente abismar-se em vós.
223. 2º Porque uma alma, por esta
prática, considerando nada tudo o que pensa ou faz por si mesma, e pondo todo o
seu apoio e complacência nas disposições de Maria, para aproximar-se de Jesus
Cristo e até para falar-lhe, pratica mais humildade que as almas que agem por
si mesmas, que se apóiam e comprazem nas próprias disposições.
Conseqüentemente, ela glorifica mais altamente a Deus, que só é glorificado
perfeitamente pelos humildes e pequenos de coração.
224. 3º Porque a Santíssima Virgem,
querendo, por sua grande caridade, receber em suas mãos virginais o presente de
nossas ações, dá-lhes uma beleza e brilho admiráveis; ela mesma as oferece a
Jesus Cristo, e Nosso Senhor é assim mais glorificado que se nós lhas
oferecêssemos por nossas mãos criminosas.
225. 4º Enfim, porque nunca pensais em
Maria, sem que ela, em vosso lugar, pense em Deus. Nunca a louvais
nem honrais, sem que ela convosco louve e honre a Deus. Maria está toda em
conexão com Deus, e com toda a propriedade eu a chamaria a relação de Deus, que
só existe em referência a Deus, o eco de Deus, que só diz e repete Deus. Santa
Isabel louvou Maria e chamou-a bem-aventurada, porque ela creu, e Maria, o eco
fiel de Deus, entoou: “Magnificat anima mea Dominum – Minha alma glorifica o
Senhor” (Lc 1, 46). O que fez nessa ocasião, Maria o faz todos os dias; quando
a louvamos, amamos, honramos ou lhe damos algo, Deus é louvado, amado, honrado,
e recebe por Maria e em Maria.
Capítulo
VIII
Práticas
particulares desta devoção
Artigo
I
Práticas
exteriores
226. Se bem que o essencial desta
devoção consista no interior, ela conta também práticas exteriores que é
preciso não negligenciar: “Haec oportuit facere et illa non omittere” (Mt 23,
23); tanto porque as práticas exteriores bem feitas ajudam as interiores, como
porque relembram ao homem, que se conduz sempre pelos sentidos, o que fez ou
deve fazer; também porque são próprias para edificar o próximo que as vê, o que
já não acontece com as práticas puramente interiores. Nenhum mundano, portanto,
critique, nem meta aqui o nariz, dizendo que a verdadeira devoção está no
coração, que é preciso evitar exterioridades, que nisto pode haver vaidade, que
é preferível ocultar cada um sua devoção, etc. Respondo-lhes com meu Mestre:
“Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas
obras e glorifiquem vosso Pai que está nos céus” (Mt 5, 16). Não quer isto
dizer, como observa S. Gregório86, que devamos fazer nossas ações e
devoções exteriores para agradar os homens e daí tirar louvores, o que seria
vaidade; mas fazê-las às vezes diante dos homens, com o fito de agradar a Deus
e glorificá-lo, sem, preocupar-nos com o desprezo ou os louvores dos homens.
86) Homil. II
in Evangel.
Citarei apenas abreviadamente
algumas práticas exteriores, que não qualifico de exteriores porque sejam
feitas sem interior, mas porque contêm qualquer exterioridade, e para
distingui-las das que são estritamente interiores.
§
I. Consagração depois de exercícios preparatórios.
227. Primeira prática. Aqueles e
aquelas que quiserem adotar esta devoção, que não está erigida em confraria,
como seria de desejar87, depois de ter, como já disse na primeira
parte desta preparação ao reino de Jesus Cristo88, empregando ao
menos doze dias em desapegar-se do espírito do mundo, contrário ao de Jesus
Cristo, dedicarão três semanas a encher-se de Jesus Cristo por intermédio da
Santíssima Virgem. Eis a ordem a observar:
87) Os votos
de S. Luís Maria de Montfort se realizaram. Sua querida devoção está ereta em
Arquiconfraria, cujos membros, já numerosos, se multiplicam dum modo
extraordinário.
88) Estas
palavras de S. Luís Maria parecem aludir a outra obra que teria servido de
introdução a esta, como por exemplo: “L’amour de la Sagesse éternelle” (Cf.
cap. VII e XVI).
228. Durante a primeira semana aplicarão
todas as orações e atos de piedade para pedir o conhecimento de si mesmo e a
contrição por seus pecados. Tudo farão em espírito de humildade. Para isso
poderão, se quiserem, meditar sobre o que ficou dito sobre o nosso fundo de
maldade (V. acima n. 78 e seguintes), e considerar-se, nos seis dias
desta semana, como uma lesma, um sapo, um porco, uma serpente, um bode; ou,
então, estas três palavras de São Bernardo: “Cogita quid fueris, semen
putridum; quid sis, vas stercorum; quid futurus sis, esca verminum”.89
Pedirão a Nosso Senhor e a seu Espírito Santo que os esclareça, dizendo:
“Domine, ut videam90; ou “Noverim me”91; ou “Veni, Sancte
Spiritus”, e dirão todos os dias a ladainha do Espírito Santo e a oração que
segue. Recorrerão à Santíssima Virgem e lhe pedirão esta grande graça que deve
ser o fundamento das outras, e para isso recitarão todos os dias o “Ave, Maris
Stella” e as ladainhas.
89) Pensa no
que fostes: um pouco de lodo; no que és: vaso de escórias; no que serás: pasto
de vermes” (São Bernardo, inter opera: Meditação sobre o conhecimento da
condição humana).
90) “Senhor,
fazei que eu veja” (Lc 18, 41).
91) Santo
Agostinho: “Que eu me conheça”.
229. Durante a segunda semana,
aplicar-se-ão em todas as suas orações e
obras cotidianas, em conhecer a Santíssima Virgem. Implorarão este conhecimento
ao Espírito Santo. Poderão ler e meditar o que já dissemos a respeito.
Recitarão, como na primeira semana, as ladainhas do Espírito Santo, o “Ave,
Maris Stella”, e mais um rosário todos os dias, ou pelo menos o terço, nesta
intenção.
230. A terceira semana será empregada em conhecer Jesus Cristo.
Poderão ler e meditar o que dissemos neste sentido, e recitar a oração de santo
Agostinho, inserida no número 67. Poderão, com o mesmo santo, dizer e repetir
centenas de vezes por dia: “Noverim te: Senhor, que eu vos conheça”, ou então:
Domine, ut videam – Senhor, fazei que eu veja quem sois”. Como nas semanas
precedentes, recitarão as ladainhas do Espírito Santo e o “Ave, Maris Stella”,
ajuntando as ladainhas do Santíssimo nome de Jesus.
231. Ao fim destas três semanas,
confessar-se-ão e comungarão na intenção de se darem a Jesus Cristo na condição
de escravos por amor, pelas mãos de Maria. E depois da comunhão, que cuidarão
de fazer conforme o método que segue (v. n. 266), recitarão a fórmula de
consagração, que se encontra também adiante (v. p. 280); será necessário que a
escrevam ou mandem escrever, se não estiver impressa, e a assinem no mesmo dia
em que a fizerem.
232. Nesse dia, será bom renderem algum
tributo a Jesus Cristo e a sua Mãe Santíssima, seja em penitência de sua
infidelidade passada às promessas do batismo, seja em sinal de sua dependência
do domínio de Jesus e de Maria. Ora, esse tributo será conforme a devoção e
capacidade de cada um: um jejum, uma mortificação, uma esmola, um círio. Ainda
que não dêem mais que um alfinete em homenagem, contanto que o dêem de bom
coração, é o bastante para Jesus, que só olha a boa vontade.
233. Todos os anos, ao menos, no mesmo
dia, renovarão a consagração, observando as mesmas práticas durante três
semanas.
Poderão até, todos os meses e,
quiçá, todos os dias, renovar, com as poucas palavras seguintes, tudo o que
fizerem: “Tuus totus ego sum, et omnia mea tua sunt – Sou todo vosso e tudo o
que tenho vos pertence”, ó meu amável Jesus, por Maria, vossa Mãe Santíssima.92
92) Os
membros da Arquiconfraria de Maria, Rainha dos corações, ganham uma indulgência
de 300 dias todas as vezes que renovarem sua consagração, pelas palavras: “Sou
todo vosso, e tudo que possuo vos ofereço, ó meu amado Jesus, por Maria, vossa
Mãe Santíssima”.
§ II. Recitação da coroinha da
Santíssima Virgem.
234. Segunda prática. Recitarão
todos os dias de sua vida, sem, entretanto, nenhum constrangimento, a coroinha
da Santíssima Virgem, composta de três Pai-Nossos e doze Ave-Marias, em honra
dos doze privilégios e grandezas da Santíssima Virgem. Esta prática é muito
antiga e tem seu fundamento na Sagrada Escritura. São João viu uma mulher
coroada de doze estrelas, vestida do sol e tendo a lua debaixo de seus pés (Ap
12, 1) e esta mulher, na opinião dos intérpretes93, é a Santíssima
Virgem.
93) Entre
outros, S. Agostinho (Tratct. De Symbolo ad Catechumenos, 1. IV, cap. I); S.
Bernardo (Sermo super “Signum Magnum”, n. 3).
235. Há muitos modos de rezar bem esta
coroinha e seria demasiado longo mencioná-los. O Espírito Santo o inspirará
àqueles e àquelas que mais fiéis se mostrarem a esta devoção. Para rezá-la bem
simplesmente é preciso dizer em primeiro lugar: “Dignare me laudare te, Virgo
sacrata; da mihi virtutem contra hostes tuos”94; em seguida, reza-se
o credo, depois um Pai-Nosso, quatro Ave-Marias e um Glória ao Pai; ainda um
Pai-Nosso, quatro Ave-Marias, e um Glória ao Pai; e assim por diante. Ao
terminar, diz-se: “Sub tuum praesidium”.
94) “Fazei-me
digno de vos louvar, ó Virgem sagrada, e dai-me força contra os vossos
inimigos”.
§ III. Usar pequenas cadeias de
ferro.
236. Terceira prática. É muito
louvável, glorioso e útil àqueles e àquelas, que assim demonstrarão ser
escravos de Jesus em Maria, trazer, como sinal de sua amorosa escravidão,
pequenas cadeias de ferro, bentas com uma bênção especial.95
95)
Poder-se-ia crer que certos decretos das Congregações Romanas tenham proibido
terminantemente o uso dessas pequenas cadeias. Nada vemos, contudo, nesses
decretos que interdite esta prática símbolo da escravidão a Jesus em Maria, no
que consiste propriamente a devoção do B. Montfort (V. Analecta Iuris
Pontificii, 1ª série, col. 757).
Estas demonstrações exteriores não
são na verdade, essenciais, e uma pessoa pode bem se dispensar, embora tenha
abraçado esta devoção. Não posso, contudo, esquivar-me a louvar aqueles e
aquelas que, depois de terem rompido as cadeias vergonhosas da escravidão do
demônio, a que os tinha arrastado o pecado original, e talvez os pecados
atuais, se entregaram voluntariamente à gloriosa escravidão de Jesus Cristo e
com S. Paulo se gloriam de estar acorrentados por Jesus Cristo (cf. Ef 3, 1),
com correntes que, embora de ferro e sem brilho, são mais gloriosas e mais preciosas
que todos os colares de ouro dos imperadores.
237. Nos tempos de outrora era a cruz o
que havia de mais infamante; hoje, no entanto, é o símbolo mais glorioso do
cristianismo. Digamos o mesmo dos ferros da escravidão. Nada havia de mais
ignominioso entre os antigos, e ainda atualmente entre os pagãos. Entre os
cristãos, porém, são mais ilustres, pois elas nos livram e preservam dos liames
vergonhosos do pecado e do demônio; elas nos restituem a liberdade e nos ligam
a Jesus e Maria, não a contragosto e a força, como a forçados, mas por
caridade, por amor, como filhos: “Traham eos in vinculis caritatis” (Os 11, 4)
– eu os atrairei a mim, diz Deus pela boca do profeta, com os vínculos da
caridade, que, por conseqüência, são fortes como a morte (cf. Ct 8, 6), e, de
certo modo, mais fortes naqueles que fielmente trouxeram, até a morte, esses
distintivos gloriosos. Pois a morte, destruindo-lhes embora o corpo e
reduzindo-o à podridão, não destruirá as algemas de sua escravidão, as quais
por serem de ferro, não se corrompem tão facilmente. E, no dia da ressurreição
dos corpos, no juízo final, quem sabe, essas cadeias, pendentes ainda de seus
ossos, não virão a constituir uma parte de seus ossos, não virão a constituir
uma parte de sua glória, mudando-se em cadeias de luz e de glória? Felizes,
portanto, mil vezes felizes os escravos ilustres de Jesus em Maria, que até ao
túmulo usarem essas cadeias!
* * *
238. Eis os motivos por que se usam
estas cadeiazinhas:
1º Relembram ao cristão os votos e
compromissos do batismo, a renovação perfeita das promessas batismais que ele
fez por esta devoção, e a estrita obrigação em que está de se conservar fiel. O
homem, porque se deixa levar mais pelos sentidos do que pela fé pura, esquece
facilmente suas obrigações para com Deus, se não tiver algo que lhas traga à
memória. Por isso estas pequenas cadeias servem para lembrar ao cristão aquelas
cadeias do pecado e da escravidão do demônio, de que o santo batismo o livrou,
e a dependência que, neste sacramento, votou a Jesus Cristo, e a ratificação
dessa dependência, feita ao renovar os seus votos; e um dos motivos por que tão
poucos cristãos pensam nas promessas do santo batismo, e vivem com tanta
libertinagem como se nada houvessem prometido a Deus, como se fossem pagãos, é
não trazerem nenhuma marca ou distintivo exterior que disso os relembre.
239. 2º Mostra que ele não se envergonha
de ser escravo e servo de Jesus Cristo, e que renunciou à escravidão funesta do
mundo, do pecado e do demônio.
3º Garantem-no e preservam-no dos grilhões
do pecado e do demônio, pois, ou estaremos agrilhoados pelas correntes do
inimigo, ou traremos as cadeias da caridade e da salvação: “Vincula peccatorum;
in vinculis caritatis”.
* * *
240. Ah! querido irmão, despedacemos os
grilhões do pecado e dos pecadores, do mundo e dos mundanos, do demônio e de
seus asseclas, e lancemos longe de nós seu jugo funesto: “Dirumpamus vincula
eorum et proiiciamus a nobis iugum ipsorum” (Sl 2, 3). Metamos nossos pés, para
servir-nos das palavras do Espírito Santo, em seus ferros gloriosos e nosso
pescoço em suas cadeias: “Iniice pedem tuum in compedes illius, e in torques
illius collum tuum” (Ecli 6, 25). Curvemos os ombros e carreguemos a Sabedoria,
que é Jesus Cristo, e não nos enfademos de suas correntes: “Subiice humerum
tuum et porta illam, et ne acedieris vinculis eius” (Ecli 6, 26). Notareis que
o Espírito Santo, antes de dizer estas palavras, prepara a alma, a fim de que
ela não rejeite o importante conselho. Eis as suas palavras: “Audi fili, et
accipe consilium intellectus, et ne abiicias consilium meum – Ouve, filho, e
recebe uma sábia advertência, e não rejeites o meu conselho” (Ecli 6, 24).
241. Permiti, caríssimo amigo, que me
uma aqui ao Espírito Santo, para dar-vos o mesmo conselho: “Vincula illius,
alligatura salutaris” (Ecli 6, 31) – Suas cadeias são cadeias de salvação.
Jesus pendente da cruz deve atrair tudo a si, e tudo, de bom ou mau grado, será
atraído. Do mesmo modo ele atrairá os réprobos pelas correntes de seus pecados,
para acorrentá-los, como forçados e demônios, à sua ira eterna e à sua justiça
vingadora. Nos últimos tempos, porém, atrairá especialmente os predestinados,
pelas cadeias da caridade: “Omnia grahan ad meipsum” (Jo 12, 32). “Trahan eos
in vinculis caritatis” (Os 11, 4).
242. Esses amorosos escravos de Jesus
Cristo ou acorrentados de Jesus Cristo, “vincti Christi” (Ef 3, 1), podem usar
suas cadeias ou ao pescoço ou no braço, ou na cintura, ou nos pés. O padre
Vicente Caraffa, sétimo geral da Companhia de Jesus, falecido em odor de santidade
no ano 1643, usava, como sinal de sua servidão, um círculo de ferro nos pés, e
dizia que lamentava não poder arrastar publicamente os grilhões. A madre Inês
de Jesus, a quem já nos referimos (n. 170), trazia sempre uma corrente de ferro
na cintura. Outros a usaram ao pescoço, em penitência pelos colares de pérola
que costumam usar no mundo. Outros a usaram no braço, para se lembrarem, no
trabalho manual, que eram escravos de Jesus Cristo.
§ IV. Devoção especial ao mistério
da Encarnação.
243. Quarta prática. Terão uma
devoção especial pelo mistério da Encarnação do Verbo, a 25 de março96,
que é o mistério adequado a esta devoção, pois que esta devoção foi inspirada
pelo Espírito Santo: 1º para honrar e imitar a dependência em que Deus Filho quis
estar de Maria, para glória de Deus seu Pai e para nossa salvação; dependência
que transparece particularmente neste mistério em que Jesus se torna
cativo e escravo no seio de Maria Santíssima, aí dependendo dela em tudo; 2º
para agradecer a Deus as graças incomparáveis que concedeu a Maria,
principalmente por tê-la escolhido para sua Mãe digníssima, escolha feita neste
mistério. São estes os dois fins principais da escravização a Jesus Cristo em
Maria.
96) No dia 25
de março, todos os membros da Arquiconfraria de Maria, Rainha dos corações,
podem ganhar uma indulgência plenária.
244. Peço-vos notar que digo
ordinariamente: “o escravo de Jesus em Maria, a escravização a Jesus em Maria”.
Pode-se, é verdade, dizer como muitos já o disseram até aqui, “o escravo de
Maria, a escravidão da Santíssima Virgem”. Creio, porém, que é melhor dizer
“escravo de Jesus em Maria” como aconselhava M. Tronson, superior geral do
seminário de S. Sulpício, o qual era conhecido por sua rara prudência e grande
piedade. Assim aconselhou ele a um eclesiástico que o consultou sobre o
assunto. As razões são estas:
245. 1º Visto estarmos num século
orgulhoso, em que pululam os sábios enfatuados, os espíritos fortes e críticos,
que sempre acham o que falar das mais sólidas e bem estabelecidas práticas de
piedade, é preferível, para evitar-lhes ocasião de crítica desnecessária, dizer
“escravidão de Jesus em Maria” e dizer-se “escravo de Jesus Cristo” do que
escravo de Maria. Assim a denominação desta devoção será dada antes pelo
caminho e meio para atingir este fim, Maria Santíssima. Pode-se, entretanto,
usar uma ou outra sem o menor escrúpulo, como eu faço. Um homem, por exemplo,
que vai de Orleans a Tours pelo caminho de Amboise, pode evidentemente dizer
que vai a Amboise e que vai a Tours. A única diferença é que Amboise é apenas o
caminho para ir a Tours e Tours é o fim, o termo de sua viagem.
246. Como o principal mistério que se
celebra e honra nesta devoção é o mistério da Encarnação, no qual só se pode
contemplar Jesus em Maria, e encarnado em seu seio, é mais adequado dizer-se “a
escravidão de Jesus em Maria”, de Jesus residindo e reinando em Maria, conforme
a bela oração de tantos homens célebres: “Ó Jesus vivendo em Maria, vinde e
vivei em nós, em vosso espírito de santidade”, etc.
247. 3º Este modo de falar patenteia
ainda mais a união íntima entre Jesus e Maria. Tão intimamente estão unidos que
um é tudo no outro: Jesus é tudo em Maria e Maria é tudo em Jesus; ou, melhor,
ela já não existe, mas Jesus somente nela, e antes se separaria do sol a luz,
do que apartar Maria de Jesus. É assim que se pode chamar Nosso Senhor “Jesus
de Maria”, e a Santíssima Virgem “Maria de Jesus”.
248. O tempo não me permite deter-me
aqui para explicar as excelências e as grandezas do mistério de Jesus vivendo e
reinando em Maria, ou a Encarnação do Verbo. Contento-me, por isso, em dizer,
em três palavras, que é este o primeiro mistério de Jesus Cristo, o mais
oculto, o mais elevado e o menos conhecido; que é neste mistério que Jesus, em
colaboração com Maria, em seu seio, e por isto chamado pelos santos “aula
sacramentorum”, sala dos segredos de Deus97, escolheu todos os
eleitos; que foi neste mistério que ele operou todos os mistérios subseqüentes
de sua vida, pela aceitação deles: “Iesus ingrediens mundum dicit: Ecce venio
ut faciam, Deus, voluntatem tuam” (Hb 10, 5-9). Por conseguinte, este mistério
é um resumo de todos os mistérios, e contém a vontade e a graça de todos. Este
mistério é, enfim, o trono da misericórdia, da liberdade e da glória de Deus. O
trono da misericórdia de Deus, porque, já que não podemos aproximar-nos de
Jesus senão por Maria, não podemos ver Jesus nem falar-lhe senão por intermédio
de Maria. Jesus atende sempre a sua querida Mãe e concede sempre sua graça e
sua misericórdia aos pobres pecadores: “Adeamus ergo cum fiducia ad thronum
gratiae – Cheguemo-nos, pois, confiadamente, ao trono da graça” (Hb 4, 16). É o
trono de sua liberalidade para Maira, porque este novo Adão, enquanto permanceu
nesse veradeiro paraíso terrestre, aí realizou ocultamente tantas maravilhas
que nem os anjos nem os homens as compreendem; por isso os santos chamaram
Maria a magnificência de Deus: “Magnificentia Dei”98, como se Deus
só fosse magnífico em Maria: “Solummodo ibi magnificus Dominus” (Is 33, 21). É
o trono de sua glória para seu Pai, pois foi em Maria que Jesus Cristo acalmou
perfeitamente seu Pai irritado contra os homens; que ele recuperou
perfeitamente a glória que o pecado lhe tinha arrebatado, e que, pelo
sacrifício, que neste mistério fez da sua vontade e de si mesmo, lhe deu mais
glória como jamais lhe deram todos os sacrifícios da antiga lei, e, finalmente,
lhe deu uma glória infinita como ainda não recebera de criatura humana.
97) S.
Ambrósio: De Instit. Virg., cap. VII, n. 50.
98) Ricardo
de São Lourenço: De laud. Virg. IV.
§ V. Grande devoção à Ave-Maria e ao
terço.
249. Quinta prática. Terão grande
devoção ao recitar a Ave-Maria, ou a Saudação Angélica, da qual bem poucos
cristãos, mesmos esclarecidos, conhecem o valor, o mérito, a excelência e a
necessidade. Foi preciso que a Santíssima Virgem aparecesse várias vezes a
grandes santos muito doutos, para demonstrar-lhes o mérito desta pequena
oração, como sucedeu a S. Domingos, a S. João Capistrano, ao bem-aventurado
Alano de la Roche. E
eles compuseram livros inteiros sobre as maravilhas e a eficácia da Ave-Maria,
para conversão das almas. Altamente publicaram e pregaram que a salvação do
mundo começou pela Ave-Maria, e a salvação de cada um em particular está ligada
a esta prece; que foi esta prece que trouxe à terra seca e árida o fruto da
vida, e que é esta mesma prece que deve fazer germinar em nossa alma a palavra
de Deus e produzir o fruto da vida, Jesus Cristo; que a Ave-Maria é um orvalho
celeste, que umedece a terra, isto é, a alma, para fazer brotar o fruto no
tempo adequado; e que uma alma que não for orvalhada por esta prece ou orvalho
celeste não dará fruto algum, nem dará senão espinhos, e não estará longe de
ser amaldiçoada (Hb 6, 8).
250. No livro “De dignitate Rosarii” do
bem-aventurado Alano de la Roche,
lê-se o seguinte que a Santíssima Virgem lhe revelou: “Saibas, meu filho, e
comunica-o a todos, que um sinal provável e próximo de condenação eterna é a
aversão, a tibieza, a negligência em rezar a Saudação Angélica, que foi a
reparação de todo o mundo – Scias enim et secure inteligas et inde late omnibus
patefacias, quod videlicet signum probabile est et propinquum aeternae
damnationis horrere e acediari ac negligere Salutationem angelicam, totius
mundi reparationem” (cap. II). Eis aí palavras consoladoras e terríveis, que se
custaria a crer, se não no-la garantissem esse santo homem e antes dele S.
Domingos, como, depois dele, muitos personagens fidedignos, com a experiência
de muitos séculos. Pois sempre se verificou que aqueles que trazem o sinal de
condenação, como os hereges, os ímpios, os orgulhosos, e os mundanos, odeiam e
desprezam a Ave-Maria e o terço. Os hereges ainda aprendem e recitam o
Pai-Nosso, mas abominam a Ave-Maria e o terço. Trariam antes uma serpente sobre
o peito do que o rosário ou o terço. Os orgulhosos também, embora católicos,
mas tendo as mesmas inclinações que seu pai Lúcifer, desprezam ou mostram uma
indiferença completa pela Ave-Maria, considerando o terço uma devoção
efeminada, suficiente para os ignorantes e analfabetos. Ao contrário, tem-se
visto e a experiência o prova que aqueles e aquelas que possuem outros e
grandes indícios de predestinação, amam, apreciam e recitam com prazer a
Ave-Maria. E que quanto mais são de Deus, tanto mais amam esta oração. É o que
a Santíssima Virgem diz também ao bem-aventurado Alano, em seguida às palavras
que citei.
251. Não sei como isto acontece nem por
que; entretanto é verdade, e não conheço melhor segredo para verificar se uma
pessoa é de Deus, do que examinar se gosta ou não de rezar a Ave-Maria e o
terço. Digo: gosta, pois pode acontecer que alguém esteja na impossibilidade
natural ou até sobrenatural de dizê-la, mas sempre a ama e a inspira aos
outros.
* * *
252. Almas predestinadas, escravas de
Jesus em Maria, aprendei que a Ave-Maria é a mais bela de todas as orações,
depois do Pai-Nosso. É a saudação mais perfeita que podeis fazer a Maria, pois
é a saudação que o Altíssimo indicou a um arcanjo, para ganhar o coração da
Virgem de Nazaré. E tão poderosas foram aquelas palavras, pelo encanto secreto
que contêm, que Maria deu seu pleno consentimento para a Encarnação do Verbo,
embora relutasse em sua profunda humildade. É por esta saudação que também vós
ganhareis infalivelmente seu coração, contanto que a digais como deveis.
253. A Ave-Maria, rezada com devoção,
atenção e modéstia, é, como dizem os santos, o inimigo do demônio, pondo-o logo
em fuga, e o martelo que o esmaga; a santificação da alma, a alegria dos anjos,
a melodia dos predestinados, o cântico do Novo Testamento, o prazer de Maria e
a glória da Santíssima Trindade. A Ave-Maria é um orvalho celeste que torna a
alma fecunda; é um beijo casto e amoroso que se dá em Maria, é uma rosa
vermelha que se lhe apresenta, é uma pérola preciosa que se lhe oferece, é uma
taça de ambrosia e de néctar divino que se lhe dá. Todas estas comparações são
de santos ilustres.
254. Rogo-vos instantemente, pelo amor
que vos consagro em Jesus e Maria, que não vos contenteis de recitar a coroinha
de Santíssima Virgem, mas também o vosso terço, e até, se houver tempo, o vosso
rosário, todos os dias, e abençoareis, na hora da morte, o dia e a hora em que
me acreditastes; e, depois de ter semeado sob as bênçãos de Jesus e de Maria,
colhereis bênçãos eternas no céu: Qui seminat in benedictionibus, de
benedictionibus et metet” (2Cor 9, 6).
§
VI. Recitação do Magnificat
255. Sexta prática. Para
agradecer a Deus pelas graças que concedeu à Santíssima Virgem, dirão
freqüentemente o Magnificat, a exemplo da bem-aventurada Maria d’Oignies
e de muitos outros santos. É a única oração e a única obra composta por Maria,
ou, melhor, que Jesus fez por meio dela, pois ele fala pela boca de sua Mãe
Santíssima. É o maior sacrifício de louvor que Deus já recebeu na lei da graça.
É, dum lado, o mais humilde e o mais reconhecido e, doutro, o mais sublime e
mais elevado de todos os cânticos. Há neste cântico mistérios tão grandes e tão
ocultos, que os próprios anjos ignoram. Gerson, que foi um doutor tão sábio
quanto piedoso, depois de empregar grande parte de sua vida escrevendo tratados
cheios de erudição e piedade, sobre os mais difíceis temas, tremeu e vacilou no
fim da carreira, ao empreender a explicação do Magnificat, com que tencionava
coroar todas as suas obras. Num volume in-folio, ele nos diz coisas admiráveis
do belo e divino cântico. Entre outras, afirma que a Santíssima Virgem o
recitava muitas vezes sozinha, principalmente depois da santa comunhão, em ação
de graças. O sábio Benzônio, num explicação do mesmo cântico, cita vários milagres
operados por sua virtude, e diz que os demônios tremem e fogem, quando ouvem as
palavras do Magnificat: “Fecit potentiam in brachio suo, dispersit superbos
mente cordis sui” (Lc 1, 51).
§ VII. O desprezo pelo mundo.
256. Sétima prática. Os fiéis
servos de Maria devem desprezar, odiar e fugir ao mundo corrompido, e servir-se
das práticas de desprezo pelo mundo, que assinalamos na primeira parte.99
99) V. nota 3 do n. 227. Cf.
“L’Amour de la Sagesse
éternelle”, cap. XVI.
Artigo
II
Práticas
especiais e interiores para os que querem tornar-se perfeitos
257. Além das práticas exteriores da
devoção que vimos referindo, as quais não se deve omitir por negligência ou
desprezo, na medida que o estado e as condições de cada um o permitem,
acrescentamos algumas práticas interiores assaz santificantes para aqueles
chamados pelo Espírito Santo a mais alta perfeição.
Consiste, em quatro palavras, em
fazer todas as suas ações por Maria, com Maria, em Maria e para Maria, a fim de
fazê-las mais perfeitamente por Jesus, com Jesus, em Jesus e para Jesus.
§
I. Fazer todas as ações por Maria.
258. 1º É preciso fazer todas as ações
por Maria, quer dizer, em todas as coisas obedecer à Santíssima Virgem, e em
tudo conduzir-se por seu espírito, que é o santo espírito de Deus. São filhos
de Deus os que se conduzem pelo espírito de Deus: “Qui spiritu Dei aguntur, ii
sunt filii Dei” (Rm 8, 14). E os que pautam sua conduta pelo espírito de Maria
são filhos de Deus, como já demonstramos; entre tantos devotos da Santíssima
Virgem, só os que se conduzem por seu espírito é que são devotos verdadeiros e
fiéis. Disse que o espírito de Maria é o espírito de Deus, porque ela jamais se
conduziu por seu próprio espírito, e sempre pelo espírito de Deus, e este de
tal modo a dominou que acabou tornando-se seu próprio espírito. Por isto, diz
Santo Ambrósio: “Sit in singulis... etc. – Esteja a alma de Maria em cada um
para glorificar o Senhor; esteja em cada um o espírito de Maria para que se
regozija em Deus”.100 Quão feliz é uma alma quando, a exemplo do bom
irmão jesuíta Rodriguez101, falecido em odor de santidade, é toda
possuída e governada pelo espírito de Maria, que é um espírito suave e forte,
zeloso e prudente, humilde e corajoso, puro e fecundo!
100) Palavras
já citadas e comentadas no n. 217.
101)
Canonizado por Leão XIII, em 15 de janeiro de 1888.
259. Para que a alma se deixe conduzir
por este espírito de Maria, é mister: 1º Renunciar ao próprio espírito, às
próprias luzes e vontades, antes de qualquer coisa: por exemplo, antes da oração,
antes de dizer ou ouvir a santa missa, antes de comungar, etc...; pois as
trevas de nossa vontade própria, se bem que nos pareçam boas, poriam obstáculo
ao santo espírito de Maria. 2º É preciso entregar-se ao espírito de Maria para
ser por ele movido e conduzido como ela quiser. Cumpre colocar-se e permanecer
entre suas mãos virginais como um instrumento nas mãos dum operário, como uma
cítara nas mãos dum artista. Cumpre abandonar-se e perder-se nela, como uma
pedra que se atira ao mar. E isto se faz simplesmente e num instante, por um só
olhar do espírito, um pequeno movimento da vontade, ou verbalmente. Dizendo,
por exemplo: “Renuncio a mim mesmo, dou-me a vós, minha querida Mãe”. E ainda
que não sintamos nenhuma doçura sensível neste ato de união, ela não deixa de
ser verdadeiro, do mesmo modo que, se disséssemos, com desagrado de Deus:
“Dou-me ao demônio”, com a mesma sinceridade, embora o disséssemos sem mudança
alguma sensível, não pertenceríamos menos verdadeiramente ao demônio. 3º É
preciso, de tempos em tempos, durante uma ação ou depois, renovar o ato de
oferecimento e de união, e, quanto mais o fizermos, mais cedo nos
santificaremos, e mais cedo chegaremos à união com Jesus Cristo, que segue
sempre necessariamente a união com Maria, pois o espírito de Maria é o espírito
de Jesus.
§
II. Fazer todas as ações com Maria.
260. 2º É mister fazer todas as ações
com Maria, isto é, em todas as ações olhar Maria como um modelo acabado de
todas as virtudes e perfeições, que o Espírito Santo formou numa pura criatura,
e imitá-lo na medida de nossa capacidade. Cumpre, portanto, que, em cada ação,
consideremos como Maria a fez ou faria se estivesse em nosso lugar. Devemos,
por isso, examinar e meditar as grandes virtudes que ela praticou durante a
vida, especialmente 1º sua fé viva, pela qual creu fielmente e constantemente
até ao pé da cruz, sobre o Calvário; 2º sua humildade profunda que a levou a
esconder-se, a calar-se, a submeter-se a tudo e a colocar-se em último lugar;
3º sua pureza virginal, que jamais teve nem terá semelhante sob o céu, e por
fim todas as suas outras virtudes.
Lembrai-vos, repito-o uma segunda
vez, de que Maria é o grande e único molde de Deus102 próprio para
fazer imagens vivas de Deus, com pouca despesa e em pouco tempo; e que uma alma
que encontrou este molde, e que nele se perde, fica em breve mudada em Jesus Cristo, aí
representado ao natural.
102) Ver
antes, n. 218 seg.
§
III. Fazer todas as ações em Maria.
261. 3º É preciso fazer todas as ações
em Maria.
Para compreender cabalmente esta
prática, é necessário saber que a Santíssima Virgem é o verdadeiro paraíso
terrestre do novo Adão, de que o antigo paraíso terrestre é apenas figura. Há,
portanto, neste paraíso terrestre, riquezas, belezas, raridades e doçuras
inexplicáveis, que o novo Adão, Jesus Cristo, aí deixou. Neste paraíso ele pôs
suas complacências durante nove meses, aí operou suas maravilhas e aí acumulou
riquezas com a magnificência de um Deus. Este lugar santíssimo é formado de uma
terra virgem e imaculada, da qual se formou e nutriu o novo Adão, sem a menor
mancha ou nódoa, por operação do Espírito Santo que aí habita. É neste paraíso
terrestre que está em verdade a árvore da vida que produziu Jesus Cristo, o
fruto da vida; a árvore da ciência do bem e do mal, que deu a luz ao mundo. Há,
neste lugar divino, árvores plantadas pela mão de Deus e orvalhadas por sua
unção divina, árvores que produziram e produzem, todos os dias, frutos
maravilhosos dum sabor divino; há canteiros esmaltados de belas e variegadas flores
de virtudes, cujo perfume delicia os próprios anjos. Ostentam-se neste lugar
prados verdes de esperança, torres fortes e inexpugnáveis e fortes, habitações
cheias de encanto e segurança, etc. Ninguém, exceto o Espírito Santo, pode dar
a conhecer a verdade oculta sob estas figuras de coisas materiais. Reina neste
lugar um ar puro, sem infecção, um ar de pureza; um belo dia sem noite, da
humanidade santa; um belo sol sem sombras, da Divindade; uma fornalha ardente e
contínua de caridade, na qual todo o ferro que aí se lança fica abrasado e se
transforma em ouro; há um rio de humildade que surge da terra, e que,
dividindo-se em quatro braços, rega todo este lugar encantado: são as quatro
virtudes cardeais.
262. O Espírito Santo, pela boca dos
Santos Padres, chama também a Santíssima Virgem: 1º a porta oriental, por onde
o sumo sacerdote Jesus Cristo entra e vem ao mundo (cf. Ez 44, 2-3); por ela
entrou da primeira vez, e por ela virá da segunda; 2º o santuário da Divindade,
o reclinatório da Santíssima Trindade, o trono de Deus, a cidade de Deus, o
altar de Deus, o templo de Deus, o mundo de Deus. Todos estes diferentes
epítetos e louvores são verdadeiros em relação às diversas maravilhas e graças
que o Altíssimo realizou em
Maria. Oh! que riqueza! que glória! que prazer! que
felicidade poder entrar e habitar em Maria, em quem o Altíssimo colocou o trono
de sua glória suprema!
263. Mas quão difícil é a pecadores,
como somos, alcançar a permissão e a capacidade e a luz para entrar em lugar
tão alto e tão santo, guardado não por um querubim, como o antigo paraíso
terrestre, mas pelo próprio Espírito Santo, que nele se tornou o Senhor
absoluto e do qual diz: “Hortus conclusus soror mea sponsa, hortus conclusus,
fons signatus” (Ct 4, 12). Maria é fechada; Maria é selada; os miseráveis
filhos de Adão e Eva, expulsos do paraíso terrestre, só tem acesso a este outro
paraíso por uma graça especial do Espírito Santo, a qual devem merecer.
264. Depois que, pela fidelidade,
obtivermos esta graça insigne, é com complacência que devemos morar no belo
interior de Maria, aí repousar em paz, aí apoiar-nos com toda a confiança, aí
seguramente esconder-nos e perder-nos sem reserva, a fim de que neste seio
virginal: 1º a alma se alimente do leite de sua graça e de sua misericórdia maternal;
2º aí fique livre de suas perturbações, de seus temores e escrúpulos: 3º aí
esteja em segurança, ao abrigo de todos os seus inimigos, o demônio, o mundo e
o pecado, que aí não tem jamais entrada; e por isso ela diz que os que operam
nela, não pecarão: “Qui operantur in me, non peccabunt” (Ecli 24, 30), isto é,
os que em espírito, habitam a Santíssima Virgem, não cometerão pecado grave; 4º
para que a alma fique formada em Jesus e Cristo e Jesus Cristo nela; porque o
seu seio, como dizem os Santos Padres103, é a sala dos sacramentos
divinos, onde Jesus Cristo e todos os eleitos se formaram: “Homo et homo natus
est in ea” (Sl 86, 5).104
103) Ver
acima n. 248: “Aula sacramentorum”.
104) Sobre
este texto, veja-se o comentário de nosso Santo, n. 32.
§ IV. Fazer todas as ações para
Maria.
265. 4º É preciso fazer finalmente todas
as ações para Maria. Porque, desde que nos entregamos completamente a seu
serviço, é justo que façamos tudo para ela, como um criado, um servo, um
escravo. Não a tomamos, porém, como fim último de nossos serviços, que é
somente Jesus Cristo, mas como fim próximo, intermédio misterioso, e o meio
mais fácil de chegar a ele. A exemplo de um bom servo e escravo, é preciso que
não fiquemos ociosos, e sim que, apoiados por sua proteção, empreendamos e
realizemos grandes coisas para tão augusta Soberana. É preciso defender seus
privilégios quando alguém os disputar; sustentar sua glória, quando alguém a
atacar; atrair todo o mundo, se for possível, ao seu serviço e a esta
verdadeira e sólida devoção; falar, clamar contra todos os que abusem de sua
devoção para ultrajar seu Filho; e ao mesmo tempo estabelecer esta verdadeira
devoção. E como recompensa destes pequenos serviços, não devemos pretender mais
que a honra de pertencer a uma Princesa tão amável, e a felicidade de, por meio
dela, ficarmos unidos a Jesus Cristo, seu Filho, com um liame indissolúvel no
tempo e na eternidade.
Glória a Jesus em Maria!
Glória a Maria em Jesus!
Glória a Deus somente!
Suplemento
Modo
de praticar esta devoção na santa comunhão
I
Antes
da comunhão
266. 1º Humilhar-vos-eis profundamente
diante de Deus. 2º Renunciareis a vosso íntimo corrompido e a vossas
disposições, ainda que vosso amor-próprio vo-las faça parecer boas. 3º
Renovareis vossa consagração, dizendo: “Tuus totus ego sum, et omnia mea sunt:
Sou todo vosso, minha querida Senhora, com tudo que tenho105 4º
Suplicareis a esta boa Mãe que vos empreste seu coração, para, com as mesmas
disposições, receberdes seu Filho. Fareis ver a ela, que importa à glória de
seu Filho não ser introduzido num coração tão manchado como o vosso, e tão
inconstante, que havia de tirar-lhe a glória ou perdê-la; se ela, entretanto,
quiser habitar em vós para receber seu Filho, pode-o facilmente, em vista do
domínio que tem sobre os corações; e, por ela, seu Filho será bem recebido, sem
mancha, e sem perigo de ser ultrajado: “Deus in medio eius non commovebitur”
(Sl 45, 6). Dir-lhe-eis confidentemente
que tudo que lhe tendes dado de vossos bens é pouco para honrá-la, mas pela santa comunhão, lhe dareis o mesmo
presente que o Pai eterno lhe deu, presente que mais há de honrá-la, que se lhe
désseis todos os bens do mundo; e que, enfim, Jesus deseja ainda ter nela suas
complacências e seu repouso, seja, embora, em vossa alma, mais suja e pobre do
que o estábulo, ao qual Jesus não opôs dificuldades em descer, pois que ela lá
estava. Com as seguintes e ternas palavras lhe pedireis seu coração: “Accipio
te in mea omnia. Praebe mihi cor tuum, o Maria!”.106
105) Ou então
a fórmula indulgenciada, indicada em “Notícias sobre a Arquiconfraria de Maria,
Rainha dos corações” (Vantagens e privilégios, 3º).
106)
Adaptação dos dois textos da Sagrada Escritura, comentados no decorrer do
Tratado”. Cf. Jo 19, 19, 27 e Prov 23, 26.
II
Durante
a comunhão
267. Prestes a receber Nosso Senhor
Jesus Cristo, dir-lhe-eis três vezes, depois do “Pater”: “Domine, non sum
dignus...” etc., como se dissésseis, pela primeira vez, ao Pai eterno que,
devido a vossos maus pensamentos e ingratidões para com ele, não sois digno de
receber seu único Filho. Eis, porém, Maria, sua serva: “Ecce ancilla Domini”,
que tudo faz por vós, e que vos dá uma confiança e esperança especiais, junto
de sua Majestade: “Quoniam singulariter in spe constituisti me” (Sl 4, 10).
268. Direis ao Filho: “Domine, non sum
dignus...” etc., que não sois digno de recebê-lo, por causa de vossas palavras
inúteis e más, e vossa infidelidade em seu serviço; vós lhe rogais, entretanto,
que tenha piedade de vós, pois que ides introduzi-lo na morada de sua própria
Mãe e vossa, e que não o deixareis partir, sem que ele venha aí alojar-se:
“Tenui eum, nec dimitttam, donec introducam illum in domum matris meae, et in
cubiculum genitricis meae” (Ct 3, 4). Implorar-lhe-eis que se levante e venha
para o lugar de seu repouso e para a arca de sua santificação: “Surge, Domine,
in requiem tuum, tu et arca sanctificationis tuae” (Sl 131, 8). Dir-lhe-eis
que, de modo algum, depositais vossa confiança em vossos méritos, vossa força e
vossas preparações, como Esaú, e sim nos de Maria, vossa querida Mãe, a exemplo
do pequeno Jacob nos desvelos de Rebeca; que, pecador e Esaú que sois, ousais
aproximar-se de sua santidade, ornado e apoiado pelas virtudes de sua Mãe
Santíssima.
269. Direis ao Espírito Santo: “Domine,
non sum dignus...” etc., que não sois digno de receber a obra-prima de sua
caridade, em vista da tibieza e iniqüidade de vossas ações e de vossas
resistências a suas inspirações. Mas toda a vossa confiança é Maria, sua fiel
Esposa. E direis com São Bernardo: “Haec mea maxima fiducia est; haec tota
ratio spei meae”.107 Podeis mesmo pedir-lhe que desça ainda a Maria,
sua Esposa inseparável; pois seu seio é tão puro e seu coração tão abrasado
como sempre, e que se ele não descer à vossa alma, Jesus e Maria não serão aí
formados, nem dignamente alojados.
107) “De Aquaeductu”, n. 7.
III
Depois
da santa comunhão
270. Inteiramente recolhido, os olhos
fechados, depois da santa comunhão, introduzireis Jesus Cristo no coração de
Maria. A sua Mãe o dareis, e ela o receberá amorosamente, colocá-lo-á em lugar
de honra, adorá-lo-á profundamente, amá-lo-á perfeitamente, abraçá-lo-á
estreitamente, e, em espírito e verdade, lhe prestará honras que nós, cercados
de espessas trevas, desconhecemos.
271. Ou, então, jazei profundamente
humilhado, na presença de Jesus residindo em Maria; ou permanecei como um
escravo à porta do palácio real, onde o Rei se entretém com a Rainha; e,
enquanto eles conversam sem necessidade de vossa presença, ide em espírito ao céu e a toda a terra rogar às criaturas
que em vosso lugar agradeçam, adorem e amem a Jesus e Maria: “Venite, adoremus,
venite!” (Sl 94, 6).
272. Ou, ainda, pedi a Jesus, em união
com Maria, que, por meio dela venha à terra o seu reino, ou a divina sabedoria,
ou o amor divino, ou o perdão de vossos pecados, ou qualquer outra graça, mas
sempre por Maria e em Maria.
E, considerando-vos a vós mesmo, dizei: “Ne respicias,
Domine, peccata mea – Senhor, não olheis os meus pecados”108, “sed
oculi tui videant aequitates Mariae”109: mas que vossos olhos só vejam em mim
as virtudes e graças de Maria. E, lembrando-vos de vossos pecados,
acrescentareis: “Inimicus homo hoc fecit” (Mt 13, 28): Eu, que sou o meu maior
inimigo, cometi esses pecados; ou, então: “Ab homine iniquo et doloso erue me”
(Sl 42, 1), ou “Te oportet crescere, me autem minui” (cf. Jo 3, 30): Meu Jesus,
é preciso que cresçais em minha alma e que eu diminua. Maria, é preciso que
cresçais em mim e que eu seja menos do que tenho sido. “Crescite et
multiplicamini” (Gn 1, 22): “Ó Jesus e Maria, crescei em mim e multiplicai-vos
fora, nos outros.
108) Missal
romano, 1ª orat. ante communionem.
109) Sl 16,
2, aplicado à Santíssima Virgem.
273. São infinidade os pensamentos que o
Espírito Santo fornece, e vos fornecerá se fordes bastante interior,
mortificado e fiel a esta grande e sublime devoção, que acabo de ensinar-vos.
Lembrai-vos que, quanto mais deixardes Maria agir em vossa comunhão, mais será
Jesus glorificado; e tanto mais deixareis agir Maria para Jesus, e Jesus em
Maria, quanto mais profundamente vos humilhardes, e, então, os ouvireis em paz
e silêncio, sem vos afligirdes para ver, degustar, nem sentir, pois, em toda
parte, o justo vive da fé, e especialmente na santa comunhão que é um ato de
fé: “Iustus meus ex fide vivit” (Hb 10, 38).
**********************
O Texto cima está conforme a publicação do livro pela
Editora Vozes, mas o texto abaixo é modificado, elabora por Luxã Nautilho para melhor
preparação dos fiéis para a consagração:
APÊNDICE
PREPARAÇÃO PARA A CONSAGRAÇÃO DE SI MESMO COMO
ESCRAVO (A) DE JESUS E MARIA:
33 DIAS DE PREPARAÇÃO EM HONRA DOS 33 ANOS DE
JESUS NA TERRA.
É
preciso ler e estudar o livro Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima
Virgem, de São Luís Maria Grignion de Montfort
§ 1. Doze dias
preliminares, de:
... no ano comum: 20 de fevereiro a 3 de março (12 dias)
... no ano bissexto: 21 de fevereiro a 3 de março (12 dias)
Rezar: 1. Vem,
Espírito Criador (p. 258, na publicação da Editora Vozes no Brasil)
2.
Ave, Estrela do Mar (p.261)
§ 2. Primeira Semana, de:
04 a 10 de março (no ano comum e bissexto)
Rezar: 1. Vem, Espírito Criador
2.
Ave, Estrela do Mar
3.
Ladainha do Espírito Santo (p. 262)
4.
Ladainha de Nossa Senhora (p. 267)
§ 3. Segunda Semana, de: 11 a 17 de março (no ano comum e bissexto)
Rezar: 1. Ladainha do Espírito Santo
2.
Ave, Estrela do Mar.
3.
Terço ou Rosário (conforme a p 283)
§ 4. Terceira Semana, de: 18 a 24 (no ano comum e bissexto)
Rezar: 1. Ladainha do Espírito Santo.
2.
Ave, Estrela do Mar.
3.
Oração de Santo Agostinho (Tratado Nº 67).
4.
Ladainha do SS. Nome de Jesus.
5.
Ladainha do Sagrado Coração de Jesus.
§ 5. Compromisso: Rezar todos os dias:
1. O Magnificat (Tratado Nº 255).
2. Eu sou todo vosso/ e tudo que
possuo, vos ofereço,/ o meu amado Jesus,/ por Maria, vossa Mãe Santíssima. (300
dias de indulgência cada vez – Tratado Nº 233).
3. A Coroa de Nossa Senhora (Tratado Nº 234-235).
4. Usar um objeto sagrado ao corpo como sinal da consagração (Tratado
Nº 236).
Outros compromissos:
5. Renovar a consagração anualmente com a devida preparação dos 33 dias
(Tratado Nº 233).
6. Assinar a Consagração toda vez que renovar a cada ano e declarar a
data (Tratado Nº 231).
PREPARAÇÃO
PARA A CONSAGRAÇÃO DE SI MESMO COMO ESCRAVO DE JESUS E MARIA, SEGUNDO O MÉTODO DE SÃO LUÍS MARIA GRIGNION
DE MONTFORT.
§ 1.
DOZE DIAS PRELIMINARES – Tratado Nº 227
Empregados
em desapegar-se do espírito do mundo.
Rezar:
I. Vem, Espírito Criador.
- Vem, Espírito
Criador. / Visita as mentes dos teus / e os peitos que Tu criaste / Enche de
graça dos céus.
- Tu és chamado
Paráclito, / do excelso Deus doação, / fonte viva, caridade, / fogo, espiritual
unção.
- Tu, com septiforme
dádiva, / Dedo da destra Paterna, / promessa sua fiel, que às línguas / Dás
força de voz superna.
- Nos sentidos
espalha a luz / E no peito infunde amor / Alentando o corpo tão frágil / com
teu perene vigor.
- Repele os nossos
contrários / E dá-nos depressa a paz. / seguindo-Te como guia / O mal evitar
nos farás.
- Mostra quem seja o
Pai, / O Filho também conheçamos / Em Ti que és Espírito / De ambos, faz sempre
creiamos.
- A Deus o Pai se dê
glória / E ao Filho à vida tornado / E a Ti, Espírito Consolador / Louvor sem
fim seja dado. Amém.
- Enviai o vosso
Espírito, e tudo será criado. / E renovareis a face da terra.
OREMOS: Deus, que instruístes os corações dos
vossos fiéis/ com as luzes do Espírito Santo,/ concedei-nos que apreciemos
retamente todas as coisas/ segundo o mesmo Espírito/ e que gozemos sempre da
sua consolação,/ por Cristo, Senhor nosso. Assim seja.
E a:
II. Ave, Estrela do Mar.
- Ave Estrela do
Mar, / Alma Mãe de Deus, / Virgem para sempre, / Porta ditosa dos céus.
- De Gabriel o
Arcanjo / aquele Ave tomando / concede ao mundo a paz / De Eva o nome trocando.
- Aos réus dissolve
as algemas / Aos cegos concede a luz. / Repele Tu os males, / alcança o que ao
céu conduz.
- Sê Mãe; as nossas
preces / Por Ti subam ao céu / Ao que, por nós nascido / Quis ser o Filho teu.
- Virgem entre todos
singular, / Suave mais que os outros, / As nossas culpas dissolve / fazendo-nos
mansos e puros.
- Dá-nos a vida
serena / E que seguros cheguemos, / Para que, vendo Jesus, / sempre nos
alegremos.
- Glória se dê ao
Pai, / Honra a Cristo Senhor / E ao Espírito Santo, / Aos três um só louvor.
Amém.
§ 2. PRIMEIRA SEMANA – Tratado Nº 228.
Empregada em adquirir o conhecimento de si mesmo.
Rezar:
I. Vem, Espírito Criador.
II. Ave, Estrela do Mar.
A seguir rezar:
III. Ladainha do Espírito
Santo:
Senhor, tende piedade de nós...
/ Jesus Cristo, tende piedade de nós... / Senhor, tende piedade de nós... /
Jesus Cristo, ouvi-nos... / Jesus Cristo, atendei-nos... / Pai celeste, que sois
Deus, tende piedade de nós... / Filho, Redentor do mundo, que sois Deus, tende
piedade de nós... / Santíssima Trindade, que sois Deus, tende piedade de nós...
/ Espírito que procedeis do Pai e do Filho, tende piedade de nós... / Espírito
do Senhor, que no início da criação, pairando sobre as águas, as tornastes
fecundas, tende... / Espírito, sob
cuja inspiração falaram os santos de Deus, Espírito, cuja unção nos ensina
tudo, tende... / Espírito, que
rendeis testemunho de Jesus Cristo... / Espírito de verdade, que tudo nos
sugeris... / Espírito, que descestes sobre Maria... / Espírito do Senhor, que
encheis toda a terra... / Espírito de Deus, que estais em nós, Espírito de
sabedoria e de inteligência... / Espírito de conselho e de força, Espírito de
Ciência e de piedade... / Espírito de temor do Senhor... / Espírito de graça e
de misericórdia... / Espírito de virtude, dileção e sobriedade... / Espírito de
fé, esperança, amor e paz.... / Espírito de humildade e de castidade... /
Espírito de bondade e de doçura... / Espírito de todas as formas de graça... /
Espírito, que perscrutais os segredos de Deus... / Espírito, que rogais por nos
com súplicas inenarráveis... / Espírito, que descestes sobre Jesus na forma de
pomba... / Espírito, por quem recebemos novo nascimento... / Espírito, que
encheis os corações de caridade... / Espírito de adoção dos filhos de Deus... /
Espírito, que aparecestes sobre os discípulos sob a forma de línguas de fogo...
/ Espírito, de que foram cheios os Apóstolos... / Espírito, que dais a cada
qual segundo a vossa vontade...
Sede-nos propício; perdoai-nos, Senhor.
Sede-nos propício; ouvi-nos, Senhor.
De todo o mal, livrai-nos, Senhor. / De todo o pecado, livrai... / Das tentações e insídias do demônio... / De toda a
presunção e desesperação... / Da resistência à verdade... / Da obstinação e
impenitência... / Da impureza da mente e do corpo... / Do espírito de
fornicação... / De todo o mau espírito... / Pela vossa processão do Pai e do
Filho... / Pela concepção de Jesus Cristo por vossa obra... / Pela descida
sobre Jesus Cristo no Jordão... / Pela vossa descida sobre os discípulos... /
No grande dia do juízo...
Nós, pobres pecadores, Vos pedimos, ouvi-nos... / Para que, vivendo pelo
Espírito, operemos pelo Espírito, ouvi-nos...
/ Para que nos lembremos de que somos templos do Espírito Santo e não o
profanemos... / Para que, vivendo segundo o Espírito, não insistamos em
satisfazer os desejos da carne... / Para que não Vos contristemos, Espírito
Santo de Deus... / Par que sejamos solícitos em conservar a unidade do
Espírito, sendo esta o laço da paz... / Para que não acreditemos facilmente em
todo espírito... / Para que verifiquemos se o espírito é de Deus... / Para que
Vos digneis renovar em nós a retidão do espírito... / Para que nos confirmeis
no vosso Espírito...
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do
mundo, perdoai-nos, Senhor... / Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do
mundo, ouvi-nos, Senhor... / Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo,
tende piedade de nós, Senhor... / Enviai o vosso Espírito e tudo será criado, /
E renovareis a face da terra.
Oremos: Nós Vos suplicamos, Senhor,/ que
nos assista a virtude do vosso Espírito Santo/ para que, purificado pela sua
misericórdia/ as manchas dos nossos corações,/ nos preserve de todo o mal./ Por
Cristo, Senhor nosso./ Amém.
Ou
esta:
Ladainha do Espírito Santo - Versão trazida no Tratado publicado pela
Editora Vozes no Brasil, parece ser a versão original traduzida do latim):
Senhor, tende piedade de nós. / Jesus Cristo,
tende piedade de nós. / Divino Espírito Santo, ouvi-nos. / Espírito Paráclito,
atendei-nos.
Deus Pai dos céus, tende piedade de nós, / Deus
Filho, redentor do mundo, / Deus Espírito Santo, / Santíssima Trindade, que
sois um só Deus, tende piedade de nós.
Espírito da verdade,
Espírito da sabedoria,
Espírito da inteligência,
Espírito da fortaleza,
Espírito da piedade,
Espírito do bom conselho,
Espírito da ciência,
Espírito do santo temor,
Espírito da caridade,
Espírito da alegria,
Espírito da paz,
Espírito das virtudes,
Espírito de toda graça,
Espírito da adoção dos filhos de Deus,
Purificador das nossas almas,
Santificador e guia da Igreja Católica,
Distribuidor dos dons celestes,
Conhecedor dos pensamentos e das intenções do coração,
Doçura dos que começam a vos servir,
Coroa dos perfeitos,
Alegria dos anjos,
Luz dos patriarcas,
Inspiração dos profetas,
Palavra e sabedoria dos apóstolos,
Vitória dos mártires,
Ciência dos confessores,
Pureza das virgens,
Unção de todos os santos,
Espírito da verdade,
Espírito da sabedoria,
Espírito da inteligência,
Espírito da fortaleza,
Espírito da piedade,
Espírito do bom conselho,
Espírito da ciência,
Espírito do santo temor,
Espírito da caridade,
Espírito da alegria,
Espírito da paz,
Espírito das virtudes,
Espírito de toda graça,
Espírito da adoção dos filhos de Deus,
Purificador das nossas almas,
Santificador e guia da Igreja Católica,
Distribuidor dos dons celestes,
Conhecedor dos pensamentos e das intenções do coração,
Doçura dos que começam a vos servir,
Coroa dos perfeitos,
Alegria dos anjos,
Luz dos patriarcas,
Inspiração dos profetas,
Palavra e sabedoria dos apóstolos,
Vitória dos mártires,
Ciência dos confessores,
Pureza das virgens,
Unção de todos os santos,
Sede-nos propício, perdoai-nos, Senhor.
Sede-nos propício, atendei-nos, Senhor.
Sede-nos propício, atendei-nos, Senhor.
De todo o pecado, livrai-nos, Senhor.
De todas as tentações e ciladas do demônio, livrai-nos....
De toda a presunção e desesperação.
Do ataque à verdade conhecida,
Da inveja da graça fraterna,
De toda a obstinação e impenitência,
De toda a negligência e tepor do espírito,
De toda a impureza da mente e do corpo,
De todas as heresias e erros,
De todo o mau espírito,
Da morte má e eterna,
De todas as tentações e ciladas do demônio, livrai-nos....
De toda a presunção e desesperação.
Do ataque à verdade conhecida,
Da inveja da graça fraterna,
De toda a obstinação e impenitência,
De toda a negligência e tepor do espírito,
De toda a impureza da mente e do corpo,
De todas as heresias e erros,
De todo o mau espírito,
Da morte má e eterna,
Pela vossa eterna procedência do Pai e do Filho,
Pela milagrosa conceição do Filho de Deus,
Pela vossa descida sobre Jesus Cristo batizado,
Pela vossa santa aparição na transfiguração do Senhor,
Pela vossa vinda sobre os discípulos do Senhor,
No dia do juízo,
Pela milagrosa conceição do Filho de Deus,
Pela vossa descida sobre Jesus Cristo batizado,
Pela vossa santa aparição na transfiguração do Senhor,
Pela vossa vinda sobre os discípulos do Senhor,
No dia do juízo,
Ainda que pecadores, nós vos rogamos, ouvi-nos.
Para que nos perdoeis,
Para que vos digneis vivificar e santificar todos os membros da Igreja,
Para que vos digneis conceder-nos o dom da verdadeira piedade, devoção e oração,
Para que vos digneis inspirar-nos sinceros afetos de misericórdia e de caridade,
Para que vos digneis criar em nós um espírito novo e um coração puro,
Para que vos digneis conceder-nos verdadeira paz e tranqüilidade no coração,
Para que vos digneis fazer-nos dignos e fortes, para suportar as perseguições pela justiça,
Para que vos digneis confirmar-nos em vossa graça,
Para que vos digneis receber-nos no número dos vossos eleitos,
Para que vos digneis ouvir-nos,
Espírito de Deus,
Para que vos digneis vivificar e santificar todos os membros da Igreja,
Para que vos digneis conceder-nos o dom da verdadeira piedade, devoção e oração,
Para que vos digneis inspirar-nos sinceros afetos de misericórdia e de caridade,
Para que vos digneis criar em nós um espírito novo e um coração puro,
Para que vos digneis conceder-nos verdadeira paz e tranqüilidade no coração,
Para que vos digneis fazer-nos dignos e fortes, para suportar as perseguições pela justiça,
Para que vos digneis confirmar-nos em vossa graça,
Para que vos digneis receber-nos no número dos vossos eleitos,
Para que vos digneis ouvir-nos,
Espírito de Deus,
Cordeiro de Deus que tirais os pecados do mundo,
envia-nos o Espírito Santo.
Cordeiro de Deus que tirais os pecados do mundo, mandai-nos o Espírito prometido do Pai.
Cordeiro de Deus que tirais os pecados do mundo, dai-nos o Espírito bom.
Espírito Santo, ouvi-nos.
Espírito Consolador, atendei-nos.
Cordeiro de Deus que tirais os pecados do mundo, mandai-nos o Espírito prometido do Pai.
Cordeiro de Deus que tirais os pecados do mundo, dai-nos o Espírito bom.
Espírito Santo, ouvi-nos.
Espírito Consolador, atendei-nos.
V. Enviai o vosso Espírito e
tudo será criado. / R. E renovareis a face da
terra.
Oremos: Deus, que instruístes o coração de vossos fiéis,/ com a luz do
Espírito Santo,/ concedei-mos que, no mesmo Espírito, conheçamos o que é reto,/
e gozemos sempre as suas consolações./ Por Cristo, Nosso Senhor./ Amém.
E a:
V.
Ladainha de Nossa Senhora: Versão original do Latim:
Senhor, tende
piedade de nós. / Jesus Cristo, tende piedade de nós. / Senhor, tende piedade
de nós. / Jesus Cristo, ouvi-nos. / Jesus Cristo, atendei-nos. / Pai celeste
que sois Deus, tende piedade de nós. / Filho,
Redentor do mundo, que sois Deus, tende piedade de nós. / Espírito
Santo, que sois Deus, tende piedade de nós. / Santíssima
Trindade, que sois um só Deus, tende piedade de nós.
Santa Maria, rogai por nós.
Santa Mãe de Deus,
Santa Virgem das Virgens,
Mãe de Jesus Cristo,
Mãe da divina graça,
Mãe puríssima,
Mãe castíssima,
Mãe imaculada,
Mãe intacta,
Mãe amável,
Mãe admirável,
Mãe do bom conselho,
Mãe do Criador,
Mãe do Salvador,
Virgem prudentíssima,
Virgem venerável,
Virgem louvável,
Virgem poderosa,
Virgem clemente, (aqui:Virgem Benigna em outra versão)
Virgem fiel,
Espelho de justiça,
Sede de sabedoria,
Causa da nossa alegria,
Vaso espiritual,
Vaso honorífico,
Vaso insigne de devoção,
Rosa mística,
Torre de David,
Torre de marfim,
Casa de ouro,
Arca da aliança,
Porta do céu,
Estrela da manhã,
Saúde dos enfermos,
Refúgio dos pecadores,
Consoladora dos aflitos,
Auxílio dos cristãos,
Rainha dos anjos,
Rainha dos patriarcas,
Rainha dos profetas,
Rainha dos apóstolos,
Rainha dos mártires,
Rainha dos confessores,
Rainha das virgens,
Rainha de todos os santos,
Rainha concebida sem pecado original,
Rainha assunta ao céu, (elevada ao céu, em outra versão)
Rainha do sacratíssimo Rosário, (do Santo Rosário, em outra versão)
Rainha da paz,
Santa Mãe de Deus,
Santa Virgem das Virgens,
Mãe de Jesus Cristo,
Mãe da divina graça,
Mãe puríssima,
Mãe castíssima,
Mãe imaculada,
Mãe intacta,
Mãe amável,
Mãe admirável,
Mãe do bom conselho,
Mãe do Criador,
Mãe do Salvador,
Virgem prudentíssima,
Virgem venerável,
Virgem louvável,
Virgem poderosa,
Virgem clemente, (aqui:Virgem Benigna em outra versão)
Virgem fiel,
Espelho de justiça,
Sede de sabedoria,
Causa da nossa alegria,
Vaso espiritual,
Vaso honorífico,
Vaso insigne de devoção,
Rosa mística,
Torre de David,
Torre de marfim,
Casa de ouro,
Arca da aliança,
Porta do céu,
Estrela da manhã,
Saúde dos enfermos,
Refúgio dos pecadores,
Consoladora dos aflitos,
Auxílio dos cristãos,
Rainha dos anjos,
Rainha dos patriarcas,
Rainha dos profetas,
Rainha dos apóstolos,
Rainha dos mártires,
Rainha dos confessores,
Rainha das virgens,
Rainha de todos os santos,
Rainha concebida sem pecado original,
Rainha assunta ao céu, (elevada ao céu, em outra versão)
Rainha do sacratíssimo Rosário, (do Santo Rosário, em outra versão)
Rainha da paz,
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo, perdoai-nos,
Senhor.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo, ouvi-nos, Senhor.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo, tende piedade de nós.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo, ouvi-nos, Senhor.
Cordeiro de Deus, que tirais os pecados do mundo, tende piedade de nós.
V. Rogai por nós, Santa Mãe
de Deus, / R. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.
Oremos:
Senhor Deus, nós Vos suplicamos/ que concedais aos vossos servos/ lograr
perpétua saúde de alma e de corpo;/ e que, pela gloriosa intercessão da
bem-aventurada sempre Virgem Maria,/ sejamos livres da presente tristeza/ e
gozemos da eterna alegria./ Por Cristo Nosso Senhor./ Amém.
(no mês de outubro)
V. Rogai por nós, Rainha do Sacratíssimo Rosário, / R. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.
§ 3. SEGUNDA SEMANA – Tratado Nº 229.
Empregada em adquirir o conhecimento da Santíssima
Virgem.
Rezar:
I –
Ladainha do Espírito Santo.
II –
Ave, Estrela do Mar.
A
seguir rezar:
III. Um
Rosário ou menos um Terço Meditado, segundo o
método (para rezar com fruto) de São Luís Maria Grignion de Montfort, abaixo
descrito, retocado por mim, tudo o que estiver em negrito no Rosário abaixo foi
acrescentado por mim no original de São Luís de Montfort:
Por
meio do Coração de São Luís Maria Grignion de Montfort/ - Uno-me a todos os santos que estão no céu,/ a todos os justos que estão
sobre a terra,/ a todas as almas fiéis que estão neste lugar./ Uno-me a Vós,
meu Jesus,/ para louvar dignamente vossa santa Mãe,/ e louvar-Vos a vós, nela e
por Ela./ Renuncio a todas as distrações/ que me vierem durante este Rosário/,
que quero recitar com modéstia,/ atenção e devoção,/ como se fosse o último da
minha vida.
Nós Vos oferecemos, Santíssima Trindade,/
este Credo, para honrar todos os mistérios da nossa fé;/ este Pai Nosso e estas
três Ave Marias/ para honrar a unidade de vossa essência/ e a trindade de
vossas pessoas./ Pedimos-Vos uma fé viva, uma esperança firme e uma caridade
ardente.
Oferecimento: Divino
Jesus,/ nós vos oferecemos este Rosário que vamos rezar,/ contemplando os
mistérios de vossa Redenção./ Concedei-nos, pela intercessão de Maria,/ vossa
Mãe Santíssima,/ a quem nos dirigimos, /as virtudes que nos são necessárias
para bem rezá-lo/ e a graça de ganhar as indulgências /anexas a esta santa
devoção.
Oferecemos,
particularmente,/ em desagravo dos pecados cometidos/ contra o Santíssimo
Coração de Jesus e Imaculado Coração de Maria,/ pela paz do mundo,/ pela
conversão dos pecadores, pelas almas do Purgatório,/ pelas intenções do Santo
Padre,/ pelo aumento e santificação do Clero,/ pelo nosso Vigário,/ pelas
Missões,/ pelos doentes,/ pelos agonizantes,/ por aqueles que pediram nossas
orações,/ por todas as nossas intenções particulares e pelo(a) (dizer o nome de seu país).
Mensagem de N. Sra. Estrela
da Manhã: “Depois de cada terço do Rosário beijar o crucifixo do terço assim
estarão beijando as cinco chagas de Jesus. Rezar com o terço na mão esquerda e
com o crucifixo na mão direita segurando firme, em cumprimento à profecia de
São Luís de Montfort, que diz: “na direita, o crucifixo, na esquerda o Rosário”
TVDSV, 59. Consagração:
“Mãe, protegei o meu
coração/ de todas as dúvidas e artimanhas de Satanás, /que o meu coração esteja
quente e amoroso/ para com as coisas do céu./ Fazei em mim segundo a vossa
vontade/ e não segundo os sofismas deste mundo tenebroso./ Deixo aqui ao pé da
Cruz/ os meus pecados e lamento sobre eles (Bata no peito e diga:)/ Sou
inteiramente vosso ó incomparável Mãe./ Preparai o meu coração/ para a chegada
do vosso Filho /e dai-me a vossa Santidade e amor/ pela Palavra de vosso Filho/
e dai-me a vossa santidade e amor pela Palavra de vosso Filho./ Abri os meus
olhos/ para que eu veja a grandeza e a bondade de sua obra./ Fazei com que os
meus pés/ sejam anunciadores da Boa Nova./ Assim seja” – “Rezai o Rosário com devoção, colocai a cruz no coração e dizei sempre:
Mãe, protegei...” Estrela da Manhã,
21/02/1995).
Creio em Deus... Pai nosso... 3 Ave Marias... Glória ao Pai...
‘ - Adoremos a Chaga da mão direita de Jesus:
beijar o Crucifixo do terço.’
Mistérios Gozosos
No
primeiro mistério gozoso contemplamos a Anunciação do Anjo a Maria e a
Encarnação do Verbo de Deus.
1. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta primeira dezena/ para honrar a
vossa encarnação no seio de Maria;/ e Vos pedimos, por este mistério e por sua
intercessão,/ uma profunda humildade./ Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério da Encarnação, descei em nossas almas. Assim seja.
No
segundo mistério gozoso contemplamos a Visitação de Maria a sua prima Isabel.
2. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta segunda dezena/ em honra da
visitação de vossa santa mãe /à sua prima sua prima Santa Isabel /e da
santificação de São João Batista;/ e Vos pedimos por este mistério/ e pela
intercessão de vossa Mãe Santíssima/ a caridade para com o próximo./ Assim
seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias. Glória ao Pai.
Graças ao mistério da visitação, descei em nossas almas. Assim seja.
No
terceiro mistério gozoso contemplamos o Nascimento de Jesus em Belém.
3. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta terceira dezena,/ em honra de
vosso nascimento no estábulo de Belém;/ e Vos pedimos, por este mistério/ e
pela intercessão de vossa Mãe Santíssima,/ o desapego dos bens terrenos,/ o
desprezo das riquezas/ e o amor da pobreza./ Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias,
Glória ao Pai.
Graças ao mistério do nascimento de Jesus, descei em nossas almas.
Assim seja.
No
quarto mistério gozoso contemplamos a Apresentação de Jesus no Templo.
4. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta quarta dezena,/ em honra de
vossa apresentação no templo/, e da purificação de Maria;/ e Vos pedimos, por
este mistério /e por sua intercessão, /uma grande pureza de corpo e alma./
Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias,
Glória ao Pai.
Graças ao mistério da purificação, descei em nossas almas. Assim seja.
No
quinto mistério gozoso contemplamos a perda e o encontro de Jesus no Templo.
5. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus/ esta quinta dezena/ para honrar o
vosso reencontro por Maria,/ e Vos pedimos por este mistério/ e por intercessão
dela a verdadeira sabedoria./ Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério do reencontro de Jesus, descei em nossas almas. Assim
seja.
‘Adoremos a Chaga da mão esquerda de Jesus: beijar
o Crucifixo do terço.”
Mistérios Luminosos
Obs: Os
Mistérios Luminosos foram acrescentados no Rosário pelo Papa João Paulo II, por
isso não há mistérios meditados sobre eles segundo o método de São Luís de
Montfort.
No primeiro mistério
luminoso contemplamos o Batismo de Jesus.
1. O Batismo de Jesus. ”Cada um desses mistérios é revelação do Reino
divino já personificado no próprio Jesus. Primeiramente é mistério de luz o
batismo no Jordão. 1000- Aqui,
enquanto Cristo desce à água do rio, como inocente que se faz pecado por nós, o
céu se abre e a voz do pai proclama-o filho dileto, ao mesmo tempo em que o
espírito vem sobre ele para investi-lo na missão que o espera”. (Nº 21 da Encíclica:
O Rosário da Virgem Maria – Rosarium Virginis Mariae – Papa João Paulo II).
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério do Batismo de Jesus, descei em nossas almas. Assim
seja.
No segundo mistério luminoso
contemplamos a auto-revelação de Jesus nas bodas de Caná.
2. A auto-revelação de Jesus nas bodas de Caná. “Mistério de luz é o
início dos sinais em Caná, quando Cristo, transformando a água em vinho, abre à
fé o coração dos discípulos graças à intervenção de Maria, a primeira entre os
que crêem” (Encíclica: O Rosário da Virgem Maria).
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério da Auto-revelação de Jesus nas bodas de Caná, descei
em nossas almas. Assim seja.
No
terceiro mistério luminoso contemplamos o anúncio do Reino de Deus com o
convite à conversão.
3. O anúncio do Reino de Deus com o convite à conversão. “Mistério de luz
é a pregação com a qual Jesus anuncia o advento do Reino de Deus e convida à
conversão, perdoando os pecados de quem se dirige a ele com humilde confiança,
início do ministério de misericórdia que ele prosseguirá exercendo até o fim do
mundo, especialmente através do sacramento da reconciliação confiado à sua
Igreja” (O Rosário da Virgem Maria).
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças do mistério do Anúncio do Reino de Deus com o convite à
conversão, descei em nossas almas. Assim seja.
No quarto mistério luminoso
contemplamos a Transfiguração de Jesus.
4. A transfiguração. “Mistério de luz por excelência é a transfiguração
que, segundo a tradição, se deu no Monte Tabor. A glória da divindade reluz no
rosto de Cristo, enquanto o Pai o credencia aos apóstolos extasiados para que o
‘escutem’ e se disponham a viver com
ele o momento doloroso da paixão, a fim de chegarem com ele à glória da
ressurreição e a uma vida transfigurada pelo Espírito Santo” (O Rosário da
Virgem Maria).
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério da Transfiguração de Jesus, descei em nossas almas.
Assim seja.
No quinto mistério luminoso
contemplamos a Instituição da Eucaristia.
5. A Instituição da Eucaristia. Mistério de luz é, enfim, a instituição da
Eucaristia, na qual Cristo se faz alimento com o seu corpo e o seu sangue sob
os sinais do pão e do vinho, testemunhando ‘até o extremo’ seu amor pela
humanidade, cuja salvação se oferecerá em sacrifício”. (O Rosário da Virgem
Maria).
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério da Instituição da Eucaristia, descei em nossas
almas. Assim seja.
Adoremos a chaga do pé direito de Jesus: beijar o
Crucifixo do terço.
Mistérios Dolorosos
No primeiro mistério
doloroso contemplamos a Agonia de Jesus no Horto das Oliveiras.
1. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta (sexta) dezena/ em honra de
vossa agonia mortal no Jardim das Oliveiras;/ e Vos pedimos por este mistério/
e por intercessão de vossa Mãe Santíssima,/ a contrição dos nossos pecados./
Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério da agonia de Jesus, descei em nossas almas. Assim
seja.
No segundo mistério doloroso
contemplamos a flagelação de Jesus.
2. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta (sétima) dezena/ em honra de
vossa sangrenta flagelação; /e Vos pedimos, por este mistério/ e por
intercessão de vossa Mãe Santíssima,/ a mortificação dos sentidos./ Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério da flagelação, descei em nossas almas. Assim seja.
No terceiro mistério
doloroso contemplamos a Coroação de espinho.
3. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta (oitava) dezena/ em honra de
vossa coroação de espinhos;/ e Vos pedimos por este mistério/ e por intercessão
de vossa Mãe Santíssima,/ o desprezo do mundo./ Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Maria, Glória ao Pai.
Graças ao mistério da coroação de espinhos, descei em nossas almas.
Assim seja.
No
quarto mistério doloroso contemplamos Jesus carregando a pesada Cruz para o
Calvário.
4. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta (nona) dezena/ para honrar o
carregamento da cruz, /e Vos pedimos por este mistério/ e por intercessão de
vossa Mãe Santíssima/ a paciência em todas as nossas cruzes./ Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério carregamento da Cruz, descei em nossas almas. Assim
seja.
No quinto mistério doloroso contemplamos a
Crucificação e Morte de Jesus na Cruz.
5. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta (décima) dezena/ em honra de
vossa crucificação e morte ignominiosa sobre o Calvário;/ e Vos pedimos por
este mistério/ e por intercessão de vossa Mãe Santíssima,/ a conversão dos
pecadores,/ a perseverança dos justos/ e o alívio das almas do Purgatório./
Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias,
Glória ao Pai.
Graças ao mistério da crucifixão de Jesus, descei em nossas almas. Assim
seja.
- Adoremos a Chaga do pé esquerdo de Jesus: beijar
o crucifixo do terço.
Mistérios Gloriosos
No primeiro mistério glorioso contemplamos
a Ressurreição de Jesus.
1. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta (undécima - décima primeira)
dezena,/ em honra de vossa ressurreição gloriosa;/ e Vos pedimos por este
mistério/ e por intercessão de vossa Mãe Santíssima,/ o amor de Deus e o fervor
no vosso serviço./ Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias,
Glória ao Pai.
Graças ao mistério da ressurreição, descei em nossas almas. Assim seja.
No segundo mistério glorioso
contemplamos a Ascensão de Jesus aos céus.
2. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta (duodécima - décima segunda)
dezena,/ em honra de vossa triunfante ascensão,/ e Vos pedimos, por este
mistério/ e por intercessão de Vossa Mãe Santíssima,/ um ardente desejo do céu,
/nossa querida pátria./ Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério da ascensão, descei em nossas almas. Assim seja.
No
terceiro mistério glorioso contemplamos a Descida do Espírito Santo sobre Maria
Santíssima e os Apóstolos no Cenáculo em Jerusalém.
3. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta (décima terceira) dezena /para
honrar o mistério de pentecostes,/ e Vos pedimos por este mistério/ e por
intercessão de vossa Mãe Santíssima /a descida do Espírito Santo às nossas
almas./ Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Maria, Glória ao Pai.
Graças ao mistério de Pentecostes, descei em nossas almas. Assim seja.
No quarto mistério glorioso
contemplamos a Assunção de Nossa Senhora aos céus.
4. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta (décima quarta) dezena/ em
honra da ressurreição e triunfal assunção de vossa Mãe ao céu;/ e Vos pedimos
por este mistério/ e por sua intercessão,/ uma terna devoção a tão boa Mãe.
Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Maria, Glória ao Pai.
Graças ao mistério da assunção, descei em nossas almas. Assim seja.
No
quinto mistério glorioso contemplamos a Coração de Nossa Senhora como Rainha do
céu e da terra.
5. Nós Vos oferecemos, Senhor Jesus,/ esta (décima quinta) dezena/ para
honrar a coroação gloriosa de vossa Mãe Santíssima no céu,/ e Vos pedimos por
este mistério/ e por intercessão dela/ a perseverança na graça e a coroa da
glória./ Assim seja.
Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai.
Graças ao mistério da coroação gloriosa de Maria, descei em nossas
almas. Assim seja.
- Adoremos a Chaga do Lado do Coração de Jesus:
beijar o crucifixo do terço.
Oração
final: Eu vos saúdo, Maria,/ Filha bem-amada do eterno
Pai,/ Mãe admirável do Filho,/ Esposa muito fiel do Espírito Santo,/ templo
augusto da Santíssima Trindade;/ eu vos saúdo, soberana Princesa,/ a quem tudo
está submisso no céu e na terra/; eu vos saúdo seguro refúgio dos pecadores,/
Nossa Senhora da misericórdia/, que jamais repelistes pessoa alguma./ Pecador
que sou, me prostro a vossos pés,/ e Vos peço que me obtenhais de Jesus,/ vosso
amado Filho,/ a contrição e o perdão de todos os meus pecados,/ e a divina
Sabedoria./ Eu me consagro todo a Vós/, com tudo o que possuo./ Eu Vos tomo,
hoje,/ por minha Mãe e Senhora./ Tratai-me, pois,/ como o último de vossos
filhos/ e o mais obediente do vossos servos./ Atendei, minha Princesa,/ atendei
aos suspiros do meu coração/ que deseja amar-Vos e servir-Vos fielmente./ Que
ninguém diga que,/ entre todos que a Vós recorreram,/ seja eu o primeiro
desamparado./ Ó minha esperança,/ ó minha vida,/ ó minha fiel e imaculada
Virgem Maria,/ defendei-me, instruí-me, salvai-me./ Assim seja.
Agradecimento:
Infinitas graças vos damos,/ Soberana Rainha,/ pelos benefícios que todos os
dias recebemos/ de vossas mãos liberais./ Dignai-vos agora e para sempre/
tomar-nos debaixo do vosso poderoso amparo/ e para mais vos obrigar/ vos
saudamos com uma Salve Rainha./ Salve Rainha...
§ 4. TERCEIRA SEMANA – Tratado Nº 230.
Empregada em adquirir o conhecimento de Jesus
Cristo.
Rezar:
I –
Ladainha do Espírito Santo.
II –
Ave, Estrela do Mar.
E a:
III.
Oração de Santo Agostinho (Nº 67 do Tratado): “Vós
sois o Cristo,/ meu Pai santo o meu Deus misericordioso,/ o meu Rei
infinitamente grande./ Vós sois o meu Bom Pastor,/ o meu único Mestre,/ o meu
Auxílio todo bondade,/ o meu Bem-amado de arrebatadora beleza,/ o meu Pão de
vida,/ o meu Sacerdote eterno./ Vós sois o meu Guia para a pátria,/ a minha Luz
verdadeira,/ a minha Doçura toda santa,/ o meu Caminho direto./ Vós sois a
minha Sabedoria sublime,/ a minha Simplicidade pura,/ a minha pacífica
Concórdia./ Vós sois toda a minha Defesa,/ a minha preciosa Herança,/ a minha eterna
Salvação...
Ó Jesus Cristo, Mestre adorável,/ porque é que eu amei ou desejei/ em
toda a minha vida outra coisa fora de Vós,/ Jesus, meu Deus?/ Onde estava eu
quando não pensava em Vós?/ Que ao menos a partir deste momento./ O meu coração
só arda em desejos de Vós,/ Senhor Jesus;/ que só para Vos amar ele se dilate./
Desejos da minha alma, correi doravante:/ já basta de delongas;/ apressai-vos a
atingir o fim porque aspirais,/ buscai em verdade Aquele que
procurais./ Ó Jesus, seja anátema quem não Vos amar;/ seja repleto de
amargura!/ Ó doce Jesus, sede o amor,/ as delícias e o objeto da admiração de
todo o coração/ dignamente consagrado à vossa glória./ Deus do meu coração e
minha herança,/ divino Jesus,/ que o meu coração caia num santo desfalecimento/
e sejais Vós a minha vida./ Que se acenda em minha alma/ a brasa ardente do
vosso amor,/ e seja ela o princípio de um incêndio todo divino./ Arda
incessantemente sobre o altar do meu coração,/ inflame o mais íntimo do meu
ser,/ e abrase as profundezas da minha alma./ Que no dia da minha morte/ eu
compareça diante de Vós/ todo consumido no vosso amor./ Assim seja.”
E a:
IV.
Ladainha do Santíssimo Nome de Jesus:
Senhor, tende
piedade de nós. / Jesus Cristo, tende piedade de nós. / Senhor, tende piedade
de nós. / Jesus Cristo, ouvi-nos. / Jesus Cristo, atendei-nos. / Pai Celeste
que sois Deus, tende piedade de nós. / Filho, redentor do mundo, que
sois Deus. / Espírito Santo, que sois Deus, / Santíssima Trindade, que sois um
só Deus,
Jesus Filho de Deus vivo,
Jesus, esplendor do Pai,
Jesus, pureza da luz eterna,
Jesus, Rei da glória,
Jesus, sol de justiça,
Jesus, Filho da Virgem Maria,
Jesus amável,
Jesus admirável,
Jesus, Deus forte,
Jesus, Pai do futuro século,
Jesus, Anjo do grande conselho,
Jesus, poderosíssimo,
Jesus, pacientíssimo,
Jesus, obedientíssimo,
Jesus, brando e humilde de coração
Jesus, amante da castidade,
Jesus, amador nosso,
Jesus, Deus da paz,
Jesus, autor da vida,
Jesus, exemplar das virtudes,
Jesus, zelador das almas,
Jesus, nosso Deus,
Jesus, nosso refúgio,
Jesus, pai dos pobres,
Jesus, tesouro dos fiéis,
Jesus, bom Pastor,
Jesus, verdadeira luz,
Jesus, Sabedoria eterna,
Jesus, bondade infinita,
Jesus, nosso caminho e nossa vida,
Jesus, alegria dos Anjos,
Jesus, Rei dos Patriarcas,
Jesus, Mestre dos Apóstolos,
Jesus, Doutor dos evangelistas,
Jesus, fortaleza dos Mártires,
Jesus, luz dos Confessores
Jesus, pureza das virgens,
Jesus, coroa de todos os santos,
Sede-nos propício: perdoai-nos, Jesus.
Sede-nos propício, ouvi-nos, Jesus.
De todo o mal, livrai-nos Jesus.
De todo o pecado,
Da vossa ira,
Das cidades do demônio,
Do espírito da impureza,
Da morte eterna,
Do desprezo das vossas inspirações,
Pelo mistério da vossa santa Encarnação,
Pela vossa natividade,
Pela vossa infância,
Por toda a vossa santíssima vida,
Pelos vossos trabalhos,
Pela vossa agonia e pela vossa paixão,
Pela vossa cruz e pelo vosso desamparo,
Pelas nossas angústias,
Pela vossa morte e pela vossa sepultura,
Pela vossa ressurreição,
Pela vossa ascensão,
Pela vossa instituição da santíssima Eucaristia.
Pelas vossas alegrias,
Pela vossa glória,
Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo,
perdoai-nos Jesus.
Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo,
ouvi-nos Jesus.
Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo,
tende piedade de nós, Jesus.
Jesus, ouvi-nos. / Jesus, atendei-nos.
Oremos: Senhor Jesus Cristo que
dissestes:/ Pedi e recebereis;/ buscais e achareis;/ batei e abrir-se-vos-á,/
nos vos suplicamos que concedas a nós/, que vo-lo pedimos,/ os sentimentos
afetivos de vosso divino amor,/ a fim de que nós de todo coração/ e que esse
amor transceda por nossas ações,/ sem que deixemos de vos amar./ Permiti que
tenhamos sempre, Senhor,/ um igual temor e amor pelo vosso santo nome;/ pois
não deixais de governar aqueles que estabeleceis na firmeza do vosso amor./ Vós
que viveis e reinais pelos séculos dos séculos./ Amém.
E a:
V. Ladainha do Sagrado
Coração de Jesus.
Senhor, tende
piedade de nós, / Jesus Cristo, tende piedade de nós, / Senhor, tende piedade
de nós, / Jesus Cristo, ouvi-nos, / Jesus Cristo, atendei-nos, / Deus, Pai do
Céu, tende piedade de nós, / Deus Filho, Redentor do mundo, tende piedade de
nós, / Deus Espírito Santo, / Santíssima Trindade, que sois um só Deus,
Coração de
Jesus, Filho do Pai Eterno,
Coração de
Jesus, formado pelo Espírito Santo no seio da Virgem Maria,
Coração de
Jesus, unido substancialmente ao Verbo de Deus,
Coração de
Jesus, de majestade infinita,
Coração de
Jesus, templo santo de Deus,
Coração de
Jesus, tabernáculo do Altíssimo,
Coração de
Jesus, casa de Deus e porta do Céu,
Coração de
Jesus, fornalha ardente de caridade,
Coração de
Jesus, receptáculo de justiça e amor,
Coração de
Jesus, cheio de bondade e amor,
Coração de
Jesus, abismo de todas as virtudes,
Coração de
Jesus, digníssimo de todo louvor,
Coração de
Jesus, rei e centro de todos os corações,
Coração de
Jesus, no qual estão todos os tesouros da sabedoria e da ciência,
Coração de
Jesus, no qual habita toda plenitude da divindade,
Coração de
Jesus, no qual o Pai Celeste põe as suas complacências,
Coração de
Jesus, de cuja plenitude nós todos participamos,
Coração de
Jesus, desejo das colinas eternas,
Coração de
Jesus, paciente e misericordioso,
Coração de
Jesus, rico para todos os que vos invocam,
Coração de
Jesus, fonte de vida e santidade,
Coração de
Jesus, propiciação para os nossos pecados,
Coração de
Jesus, saturado de opróbrios,
Coração de
Jesus, atribulado por causa de nossos crimes,
Coração de
Jesus, feito obediente até a morte,
Coração de
Jesus, atravessado pela lança,
Coração de
Jesus, fonte de toda a consolação,
Coração de
Jesus, nossa vida e ressurreição,
Coração de
Jesus, nossa paz e reconciliação,
Coração de
Jesus, vítima dos pecadores,
Coração de
Jesus, salvação dos que em Vós esperam,
Coração de
Jesus, esperança dos que em Vós expiram,
Coração de
Jesus, delícias de todos os santos,
Cordeiro de
Deus, que tirais os pecados do mundo, perdoai-nos, Senhor,
Cordeiro de
Deus, que tirais os pecados do mundo, ouvi-nos, Senhor,
Cordeiro de
Deus, que tirais os pecados do mundo, tende piedade de nós.
V.
Jesus, manso e humilde de coração, / R. Fazei o nosso coração semelhante ao
vosso.
Oremos: Deus onipotente e eterno,/ olhai para o Coração de vosso diletíssimo
Filho /e para os louvores e as satisfações que Ele,/ em nome dos pecadores vos
tributa;/ e aos que imploram a vossa misericórdia/ concedei benigno o perdão,/
em nome do mesmo Filho Jesus Cristo,/ que convosco vive e reina/(juntamente com o Espírito Santo),/ por
todos os séculos dos séculos./ Amém.
*************
Carta
de Pe. Luizinho, Missionário Montfortino, a Nautilho, sobre a Consagração da
escravidão:
“Missionários
Monfortinos
Casa de
Formação
João Monlevade,
11 de março de 1997.
Queridos
amigos, amigas, irmãos em Cristo,
Vocês estão se preparando para fazer, conforme o método proposto por S.
Luis Maria de Montfort, a sua Consagração Total a Jesus Cristo pelas mãos de
Maria. Esta Consagração e um compromisso pessoal de renovação e fidelidade às
promessas do batismo. Por ser uma decisão tomada depois de muita oração,
meditação da Palavra de Deus, estudo do Tratado da Verdadeira Devoção a
Santíssima Virgem, é preciso que, da mesma forma, o dia a ser escolhido e as
circunstancias estejam revestidas da mesma dignidade. Com isto quero dizer o
seguinte:
* Escolham um dia de festa dedicada a Nossa
Mãe Maria Santíssima ou outra data significativa para a sua vida (data do
batizado, consagração religiosa, ordenação sacerdotal, ou outra data que você
não esquecera com facilidade);
* O "Contrato de Aliança" será
assinado por você no dia da sua Consagração ou da sua renovação;
* necessário alguém como testemunha, mas
não e preciso que seja exclusivamente um sacerdote;
* Se a renovação ou a primeira consagração
for comunitariamente, um será testemunha do outro, mas deverá assinar a
Consagração.
Não nos deixemos levar pela “letra da lei,
quero dizer, pela parte externa da Consagração (celebração, assinatura, texto
da consagração), mas tenhamos profundamente presente pela parte da
Consagração), em nosso coração o que esta entrega a significa na nossa pratica
de vida crista.
Estou enviando os livros pedidos,
peço-lhes desculpas pela demora. Estive um mês inteiro em S. Paulo resolvendo
uns problemas de impressão de folhetos de oração e de animação vocacional e
atrasei com todas as minhas correspondências.
Estarei rezando por vocês e por todos os
que, nestas festas de Nossa Senhora e de S. Luís Maria de Montfort, estiverem
fazendo a sua primeira Consagração ou renovando a que já foi feita.
Maria, nossa
mãe, nos proteja.
Pe. Luizinho.”
RITO DA CONSAGRAÇÃO DE SI
MESMO
COMO ESCRAVO DE JESUS
POR MEIO DE MARIA - Consagração de Aliança.
I. Ministro da Consagração: Queiram(a) aproximar-se os(o) candidatos(o) à
Consagração de Aliança.
II. Os candidatos
se aproximam e dizem: Aqui estamos(estou) Senhor, para fazer a Vontade de Deus.
III. Ministro da
Consagração: O que pedem(m)?
IV. Candidatos: A Misericórdia
de Deus e o Reino de Jesus em nossos corações.
V. Ministro da
Consagração: Após um período de preparação para esta Solene
Consagração,/ em Nome de Deus e da Igreja,/ vos declaro dignos(o) para
professar este vínculo sagrado./ Eu vos pergunto em Nome de Deus e da Igreja:/
Querem(quer) viver como verdadeiros(o)
escravos(o) de Jesus por meio Maria,/ vivendo bem o dom desta Consagração,/
instaurando o Reino de Jesus por meio de Maria pela Terra,/ defendendo a Santa
Igreja Católica,/ a Sã Doutrina,/ a Verdade
da Fé,/ a Tradição Apostólica,/ a Hierarquia e o Magistério da Igreja, e o Evangelho de Jesus Cristo,/ dando a vida
pela causa de Cristo?
VI. Candidatos: Queremos(Quero), com a Graça de
Deus, no Poder do Espírito Santo.
VII. Ministro da Consagração: Querem(res) se consagrar a Jesus Cristo/ e à Santíssima Virgem
Maria,/ como seus(seu) fiéis(fiel) escravos(o),/ pelo Ato da Consagração de
Aliança,/ segundo o Método de São Luís Maria Grignion de Montfort,/ contemplado
no livro Tratado de Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem,/ para selar esta
Aliança e este vínculo sagrado?
VIII. Candidatos: Queremos(quero), com a Graça de Deus.
IX. Ministro da Consagração: Então,/ a partir desta Solene Consagração e
destes propósitos,/ eu vos declaro, em Nome de Deus e da Igreja,/ pessoas(a)
Consagradas(a) ao Senhor,/ Ministros(o) do Deus Altíssimo,/ pertencentes ao
Reino dos Sacerdotes, Reis e Profetas do Deus Todo Poderoso,/ dos predestinados
Soldados do Exército de Jesus e Maria,/ Ungidos do Espírito Santo,/ Filhos da
Sabedoria Eterna e Encarnada/ e Apóstolos dos Últimos Tempos,/ investidos do
Poder do Alto.
X. Candidatos: Amém!
XI. Ministro da
Consagração: Fazei o vosso
juramento:
XII. Candidatos: Eu juro
amor,/ lealdade,/ obediência e fidelidade a Deus Pai,/ a Deus Filho,/ a Deus
Espírito Santo/ e à Santa Mãe Igreja Católica Apostólica Romana,/ e prometo
cumprir e fazer cumprir/ o Santo Evangelho/
e a Verdade da Fé,/ a preço de meu sangue,/ por amor ao meu Deus.
XIII. Ministro da Consagração: Queiram(a) professar a Consagração de Aliança.
XIV. Os candidatos rezam a Consagração.
XV. Ministro da
Consagração: Que Deus confirme, ligue e sele estes propósitos no seu Santuário no
céu, na forma de Decreto Divino.
XVI. Candidatos: Amém!
******
A seguir, fazem a prostração, e a comunidade canta ou reza o Vem Espírito Criador (ou outro cântico
litúrgico do Espírito Santo), a Ladainha
de Todos os Santos, o Magnificat.
Faz-se a Efusão de Espírito Santo e
a Assinatura da Consagração da Aliança. Geralmente a folha da consagração é
assinada antes da cerimônia.
XVII. O Ordinário abençoa os objetos que servirão de sinal da escravidão de amor
a Jesus por meio de Maria. Se não haver Ordinário, os objetos já deverão estar
bentos deste antes da cerimônia...
XVIII. Ministro da
Consagração: (Entrega do
terço na mão do consagrado): Recebe na tua mão esquerda o Rosário de Maria
como arma para o teu combate.... (após
cada recebimento, o candidato diz: Amém!)... (Continua...)
(Entrega da Cruz ou Crucifixo na mão do consagrado): Recebe
na tua mão direita o estandarte ensanguentado da Cruz de Jesus como sinal da
tua vitória e do teu Ministério Profético... (Continua)...
(Entrega da Medalha ou Escapulário, ou fazer o sinal da Cruz no peito do
consagrado): Recebe no teu peito + os Sagrados Nomes de Jesus
e Maria...
(Caso tenha a Entrega
da corrente da escravidão ou de outro objeto): E recebe no teu
corpo esta cadeia como sinal da tua escravidão
amorosa e voluntária a Jesus por meio de Maria. Amém!
A
FÓRMULA DA CONSAGRAÇÃO DE ESCRAVIDÃO:
CONSAGRAÇÃO DE ALIANÇA, ou,
CONSAGRAÇÃO A JESUS CRISTO - A SABEDORIA ETERNA E
ENCARNADA – PELAS MÃOS DE MARIA, ou,
CONSAGRAÇÃO DE SI MESMO COMO ESCRAVO DE JESUS POR
MEIO DE MARIA:
Ó Sabedoria eterna
e encarnada! Ó amabilíssimo e adorável Jesus, verdadeiro Deus e verdadeiro
homem, unigênito Filho do eterno Pai, e da sempre Virgem Maria, adoro-vos
profundamente no seio e nos esplendores de vosso Pai, durante a eternidade, e
no seio virginal de Maria, vossa Mãe digníssima, no tempo de vossa Encarnação.
Eu vos dou graças
por vos terdes aniquilado a vós mesmo, tomando a forma de escravo, para
livrar-me do cruel cativeiro do demônio. Eu vos louvo e glorifico por vos
terdes querido submeter a Maria, vossa Mãe Santíssima, em todas as coisas, a
fim de por ela tornar-me vosso fiel escravo. Mas ai de mim, criatura ingrata e
infiel! não cumpri as promessas que vos fiz solenemente no batismo. Não cumpri
com minhas obrigações; não mereço ser chamado vosso filho nem vosso escravo,
e, como nada há em mim que de vós não tenha merecido repulsa e cólera, não
ouso aproximar-me por mim mesmo de vossa santíssima e augustíssima majestade. É
por esta razão que recorro à intercessão de vossa Mãe Santíssima, que me destes
por medianeira junto a vós, e é por este meio que espero obter de vós a
contrição e o perdão de meus pecados, a aquisição e conservação da sabedoria.
Ave, pois, ó Maria
Imaculada, tabernáculo vivo da Divindade, onde a eterna Sabedoria escondida
quer ser adorada pelos anjos e pelos homens!
Ave, ó Rainha do
céu e da terra, a cujo império é submetido tudo o que está abaixo de Deus!
Ave, ó seguro
refúgio dos pecadores, cuja misericórdia a ninguém falece! Atendei ao desejo
que tenho da divina Sabedoria, e recebei, para este fim, os votos e as
oferendas, apresentadas pela minha baixeza.
Eu, N..., infiel pecador,
renovo e ratifico hoje, em vossas mãos, os votos do batismo. Renuncio para
sempre a satanás, suas pompas e suas obras, e dou-me inteiramente a Jesus
Cristo, Sabedoria encarnada, para segui-lo levando minha crus, em todos os
dias de minha vida. E, a fim de lhe ser mais fiel do que até agora tenho sido,
escolho-vos neste dia, ó Maria Santíssima, em presença de toda a corte celeste,
para minha Mãe e minha Senhora.
Entrego-vos e
consagro-vos, na qualidade de escravo, meu corpo e minha alma, meus bens
interiores e exteriores, e até o valor de minhas obras boas passadas, presentes
e futuras, deixando-vos direito pleno e inteiro de dispor de mim e de tudo o
que me pertence, sem exceção, a vosso gosto, para maior glória de Deus, no
tempo e na eternidade. Recebei, ó benigníssima Virgem, esta pequena oferenda de
minha escravidão, em união e em honra à submissão que a Sabedoria Eterna quis
ter à vossa maternidade; em homenagem ao poder que tendes ambos sobre este
vermezinho e miserável pecador; em ação de graças pelos privilégios com que
vos favoreceu a Santíssima Trindade. Protesto que quero, dora em diante, como
vosso verdadeiro escravo, buscar vossa honra e obedecer-vos em todas as coisas.
Ó Mãe admirável, apresentai-me a vosso amado Filho, na qualidade de escravo
perpétuo, para que, tendo-me remido por vós, por vós também me receba
favoravelmente. Ó Mãe de misericórdia, concedei-me a graça de obter a
verdadeira Sabedoria de Deus, e de colocar-me, para este fim, no número
daqueles a quem amais, ensinais, guiais, sustentais e protegeis como filhos e
escravos vossos. Ó Virgem fiel, tornai-me em todos os pontos um tão perfeito
discípulo, imitador e escravo da Sabedoria encarnada, Jesus Cristo, vosso
Filho, que eu chegue um dia, por vossa intercessão e a vosso exemplo, à plenitude
de sua idade na terra e de sua glória nos céus. Assim seja.
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Assinatura
do nome completo.
Cidade e
data: _______________ , ______ / ______________ / ______
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